Víctor, ex-aluno: criador do
Miner, hoje diretor do UOL
Desenvolvimento de ferramenta de
busca rende cargo executivo a jovem formado no Imecc
ROBERTO COSTA
Pouco mais de 10 anos após completar o curso de Matemática Aplicada e Computacional na Unicamp, o goiano Víctor Fernando Ribeiro, 32 anos, faz o que muitos sonham ao entrar numa Universidade. É o diretor de conteúdo e de tecnologia do Universo Online, o UOL, empresa que reúne os grupos Folha e Abril e tem o mais extenso conteúdo em língua portuguesa do mundo, atingindo mil cidades no Brasil. Víctor foi parar no UOL graças ao desenvolvimento do Miner, ferramenta de busca na Internet, que vendeu para a empresa em 1999. O UOL comprou o produto desenvolvido pelo ex-aluno da Unicamp, como o convidou para criar o Bol, um portal que oferecia e-mail grátis e outros serviços.
Víctor Ribeiro passou cinco anos na Belgo Mineira, em Belo Horizonte e defendeu a dissertação de mestrado na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Desde 2002 cuida do conteúdo do UOL. Para atender as exigências de 1,2 milhão de assinantes pagantes, "quebra" a cabeça para oferecer novas opções de serviços. Um deles é acelerador UOL, que permite o acesso à Internet com maior velocidade. O produto saiu antes mesmo que a América Online, maior provedor dos Estados Unidos, tivesse a opção. O mesmo modelo de arquitetura utilizado no AntiSpam UOL, outro serviço, recebeu elogios de Bill Gates, em novembro do ano passado. O foto-blog, que acaba de ser oferecido pelo UOL a seus assinantes, é mais um produto que saiu do grupo de trabalho do diretor de tecnologia e sua equipe.
Victor usa a própria Internet e suas salas de bate-papo como fonte para novas investidas. Não deixa de atender pedidos de estudantes. No ano passado esteve na Unicamp para um evento da empresa júnior do Instituto de Computação. Mas evita conceder entrevistas a veículos de comunicação. Abriu uma exceção ao Jornal da Unicamp,
Vestibular em Brasília - Antes de chegar ao 10º andar de um imponente edifício na avenida Faria Lima, em São Paulo, sede do UOL, Víctor Ribeiro batalhou bastante. Morou em Goiânia, Belo Horizonte e em Brasília. Terminou o colegial no Colégio Sigma. Aproveitou quando a Unicamp ampliou seu vestibular nacional-89, para inscrever-se na primeira turma que fez provas em Brasília. No mesmo ano foi aprovado na Universidade de Brasília, em Engenharia Mecânica. Na UFMG, onde já estudavam dois irmãos, passou em Engenharia Química.
Mas o fascínio pela Unicamp foi decisivo para que viesse para o campus de Barão Geraldo. Há 15 anos a lista de aprovados da Unicamp era divulgada apenas pelos jornais. Víctor conta que o resultado saiu numa sexta-feira e no dia seguinte, caso fosse aprovado, precisaria fazer a matrícula em Campinas. Ligou às 10 horas para o escritório da Universidade em Brasília e soube que estava na lista de espera.
Sem o pai em casa, que viajara na sexta pela manhã, a serviço (é veterinário), só restava pegar o ônibus e passar a noite na estrada. A passagem comprada por Víctor foi a última para Campinas no ônibus da Rápido Federal, mais um sinal de que a decisão que tomara fora acertada. Fez a matrícula e voltou naquele mesmo dia. Conheceu Campinas apenas em fevereiro de 1989.
Economia de um semestre - O curso de matemática aplicada e computacional, oferecido pelo então Instituto de Matemática, Estatística e Ciência da Computação (Imecc), foi completado seis meses antes do prazo. "Minha mãe diz que foi a fase que me socializei. A Unicamp mudou muito a minha vida", conta Ribeiro. "Se me formei como pessoa foi na Unicamp. Meus pais deram a base". Morou os primeiros três meses do curso na casa da namorada de um primo..
"Eu freqüentava a Faculdade de Educação Física (FEF) com os colegas da faculdade", recorda-se com emoção. Jogava basquete na hora do almoço, nadava e ia para o "bandejão". A entrada no restaurante universitário acontecia sempre no último momento possível. Era importante usar cada minuto. Adalbero Fernandes, colega de república e um dos fundadores do Gaia, aproximou Víctor dos esportes. "Foi ele quem me levou ao paredão de escaladas da FEF pela primeira vez", cita Ribeiro. Lembra-se com carinho das atividades que desenvolvia como monitor na Universidade Aberta ao Público (UAP), evento que foi interrompido por alguns anos e retornou em 2003 como Unicamp de Portas Abertas (UPA).
Rato de biblioteca - Víctor Ribeiro passava horas e horas na Biblioteca Central da Unicamp. "Eu era um rato de biblioteca", revela. Como os livros de matemática eram escritos em sua maioria em inglês, especializou-se na tradução deles. Havia a dificuldade do dinheiro curto que precisava ser contornada. O inglês fluente de hoje é fruto dessa dedicação. Final de curso antecipado, aproveitou o período para começar sua dissertação de mestrado na FEEC, com o professor Secundino Soares Filho, com quem fizera a iniciação científica. Concluiu três créditos na pós e não perdeu tempo para agarrar uma oportunidade de trabalho na Belgo Mineira, em Belo Horizonte.
Na Belgo conheceu Roberto Tavares, com quem trabalhou anos. "Fiz ‘trocentos’ projetos na Belgo", diz. Credita a Tavares o aprimoramento profissional. "Se a Unicamp criou minha base, Roberto me poliu na Belgo". Não estava totalmente satisfeito na empresa. "Eu me divertia com o que fazia. Mas queria mais a parte tecnológica". Além disso, os créditos no mestrado, na Unicamp, estavam por expirar. Aproximou-se da UFMG, onde conheceu Nívio Ziviani, no Laboratório para Tratamento da Informação (Latin).
Miner - No primeiro semestre de 1996, Nívio estava procurando um aluno interessado em estudar "como montar um programa de busca na Internet", dentro da disciplina Projeto e Análise de Algoritmos. Víctor lhe enviou um e-mail com a proposta de avaliar o desenvolvimento de robôs para navegar na Internet. O casamento era perfeito. Em junho de 1996 foi testado um primeiro protótipo de um robô para a web. Era o início do Miner e sua família. "O trabalho ficou tão bom que convidamos o Víctor a se aprofundar no assunto e desenvolver mecanismos de busca na Internet", descreve Nívio. Foram quase dois anos entre o nascimento da ferramenta de busca e a defesa da dissertação de mestrado, em fevereiro de 1998.
O produto precisava chegar ao mercado. Do contrário, os esforços teriam sido inúteis. O lançamento do software aconteceu no mesmo mês em que a dissertação foi apresentada. Com pequena divulgacão, por e-mails, começou a receber 3.000 consultas/dia. O pentium de 75 MHz do laboratório que hospedava a Família Miner precisou ser trocado de imediato. Não suportava o serviço que oferecia. O sucesso levou Víctor e Nívio a criarem a Miner Technology Group em abril de 1998. Para a empreitada juntaram-se ao grupo Emílio Loures, Guilherme Emrich e Ivan Moura Campos.
UOL - Víctor relembra que mandou e-mails para diversos webmasters na época, contando a novidade que a família Miner representava. "Um deles foi para o UOL. O Rodrigo Santaliestra me respondeu, dizendo que iria colocar um link". Trocou mensagens com Sergio Esteves, gerente de tecnologia do UOL, que se interessou em ter a ferramenta de busca em sua página. Um acordo de parceria com o UOL foi fechado em 31 de agosto de 1998. A venda aconteceu menos de um ano depois. Em 22 de junho de 1999 o Universo Online adquiria o Miner Technology Group. O contrato previa a compra do software e seus serviços, assim como seus criadores iriam tomar conta deles no grupo UOL, especificamente no BOL. Dos cinco sócios, apenas Victor assumiu o desafio.
O valor da venda para o UOL é guardado a sete chaves. Serviços desse tipo valiam fortunas no final dos anos 90. O livro Bastidores da Internet no Brasil, lançado no ano passado e que dedica três páginas para descrever o trabalho de Victor Ribeiro, fala em 5 milhões de reais. Ribeiro nega que seja este o valor. O grupo, ao fechar contrato com o UOL, doou 100 mil reais para a UFMG, em gratidão. Certamente a venda foi muitas vezes superior a este valor.
Futuro - Víctor Ribeiro ainda mantém o mesmo interesse pelos livros, que aperfeiçoou em sua passagem pela Unicamp. No início de março lia Nosso futuro pós-humano, de Francis Fukuyama e outros dois técnicos, de sua área de atuação. Tem o costume de não ler livros de capa a capa. Vai direto na apresentação e na conclusão. Se gosta, investe na parte de seu interesse. Atualmente escreve com a esposa Alice, dentista, sua primeira obra. Sem entrar em detalhes conta que vai ser sobre Internet. "Quem sabe ainda seja lançado neste ano", projeta. Também não sabe, por absoluta falta de tempo, quando poderá fazer o doutorado. Tem planos para isso. Deve optar por uma área diferente da que trabalha no UOL. Pensa em algo na filosofia ou na sociologia.