Gripe aviária
É realmente desconcertante o destino de recursos para a pesquisa sem um bom embasamento teórico (ou a necessidade de autopromoção de alguns pesquisadores): sim, diversas aves que se reproduzem na Antártica deslocam-se durante o rigor do inverno austral para regiões mais ao norte, permanecendo durante este período em alto mar e águas da plataforma continental. Várias destas aves aparecem mortas ao longo do litoral brasileiro em decorrência principalmente de tempestades ou fenômenos semelhantes em alto mar.
No entanto, é importante lembrar: não há sequer sombra de contaminação como o vírus H5N1 na Antártica (requisito básico para que aves oriundas deste continente pudessem disseminar a doença para o Brasil). Esta falta de confirmação da doença seria devido a ausência de um inquérito? Ou ao fato de que nenhuma ave que se reproduz na Antártica utilize alguma das áreas contaminadas pelo H5N1 (por exemplo, Europa, Sudeste Asiático e Oriente Médio), para então retornar à sua origem e contaminar o restante de sua população?
E em segundo lugar, as aves da Antártica que chegam ao solo brasileiro literalmente “morrem na praia”, ou seja, não costumam freqüentar a costa brasileira (somente águas da plataforma continental). Desta forma, jamais alcançariam áreas próximas a criações de aves, onde o confinamento, a alta densidade e a homogeneidade genética tornam muito fácil o alastramento da doença.
Carmem Elisa Fedrizzi, bióloga, Laboratório de Elasmobranquios e Aves Marinhas
* Resposta O que mais almejam os integrantes do Plano Emergencial de Monitoramento da Influenza Aviária é retornar da Antártica com uma resposta negativa ao inquérito de H5N1 em aves migratórias. Entretanto, para dar tranqüilidade à sociedade, às autoridades e a toda a cadeia produtiva do maior exportador de frangos do mundo, uma resposta baseada em presunções não é suficiente. É necessária uma investigação científica.
O ambiente antártico reúne características excepcionais para a transmissão do vírus. As altas densidades das aves em suas colônias, as baixas temperaturas e a convergência de rotas migratórias vindas de diversas partes do globo levaram os pesquisadores da Divisão Antártica da Austrália a elegerem vírus (IA e Newcastle) como o maior risco à saúde da fauna antártica no momento.
No ano passado, Elsa Baumeister, pesquisadora argentina do Centro Nacional para a Influenza Aviária da OMS, publicou dados confirmando a presença de diversas variedades do vírus da IA (menos patogênicas, mas com formas de transmissão muito semelhantes às do H5N1) em aves migratórias da Antártica.
Existem diversas espécies de aves que rotineira ou eventualmente chegam ao Brasil vindas da Antártica ou de regiões sub-antárticas, entre elas a pomba-do-cabo, a pomba-antártica, a marreca-parda, o maçarico-de-sobre-branco, a gaivota-rapineira, o pingüim-de-magalhães, a garça-vaqueira etc.
Mas o risco de chegada do H5N1 ao país não se resume ao contato direto entre aves migratórias infectadas e criações de frangos. Descobertas recentes vêm aumentando a lista de espécies transmissoras do vírus e, além de diversas espécies de aves selvagens, gatos, porcos e até pequenos mamíferos poderiam servir de ponte para levar o vírus de uma ave “morta na praia” a uma criação de frangos no interior. O risco do contágio indireto tem recebido atenção especial em todos os grandes planos mundiais de prevenção e combate ao H5N1 (OMS, FAO, USDA).
Tentativas anteriores de prever o avanço, ou não, da doença tiveram pouco êxito. Apenas neste ano, em mais de 30 países onde, até então, não “havia sequer sombra de contaminação” foram detectados focos do H5N1. Conforme o Departamento do Interior dos EEUU (área livre do H5N1) um plano nacional de detecção prévia de IA em aves migratórias não é apenas prudente, é necessário!
João F.C.A. Meyer (Joni), em nome do grupo do Plano de Ação Emergencial Monitoramento Extra-Territorial da Influenza Aviária