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Objetivo de linha de pesquisa é reunir
informações para otimizar atendimento e diagnóstico


Especialistas sistematizam dados sobre
dois grupos de anomalias craniofaciais

RAQUEL DO CARMO SANTOS

A professora Vera Lúcia Gil da Silva Lopes (terceira, da esquerda para a direita) e a equipe de trabalho: falta de troca de informações acarreta desconhecimento das peculiaridades dos defeitos congênitos (Foto: Antoninho Perri)Linha de pesquisa conduzida no Departamento de Genética da Faculdade de Ciências Médicas (FCM) desenvolve um trabalho sistemático para reunir o maior número de informações possíveis e traçar um panorama do atendimento e intervenção em dois grupos de anomalias craniofaciais mais freqüentes: as fissuras de lábio e de palato (lábio leporino) e as craniossinostoses – fechamento precoce das moleiras do bebê. O estudo concentra-se em frentes de atuação preconizadas por diretrizes da Organização Mundial da Saúde (OMS). São elas: saúde pública, diagnóstico, diretrizes de seguimento e intervenção, e educação continuada.

De acordo com a geneticista e coordenadora da linha de pesquisa, professora Vera Lúcia Gil da Silva Lopes, o projeto, denominado Crânio-Face Brasil começou, justamente, por uma necessidade assistencial. “O Brasil tem hospitais especializados reconhecidos internacionalmente para reabilitação de anomalias craniofaciais. Portanto, não nos falta tecnologia. O que observamos é que existe escassez na troca de informações com as esferas de atenção primária e secundária, resultando, em muitas situações, em desconhecimento das peculiaridades destes defeitos congênitos”, explica Vera.

Diretrizes da OMS norteiam estudo

A concentração de hospitais especializados nas regiões Sul e Sudeste gera falta de profissionais da saúde com formação apropriada e acarreta dificuldades na abordagem inicial e manutenção do tratamento. Ao considerar o nascimento de uma criança com lábio leporino, explica Vera, existe a expectativa dos pais para saber por que aconteceu o defeito. “Eles ainda precisam lidar com a necessidade de ganho de peso do bebê para os procedimentos de correção nos hospitais especializados”.

“Nesta fase já identificamos a necessidade de avaliação do geneticista – para tentativa diagnóstica, orientação da equipe multiprofissional para condutas antecipatórias e aconselhamento genético da família – do fonoaudiólogo (para a escolha do método alimentar) e de um pediatra com informações para suporte nutricional adequado”, esclarece.

Após a correção cirúrgica, ainda é necessário acompanhamento fonoaudiológico, nutricional, ortodôntico, psicológico, entre outros profissionais de outras especialidades, os quais nem sempre estão acessíveis nas diferentes cidades do país. Por isso, estudos sobre as características assistenciais no Brasil e na região de Campinas estão sendo desenvolvidos pelo grupo de pesquisa, com financiamento Fapesp, CNPq e Faepex/Unicamp.

O ideal, segundo a geneticista, seria a assistência médica apropriada já no nascimento da criança. No caso da fenda de lábio e palato, é importante que o bebê saia da Maternidade com orientações mínimas. O que ocorre, no entanto, é o encaminhamento do paciente para um hospital especializado, atendimento que pode demorar, em média, três ou quatro meses. Neste intervalo de tempo, conta Vera, por mais que o bebê seja atendido em um posto de saúde, nem sempre há aparato ou informações suficientes para dar assistência nesta fase.

O diferencial do projeto, coordenado por Vera, está justamente em relacionar a genética ao atendimento aos pacientes. “A genética sempre é vista como uma especialidade de laboratório e as publicações e projetos muito divulgados, em geral, se concentram nas pesquisas laboratoriais”, declara. Ela destaca, no entanto, que o médico geneticista é um dos especialistas recomendados pela OMS como profissional necessário na equipe mínima de atendimento da área de anomalias craniofaciais. É no atendimento que aparecem hipóteses para estudos de identificação da causa de um defeito, câncer ou problema genético específico.

Cadastro – Dentro das ações propostas no projeto Crânio-Face Brasil voltado para a saúde pública, foi realizada em 2003 coleta de dados junto a 130 serviços do país. São 23 hospitais especializados, sem contar os terciários que estão inseridos no programa. O cadastro nacional apontou que o atendimento é insuficiente. “As fissuras de lábio e de palato são mais que um problema estético. Além de desfigurante, causam alterações funcionais e, mesmo corrigidos, os cuidados de diversas áreas da saúde permeiam boa parte da vida, quando não a vida inteira”, argumenta Vera.

Uma base de dados para coleta de informações genéticas é outra iniciativa do projeto e conta com o apoio da OMS. A validação envolverá outros seis centros, além do HC da Unicamp, espalhados pelo país – Recife, Fortaleza, Joinville, Curitiba, Porto Alegre e São José do Rio Preto. Três destes centros são especializados e os demais classificados como hospital terciário, sendo que o mesmo modelo de base de dados será aplicado nas duas categorias com o objetivo de validar o instrumento. Uma vez validada, a mesma poderia ser expandida para todos os hospitais especializados para uma informação consistente do quadro da enfermidade no país.

Atendimento no HC é realizado desde 2002

O Departamento de Genética atende, há mais de 30 anos, os casos encaminhados para diagnóstico e aconselhamento genético para as anomalias craniofaciais. A professora Vera Lopes conta que, a partir de 2002, foi iniciado o atendimento inicial multiprofissional. “Eu observava que os pacientes chegavam em condições desfavoráveis para intervenção cirúrgica ou tratamento para reabilitação, uma vez que não se tratava de apenas diagnosticar a doença. Percebi, então, que as necessidades eram muito maiores do que eu poderia oferecer sozinha”, revela. Cerca de 60% das crianças que chegavam para o atendimento genético estavam desnutridas, e outras 30% apresentavam quadro de desnutrição crônica.

A geneticista buscou a ajuda da Equipe Multiprofissional de Terapia Nutricional do HC e recebeu o apoio de uma fonoaudióloga para início do atendimento multiprofissional que se transformou na Linha de Cuidados Essenciais Pré-cirúrgicos. Com isso, a coordenadora do projeto acredita que os resultados obtidos no HC podem ser considerados como um modelo estratégico para, inclusive, dar suporte para equipes de outras cidades interessadas. “Esta é uma fase que já estamos tentando implantar. Temos condições de oferecer treinamento para os profissionais de saúde dos municípios para que o companhamento desses pacientes seja feito na própria cidade de origem”, explica.

No HC da Unicamp, o grupo presta atendimento às quartas-feiras, no período da tarde. O grupo é composto pela geneticista Vera Lopes e um residente na área de Genética; pela Equipe Multiprofissional de Terapia Nutricional, com os médicos Roberto José Negrão Nogueira, Alexandre Esteves Souza Lima e um médico residente; as fonoaudiólogas Neusa Reyes e Michelly Cristina da Silveira e a colaboração de uma aprimoranda. O atendimento recebe ainda o apoio da Disciplina de Cirurgia Plástica, coordenada pelo médico Jorge Psilakis.

Causas das doenças podem ser genéticas ou ambientais

De acordo com a professora Vera Lopes, as fendas do lábio leporino e a craniossinostoses não são classificadas como doenças raras. Das doenças craniofaciais, as fissuras são uma das mais freqüentes. Uma entre 650 a 1.000 crianças nasce com o problema. No caso do fechamento precoce da moleira, um a cada 2.500 bebês são acometidos.

Nas duas enfermidades, as causas podem ser genéticas ou ambientais. Nas fissuras do lábio e do palato, ingestão de bebida alcoólica durante a gravidez, doenças infecciosas ou uso de corticóides podem influenciar no aparecimento. Das causas genéticas, a maioria dos casos obedece ao modelo de multifatorial, ou seja, a pessoa tem predisposição e pode estar associado a um fator ambiental. Há também o grupo cuja causa é apenas genética. “Às vezes é preciso acompanhar por mais de um ano ou até mais para um diagnóstico conclusivo”, esclarece.

Os medicamentos para doenças imunológicas podem levar ao fechamento precoce da moleira e ocorrer pressão intracraniana, acarretando lesão cerebral ou problemas na visão e audição, alteração fácil e de arcada dentária, coluna e pés.

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