Ciência, importante
aliado para o futebol

26/09/2014 - 13:23

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Antonio Carlos de Moraes, professor da FEF

Antonio Carlos de Moraes, professor da FEF

Julio Cesar Hadler Neto, coordenador do PENSES

Julio Cesar Hadler Neto, coordenador do PENSES

Mesa de abertura do Fórum: Julio Hadler Neto, Luis Alberto Magna e Antonio Carlos de Moraes

Mesa de abertura do Fórum: Julio Hadler Neto, Luis Alberto Magna e Antonio Carlos de Moraes

Luis Alberto Magna, pró-reitor de Graduação da Unicamp

Luis Alberto Magna, pró-reitor de Graduação da Unicamp

Alcides José Scaglia, coordenador de Graduação da FCA

Alcides José Scaglia, coordenador de Graduação da FCA

Sérgio Augusto Cunha, professor da FEF

Sérgio Augusto Cunha, professor da FEF

Laércio Luis Vendite, professor do Imecc

Laércio Luis Vendite, professor do Imecc

Estevam Soares, treinador de futebol

Estevam Soares, treinador de futebol

Martina Navarro, pesquisadora da Unifesp

Martina Navarro, pesquisadora da Unifesp

O futebol brasileiro utiliza muito pouco as ferramentas que a ciência e a tecnologia oferecem para o aprimoramento do esporte profissional e, quando as usa, é de forma incipiente e pouco efetiva. Durante o Fórum Ações para o Protagonismo do Futebol Brasileiro, realizado ontem no Auditório da Faculdade de Ciências Médicas (FCM) da Unicamp, uma das principais conclusões é que existe um hiato entre os clubes e a academia. Superar esse distanciamento poderia permitir que times e federações empregassem os conhecimentos gerados na universidade para trazer o futebol brasileiro de volta ao papel de protagonista na cena mundial esportiva.

Depois da histórica derrota da seleção do Brasil para a Alemanha por 7 a 1 na Copa do Mundo, o momento atual é de reflexão. Nas fases gloriosas de conquistas de títulos mundiais - entre 1958 e 1970 e de 1982 a 1994 -, a seleção verde e amarela realizou um trabalho planejado e organizado, do ponto de vista de treinamento, nos aspectos físicos, técnicos, táticos e nutricionais, afirmou o professor Sérgio Augusto Cunha, da Faculdade de Educação Física (FEF) da Unicamp, durante o Fórum. Para Cunha, além do excepcional talento dos craques que abrilhantaram o esporte nacional, o Brasil contou, nesses quatro primeiros títulos, com conhecimentos que iam além do empirismo. Organizado pelo Fórum Pensamento Estratégico (PENSES), em parceria com a FEF, o evento reuniu técnicos, preparadores físicos e demais profissionais do esporte, além de jornalistas, pesquisadores e professores das três universidades públicas paulistas.

A falta de treinos físicos no futebol praticado no Brasil é muito prejudicial para o esporte e pôde ser sentida durante a última Copa do Mundo, defendeu Claudio Alexandre Gobatto, professor da Faculdade de Ciências Aplicadas (FCA) da Unicamp. "Com raras exceções, não se faz treinamento físico no futebol brasileiro. Atualmente a preparação física do futebol está precária e isso ficou evidente na Copa", criticou o docente da FCA, especialista em fisiologia. Segundo Gobatto, enquanto as outras seleções treinavam com sistemático planejamento, os atletas brasileiros estavam mais preocupados em assistir aos jogos.

O médico Roberto Nishimura, que chefia o Departamento Médico da Ponte Preta, discorda de Gobatto, afirmando que o time brasileiro não conseguiria trabalhar nessa metodologia de treinos físicos mais intensos porque precisava de tempo para se recuperar, já que grande parte do elenco vinha de um torneio recém-concluído na Europa, a Champions League. "Talvez por isso não se viu o Brasil treinar tanto. Mas não treinou por que não quis ou por que estava se recuperando? A recuperação, às vezes, é muito importante", destacou Nishimura, que acompanhou na região de Campinas, como médico da Federação Internacional de Futebol (Fifa), as seleções de Portugal, Nigéria e Costa do Marfim. Gobatto lembrou, entretanto, que muitos jogadores de outras seleções, como da Alemanha, também jogaram o campeonato europeu e tiveram bom desempenho na Copa.

Uma das consequências imediatas da frustrada campanha brasileira pode ser medida em termos financeiros: o valor de mercado dos jogadores escalados para o campeonato mundial sofreu uma redução de R$ 60 milhões, de acordo com dados da Pluri Consultoria. Sérgio Cunha lembra que a perda pode ser muito maior considerando todo o universo de profissionais envolvidos. O esporte é responsável pela geração de 300 mil empregos diretos no Brasil.

O matemático Laércio Vendite, professor do Instituto de Matemática, Estatística e Ciência da Computação (IMECC) da Unicamp, que trabalha com análise de desempenho esportivo, destaca a falta de avaliações do trabalho feito no campo. "Nosso problema é que trabalhamos e não temos o hábito da avaliação. Nós trabalhamos nos modelos velhos, arcaicos, que não as usam. Nem mesmo depois de uma derrota histórica é feita uma análise de dados de forma rigorosa". Vendite aponta que a análise de dados possibilita um modelo de avaliação e um aperfeiçoamento das técnicas do futebolista. Segundo o matemático, o Barcelona, por exemplo, apresenta uma média de passes errados de apenas 4%, e esse dado ajuda a embasar uma visão mais aprofundada das técnicas do time. Para ele, é comum a imprensa esportiva emitir comentários e dar notas sobre o desempenho de atletas sem dispor de dados concretos, o que leva a muitas avaliações equivocadas.

Crítico da postura de dirigentes nos bastidores do futebol nacional, o treinador Estevam Soares, ex-técnico de times como Palmeiras e Botafogo, alerta para a ilusão de que o Brasil é a melhor equipe do mundo e considera que os profissionais brasileiros são mal preparados emocionalmente. Na avaliação de Soares, as cinco conquistas de títulos mundiais do Brasil são pouco para o potencial do país nesse esporte. Em sua palestra, o treinador ressaltou o problema do calendário do futebol nacional, que sobrecarrega times grandes e deixa os pequenos ociosos. Para melhorar a situação, Soares propõe a organização do país em quatro divisões, com 20 clubes cada, e uma quinta divisão regionalizada, com 200 clubes ao todo.

Para o treinador Alfredo Montesso, ex-preparador físico da seleção da Jamaica, houve falhas muito importantes na seleção brasileira neste ano, destacando que o resultado positivo da Copa das Confederações não resultou em planejamento eficiente para a Copa do Mundo. Ele apontou também a excessiva concentração do trabalho na metodologia do treinador. "Quando qualquer treinador chega a qualquer clube brasileiro hoje, o que prevalece é o que ele determina. Os clubes não têm filosofia", indicou. O fato de a maioria dos treinadores ser ex-jogador, o que é uma opção legítima, segundo ele, tem um lado negativo, que é a reprodução de "métodos passados, que são usados apenas porque sempre deram certo".

O professor Valdir José Barbanti, da Escola de Educação Física e Esportes da Universidade de São Paulo (USP) de Ribeirão Preto, defendeu ser necessária uma recuperação da autoestima do brasileiro, porque, segundo ele, ainda não há país no mundo que exporte mais jogadores que o Brasil, nem existe outra nação em que ocorra tanta renovação de jogadores. Barbanti ressaltou o descompasso entre o futebol brasileiro e a apresentação feita no último mundial. "Eu penso que o treinamento brasileiro vai bem, obrigado. Ainda há muito a melhorar para ele ficar melhor, mas não significa que as coisas estão assim tão catastróficas e que está todo errado".

Apesar do balanço otimista, Barbanti considerou que o pouco tempo de treinamento foi um fator-chave para explicar o fracasso na Copa. Para ele, o tempo escasso deveria ter motivado um treino intenso e específico para as necessidades do campeonato. É um equívoco, defende Barbanti, os treinos feitos pela seleção em bicicletas ergométricas e em caixas de areia, exercitando movimentos que “não tem nada a ver com futebol”. “Vai dar um trote na pista porque isso ocorre no jogo”. “Os jogadores estão na academia, com pouco tempo de preparo e ficam fazendo movimentos que não existem no jogo”, lamentou. 

Psicologia em campo
A psicóloga Paula Teixeira Fernandes, do Departamento de Ciência do Esporte da FEF, abordou em sua palestra a importância da integração de aspectos físicos, táticos, técnicos e psicológicos para a busca do melhor resultado no jogo. Ela criticou o despreparo da equipe brasileira na Copa citando uma afirmação do jogador Neymar, que disse: "acho que não precisa de psicólogo, não estamos doidos". A seleção alemã contou com um grupo de 12 psicólogos para trabalhar com jogadores em simulações de situações de pressão, de conflitos ou ao receber vaias. Para a psicóloga, é necessário compor o perfil e as habilidades psicológicas do time e do jogador para que elas acrescentem no treinamento da equipe.

Engajamento precoce
Doutora em Fisiologia Humana pela USP, Martina Navarro mostrou detalhes do método usado pelo time holandês Ajax Amsterdam para formar profissionais mais completos. A pesquisadora da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) explicou que a abordagem se baseia no engajamento precoce dos atletas em diversas habilidades, proporcionando um jogador mais criativo. A ideia é usar a transferência de técnicas de outros esportes para o futebol. Um exemplo citado foi o judô, que trabalha a utilização da força do oponente para ajudar o jogador a se desvencilhar do adversário. O método é trabalhado a partir da idade biológica da criança, e não da idade cronológica, como geralmente ocorre, e resulta em um menor número de lesões e evasões