Gaúcho de Ijuí, Cylon formou-se mestre e doutor em Física pela Universidade da California, Berkeley (1972). Na Unicamp, desenvolveu pesquisas no Instituto de Física Gleb Wataghin, no qual ingressou em 1974, após um período de dois anos dedicados ao Instituto de Física da UFRGS, onde concluiu o curso de Física (1967). Tem extenso currículo, que inclui atividades de ensino, pesquisa e liderança de projetos científicos, no Brasil e no Exterior. Publicou mais de 70 artigos científicos em revistas internacionais, na área de Física da Matéria Condensada, e em anais de conferências.
Editou cinco livros na área de Física da Matéria Condensada. Desde 1991 é membro titular da Academia Brasileira de Ciências. Entre 1999 e 2001 foi professor-visitante na La Trobe University, em Melbourne, Austrália. Foi diretor-geral do LNLS de 1986 a 98, quando tornou-se diretor-geral da Associação Brasileira de Tecnologia de Luz Síncrotron, organização social que se responsabiliza por gerenciar o LNLS, primeira instituição de C&T do Brasil a adotar este modelo de gestão. Aposentou-se pela Unicamp em 1998 e, em julho de 2001, deixou a direção da ABTLuS. Em entrevista ao Jornal da Unicamp, Cylon falou de suas expectativas como novo integrante do MCT e das estratégias necessárias para o Brasil alavancar a inovação tecnológica.
O mais novo desafio de
Cylon Gonçalves da Silva
Clayton Levy
Jornal da Unicamp - Qual será a sua principal função no MCT?
Cylon Gonçalves da Silva - A função da secretaria é propor ao ministro [Eduardo Campos, ministro de C&T] políticas que ele levará ao Conselho de Ciência e Tecnologia para serem aprovadas ou não. É o Conselho que formula as políticas. Para isso, a secretaria se ocupa de um leque muito amplo, incluindo a biodiversidade, biotecnologia, ecossistemas, meteorologia, micro e nanotecnologia, mudanças climáticas, mar e Antártica.
JU - O ministro fez alguma recomendação especial para o desempenho dessas atividades?
Cylon - Do ponto de vista político, ele pediu que haja especial atenção às prioridades estabelecidas pelo governo, em particular para a política industrial, na gestão da biodiversidade e em questões relacionadas à infra-estrutura do País.
JU - Em sua opinião, que avanços a nova política industrial apresenta em termos de pesquisa e desenvolvimento no setor empresarial privado?
Cylon - O grande avanço foi começar a discussão. O que tentaremos na secretaria é fazer com que a empresa brasileira incorpore cada vez mais pesquisa e desenvolvimento. Vamos usar os mecanismos de fomento disponíveis para acelerar esse processo, financiando pesquisas cooperativas entre universidades, institutos de pesquisa públicos e empresas nas grandes áreas mapeadas pela nova política industrial.
JU - De onde virão os recursos?
Cylon - Uma parte pequena virá do orçamento do MCT e outra parte, mais significativa, virá dos fundos setoriais. No âmbito do ministério do Desenvolvimento contamos com o BNDES.
JU - Isso significa que haverá um incremento dos fundos setoriais, que se encontram contigenciados?
Cylon - Os recursos destinados aos fundos dependem da atividade econômica no país. Todos representam um certo percentual de uma determinada atividade econômica. Quanto mais a economia crescer, mais recursos serão destinados aos fundos setoriais. O compromisso do MCT é lutar pela liberação dos recursos dos fundos setoriais para programas de importância estratégica para o país.
JU - O MCT já mapeou as áreas consideradas estratégicas para receber recursos dos fundos setoriais?
Cylon - Há áreas já identificadas e outras que estão sendo analisadas. A atuação do ministério não se limita simplesmente à questão de P&D na empresa, mas enfoca também a gestão do patrimônio nacional. Há outras áreas igualmente importantes. A questão da Amazônia, por exemplo, é uma delas. Não é uma questão de inovação mas é uma questão de políticas públicas para conhecer e gerir melhor o patrimônio nacional. Para isso, são necessários levantamentos da biodiversidade amazônica, meteorológicos, hidrológicos, de solo, informações demográficas, econômicas, que precisam ser conhecidas para se formular políticas públicas consistentes e de longo prazo.
JU - Voltando às medidas necessárias para gerar P&D nas empresas, sabe-se que o acesso a recursos novos não resolve totalmente o problema. Há ainda a questão fiscal, que também representa um obstáculo para novos investimentos. Como o MCT pretende abordar essa questão?
Cylon - A política industrial é uma política de governo e não de ministérios. O próprio ministro Furlan [Luiz Fernando Furlan, ministro do Desenvolvimento], ao anunciar a nova política industrial, colocou esta questão para o ministro Palocci [Antonio Palocci, ministro da Fazenda], que estava presente ao ato. Para que tenhamos uma política industrial consistente é necessário equacionar questões de ordem fiscal e trabalhista. São questões complexas. A questão fiscal impacta diretamente a política econômica, mas, nesse momento, não podemos prever o que vai acontecer.
JU - A nova política industrial também foca a nanotecnologia. Como um dos maiores especialistas brasileiros no assunto, como o senhor define a importância estratégica dessa área para o país?
Cylon - A nanotecnologia representa a possibilidade de uma nova onda de inovações. Trata-se de um instrumento extremamente importante para o desenvolvimento de novos produtos e novos processos, não apenas em segmentos de alta tecnologia mas também nos setores mais tradicionais da indústria, como têxteis, construção civil, etc. É importante para o Brasil, que tem um grande segmento de industrias convencionais, conseguirmos fazer com que estas empresas comecem a incorporar nanociência e nanotecnologia em seus produtos e processos. Isso porque a sua competitividade internacional vai depender disso. Por isso pretendemos buscar mecanismos que estimulem a incorporação dessas tecnologias no setor industrial brasileiro.
JU - Que ações estão previstas para isso?
Cylon - Fomentar projetos cooperativos de pesquisa entre grupos universitários e empresas. Com a aprovação da Lei de Inovação, poderemos eventualmente fomentar diretamente na empresa essas atividades. Sem esquecer que teremos de continuar fomentando a pesquisa básica, porque trata-se de um setor onde ainda há muito a aprender. Como os recursos humanos e financeiros são limitados, teremos de procurar alavancar os poucos recursos do MCT com os fundos setoriais, ou então conectando áreas como biotecnologia e micro e nanotecnologia. Para isso estamos pensando em lançar programas conjuntos, que combinem recursos para atacar problemas que exigem ferramentas de micro e nanotecnologia e também de biotecnologia.
JU - O MCT pensa em criar algum centro nacional de pesquisa em nanotecnologia?
Cylon - O ministro Furlan falou, em sua palestra sobre a nova política industrial, sobre a criação de um laboratório nacional de micro e nanotecnologia. Mas até onde sei, ainda não há nenhum projeto formatado sobre isso. Além disso, no âmbito do MCT não há recursos para esse fim.
JU - Em sua opinião, que tipo de política é necessária para desenvolver uma cultura de inovação tecnológica nas empresas privadas?
Cylon - Não há uma receita pronta. É um processo lento de mudança cultural, portanto de convencimento. Diria até que se trata de um processo de substituição de uma geração por outra. A nova geração, que dará origem aos futuros empresários, está tendo uma formação intelectual muito melhor. Os estudantes que saem da Unicamp, por exemplo, já saem imbuídos de espírito empreendedor e percebem as oportunidades de trabalho e de gerar riqueza com o conhecimento. Isso significa que estamos plantando essa semente nos jovens que serão os líderes da sociedade brasileira dentro de 20 ou 30 anos.
JU - Que avaliação o senhor faz das mudanças feitas no texto da Lei de Inovação, enviada recentemente pelo governo ao Congresso?
Cylon - A lei ficou mais simples. Deixou de abordar em detalhes questões que diziam respeito mais ao funcionamento interno das universidades. Na sua essência, porém, as grandes questões tratadas pelo texto anterior permaneceram nessa nova versão. Ela vai um pouco mais adiante, porém, ao criar a possibilidade de injeção direta de recursos públicos na empresa privada para atividades de P&D.
JU - Os debates sobre política para P&D estão se tornando mais freqüentes. Pode-se considerar isso como um sintoma de que o país despertou para a importância estratégica da área de C&T?
Cylon - O país está começando a descobrir isso. A realização da Conferência Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação (realizada durante o governo FHC) foi um marco importante nesse processo de conscientização da sociedade brasileira sobre essas atividades. A crise que o país está vivendo, a dificuldade de retomar o crescimento, a percepção de que sem crescimento a situação vai piorar, tudo isso ajuda a perceber a importância estratégica de C&T. Se olharmos para fora, os países que foram bem-sucedidos e estão crescendo são aqueles que sabem transformar conhecimento em riqueza.