Especialistas discutem o reflexo do excesso
de medicalização no sistema educacional
17/11/2015 - 11:24
- Text:Luane Casagrande
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Concepções hegemônicas de conhecimento dão origem à política que protege o ideário em torno da medicalização. Entretanto, diagnosticar não responde somente a um recorte científico, já que a ciência é também uma construção político-econômica. O II Fórum Construindo Vidas Despatologizadas, aberto segunda-feira (16), no Centro de Convenções da Unicamp, reúne até esta terça (17) estudiosos e especialistas para debater os fatores e consequências do excesso de medicalização.
No início do Fórum foi feita uma moção de apelo à Câmara Municipal de Campinas, pela rejeição à proposta de emenda à Lei Orgânica do Município da deliberação sobre qualquer material legislativo que aborde questões de gênero e orientação sexual na escola, tema que, segundo Maria Aparecida Moysés, professora da Faculdade de Ciências Médicas (FCM) da Unicamp e uma das organizadoras do evento, é extremante necessário ser discutido no meio educacional. Segundo Moysés, a censura ao tema é inconstitucional, e uma manifestação de intolerância.
Os interesses privados intervêm na construção de políticas, levando à padronização da vida. Dentro dessa ótica, o capitalismo se apresenta como o colonialismo, em que identidades locais e de poder econômico patologizam a diferença em prol da produtividade. Ao mesmo tempo, os interesses econômicos dos grandes laboratórios farmacêuticos lucram ao garantir a produção do trabalhador, a partir da tolerância ao estresse, afirmou Inês de Oliveira, da Faculdade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ).
A Medicina vem ocupando espaços de reflexão e ação de áreas cujos problemas são sociais, expandido a atuação médica para além do seu conhecimento. A medicalização dá respostas aos problemas de aprendizagem que estão alheias ao campo da educação. Frente à omissão do sistema pedagógico, a não aprendizagem é vista como fenômeno individual a ser “tratado”. Diagnósticos como TDAH, Dislexia e Discalculia se tornam um linguajar comum no ambiente educacional, afirmando a manutenção do fracasso escolar, perpetuação de estigmas, isenção de responsabilidade das famílias e profissionais, afirmou Juliana Garrido, pedagoga e membro do Despatologiza. “A escola se coloca como uma instituição à mercê de um saber que ela sequer domina. Quem tem que resolver a questão pedagógica são os pedagogos dentro da escola. Como os médicos não entendem de alfabetização, não vai ser deles a resposta. Se a escola perdeu esse papel, deve reencontrá-lo.”
O produtivismo capitalista e o rendimento máximo também são critérios na educação, se opondo ao ideal de escola pública de qualidade para todos como direito universal. O sistema educacional se priva da autocrítica, medicalizando a desatenção como controle da atenção sem precisar produzir interesse e diálogo ou mudar a instituição, apontou Oliveira. As avaliações e metas de aprendizagem são colocadas como um controle curricular, em busca da “excelência”, mas reforçam a exclusão de sujeitos e de seus conhecimentos. Gestores e a “política de invisibilização” excluem o “socialmente difícil” por meio da patologização do comportamento não enquadrável.
Os diagnósticos devem ser feitos levando em consideração a subjetividade dos indivíduos. Gisela Untoiglich, da Universidade de Buenos Aires e membro do Forum Infancias, se opõe ao diagnóstico feito como profecia autorrealizável. Segundo Untoiglich, ele deve ser feito “a lápis”, já que as oportunidades subjetivas necessitam tempo e de um outro disponível. “A prática pedagógica deve prever diferenças e atendê-las. Se isso fosse levado a sério, nem precisaríamos de tantos diagnósticos”, acrescentou Garrido.
O II Fórum Construindo Vidas Despatologizadas é uma realização do [re]pense, novo grupo de estudos do Fórum Pensamento Estratégico (Penses) que se dedica a organizar eventos e produzir reflexões e discussões sobre patologização, intolerância e discriminação. O evento é organizado também pelo Despatologiza - Movimento pela Despatologização da Vida. O Penses é um espaço acadêmico, vinculado ao Gabinete do Reitor, responsável por promover discussões que contribuam para a formulação de políticas públicas voltadas ao desenvolvimento da sociedade em todos seus aspectos.
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