o
início deste milênio, quando já
completaram quatro décadas de profundas transformações
em todas as instâncias de seu modo de vida
do privado ao social , as mulheres
brasileiras são presenteadas por um trabalho
científico inédito no País,
capaz de servir, ao mesmo tempo, de espelho e guia
de suas condições de saúde.
E com sinais positivos: a taxa geral de mortalidade
está caindo, por exemplo. Todo esse potencial
está no livro Morbimortalidade feminina no
Brasil (1979 1995). Publicada pela Editora
da Unicamp, a obra foi organizada pela demógrafa
Elza Salvatori Berquó e pela socióloga
Estela María García Pinto da Cunha,
ambas do Núcleo de Estudos de População
(Nepo).
Embora
as maiores beneficiadas sejam as 86.120.890 mulheres
que, segundo o censo do IBGE (agosto do ano passado),
integram a população do Brasil, quem
passa a ter o estudo como livro de cabeceira, num
primeiro momento, são os serviços
voltados para a saúde feminina em todo o
território nacional. Ao longo das 412 páginas,
desfilam indicadores seguros o suficiente para subsidiar
políticas públicas que podem ser adequadas
para qualquer região, das industrializadas
sul e sudeste, aos bolsões de miséria
que ainda persistem no norte e nordeste.
Este
é um dos subprodutos mais esperados do estudo.
A publicação do livro é recente.
Mas temos certeza de que em cada um dos contextos
abrangidos, sua divulgação envolverá
seminários com os órgãos de
saúde locais, prevê Elza Berquó,
que é responsável pelo Programa de
Saúde Reprodutiva e Sexualidade do Nepo.
Afinal, o que ela e sua parceira coordenaram foi
uma pesquisa multicêntrica, que lança
as primeiras luzes sobre o panorama da morte e das
doenças das mulheres brasileiras. Dentro
do período pesquisado (antes, durante e imediatamente
após a implantação do Sistema
Único de Saúde SUS), são
caracterizados os níveis e tendências
históricas dessa realidade. Mas norteados
sempre pelos diferenciais regionais e locais.
Um
dos resultados mais significativos do estudo é
a constatação de que, nesses 16 anos
contemplados, houve uma queda de 2% na taxa padronizada
de mortalidade feminina. Porém, é
no aprofundamento da análise por faixas etárias
que desponta o dado aparentemente mais animador:
as brasileiras com idades entre 30 e 34 anos tiveram
uma redução de 29% em suas taxas de
morte. Essa tendência se manteve na maioria
das demais faixas, mas com valores menores, oscilando
entre 23% e 12%.
A exceção ficou por conta do grupo
situado a partir dos 65 anos, que apresentou um
crescimento de 8% nas taxas de mortalidade. Nada
que prenuncie, no entanto, qualquer motivo para
alarme: o fator pode perfeitamente ter sido condicionado
pelo aumento da expectativa de vida no Brasil, ano
após ano.
Relativização
Por
causa de variações como essa, a socióloga
Estela da Cunha enfatiza que, para uma interpretação
correta do livro, a relativização
dos dados é um guia aconselhável em
quase todos os momentos. Até pelo ineditismo
do trabalho, esbarramos em algumas limitações
quanto às fontes de informação,
observa. Uma delas é a subsistência,
ainda, de falhas no preenchimento de atestados de
óbitos. Há um elevado índice
de causas de morte mal definidas e até de
desconhecimento se houve assistência médica.
A
região nordeste serve bem para exemplificar
o que a pesquisadora enfatiza: entre 1979 e 1981,
52% dos óbitos foram classificados como ignorados
quanto a atendimento médico, percentual que
caiu para 49% entre 1993 e 1995. Nesse aspecto,
o desempenho mais satisfatório correspondeu
à região sul, que apresentou 34% no
mesmo período temporal, com redução
para 22% nos anos de 1993 a 1995.
Ao
mesmo tempo, Elza Berquó ressalta um ponto
positivo das diferenças regionais que marcaram
a qualidade dos dados: Fatores como cobertura
e causas mal definidas não deixam também
de fornecer subsídios às autoridades
locais para atuar na melhoria do sistema de informações
em saúde.
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