| Edições Anteriores | Sala de Imprensa | Versão em PDF | Portal Unicamp | Assine o JU | Edição 393 - 21 de abril a 4 de maio de 2008
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Professora comenta obra que traz artigos de 43
pesquisadores de nove países e que está saindo em português

Livro reúne informações essenciais
sobre o cultivo de células animais

LUIZ SUGIMOTO

A professora Ângela Maria Moraes, uma das organizadoras da obra (Foto: Antoninho Perri) O desenvolvimento de biofármacos a partir de moléculas compostas por proteínas complexas, obtidas com o cultivo de células animais, é uma área que vem passando por um boom nas últimas décadas. Esta técnica de cultivo, que já é utilizada com êxito na produção de vacinas e proteínas terapêuticas, começa a estender-se para outros campos, como de transplantes de órgãos, terapias celulares e gênicas, toxicologia e fisiologia in vitro, produção de biopesticidas, dispositivos bioeletromecânicos e nanobiotecnologia.

Propriedade intelectual
é destacada na obra

O tema é abordado em praticamente todos os seus aspectos no livro Animal cell technology: from biopharmaceuticals to gene therapy (Tecnologia de cultivo de células animais: de biofármacos a terapia gênica), da Editora Taylor & Francis, que terá a edição em português lançada em breve pela Editora Roca. “O livro traz 21 capítulos, assinados por 43 autores de nove países, em mais de 500 páginas”, afirma Ângela Maria Moraes, professora da Faculdade de Engenharia Química (FEQ) da Unicamp e uma das organizadoras da obra.

O professor Octavio Ramírez, da Universidade Nacional Autônoma do México, informa no prefácio que dentre os mais de 500 produtos biofarmacêuticos que se encontram atualmente em testes clínicos, cerca de metade é produzida com o cultivo de células animais. Segundo ele, os biofármacos obtidos por meio desta tecnologia representam um mercado de dezenas de bilhões de dólares anuais e que cresce acentuadamente.

“O livro é dividido em duas partes, uma de fundamentos e outra voltada para aplicações do cultivo de células animais”, explica Ângela Moraes. Os 21 capítulos estão relacionados com os aspectos biológicos mais relevantes – clonagem e expressão de proteínas heterólogas, crescimento e morte celular, meios de cultura e metabolismo – e também com aspectos tecnológicos e de engenharia – projeto, operação, monitoramento e controle de biorreatores, além de separação de células e da purificação dos produtos.

A professora Ângela Maria Moraes (à esq.) em laboratório da FEQ: aspectos biológicos, tecnológicos e de engenharia (Foto: Antoninho Perri)De acordo com a professora da FEQ, o livro registra inicialmente os marcos no cultivo de células animais, que buscam a produção em maior escala de biofármacos. “O próprio desenvolvimento de frascos especiais para o cultivo destas células, com tampas que facilitam a oxigenação e em formatos adequados para favorecer a adesão celular e o armazenamento em estufa, já representa um marco”.

Outro marco, na opinião de Ângela Moraes, foi a introdução de antibióticos no meio de cultura, em meados do século passado, a fim de contornar problemas com a contaminação microbiana. “Uma célula animal leva em média 24 horas para se duplicar, enquanto uma bactéria pode fazê-lo em 20 minutos, dominando o sistema.”

Depois de detalhar as características das células animais em cultura e de comparar seu cultivo com o de microorganismos, os autores tratam da clonagem de células animais para a produção de proteínas heterólogas. “São apresentadas metodologias para modificar geneticamente as células para obter uma proteína de interesse. É descrito ainda como isolar uma célula ou como buscar aquelas de interesse no meio da população modificada”.

Hibridomas – O livro detalha os fundamentos da tecnologia de hibridomas, produtos da fusão in vitro de mielomas com linfócitos B normais. “Um linfócito produtor de um anticorpo de interesse, por exemplo, não é capaz de se propagar in vitro, enquanto que mielomas podem ser cultivados indefinidamente. O hibridoma junta as características positivas de ambos: se reproduz inúmeras vezes e pode fornecer ‘eternamente’ a molécula desejada”.

Há um capítulo inteiramente dedicado à formulação de meios de cultura para células animais, com destaque para aqueles livres de soro animal. “Com o advento da doença da ‘vaca louca’ e a transferência de outros contaminantes, como vírus, juntamente com esse tipo de soro, as agências reguladoras passaram a requerer meios de cultura mais definidos quimicamente e livres de componentes de origem animal”.

O livro descreve o mecanismo de proliferação das células in vitro, com atenção especial à morte celular, que precisa ocorrer o mais tardiamente possível, a fim de prolongar o período de produção. “Um capítulo que interessa particularmente aos engenheiros químicos é o de modelagem matemática do crescimento celular e da síntese de produtos”.

Purificação – As técnicas de purificação das proteínas, segundo Ângela Moraes, estão também entre as informações importantes na obra, pois muitas vezes se exige uma pureza de até 99,9% para proteínas terapêuticas. Além dos procedimentos relativos à purificação, o livro trata também de aspectos regulatórios, de controle de qualidade e validação.

A propriedade intelectual também é objeto do livro, visando principalmente aos pesquisadores da academia, por vezes mais preocupados em publicar os resultados de seu trabalho em revistas científicas do que em patentear os produtos. “Explicamos os requisitos de patenteabilidade e apontamos os caminhos, além de mostrar exemplos de invenções”.

Ainda a esse respeito, a professora menciona as proteínas recombinantes e vacinas virais, dentre outros produtos, hoje disponíveis e que têm mercado assegurado. “Contamos a história do desenvolvimento de alguns deles, a sua comercialização atual e também informamos sobre patentes expiradas e prestes a vencer – o que permitiria produzi-las no Brasil. Um exemplo é a eritropoetina, usada na terapia de anemia, que já motivou a Argentina a instalar uma planta para sua produção”.

Biopesticidas – Os biopesticidades têm seu espaço no livro. Ângela Moraes observa que ouvimos pouco sobre esses produtos, embora o Brasil seja um dos maiores usuários, sobretudo na cultura da soja. “Para controlar a lagarta da soja, que desfolha a plantação em pouco tempo, podem ser empregados baculovírus, comumente obtidos de lagartas infectadas”.

A professora informa que o baculovírus é muito específico, inofensivo aos mamíferos e com baixa persistência no ambiente. No entanto, a falta de informação contribui para a predominância do pesticida químico, com seus conhecidos danos à saúde e à natureza. “O biopesticida infecta a lagarta, que adoece e demora alguns dias para morrer. Como o processo é mais lento, o agricultor por vezes questiona sua eficácia”.

A docente acrescenta que também falta ao país uma plataforma melhor definida de produção de baculovírus em larga escala, o que poderia ser feito pela infecção de células de insetos em cultura, em oposição ao uso de lagartas, aumentando a oferta de vírus.

Os dois últimos capítulos do livro envolvem duas áreas altamente em voga em termos de aplicação: o cultivo de células tronco para utilização em várias terapias, em artigo assinado por especialistas de renome; e a terapia gênica, onde as possibilidades para o cultivo de células animais são comentadas por autores de igual nível. “O conhecimento nestas áreas ainda é limitado, mas o potencial desta tecnologia para esses dois tipos de terapia é espetacular”, assegura Ângela Moraes.

Edição em português atende pedido de alunos

Uma rede de pesquisadores brasileiros envolvidos com a cultivo de células animais começou a surgir há poucos anos, congregada em torno dos cursos de treinamento organizados pela professora Leda Castilho, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Em 2004, a docente organizou com o professor Ricardo Medronho, também da UFRJ, o I Seminário Latino-americano de Cultivos Celulares, que atraiu para a rede pesquisadores do exterior.

Atuante na rede, a professora Ângela Moraes, juntamente com Leda Castilho e a pesquisadora Elisabeth Augusto, do Instituto de Pesquisas Tecnológicas do Estado de São Paulo (IPT), não teve dificuldade em atender ao pedido dos alunos da Unicamp, reunindo autores para produzir um livro mais completo sobre esta tecnologia, em português.

Esta edição primeira em inglês deve-se ao fato de a proposta do livro e seu conteúdo, que começou a ser produzido em português em 2004, ter sido comentada com o professor Michael Butler (da Universidade de Manitoba, Canadá), referência mundial no assunto. “Ele, que já constava como autor de um dos capítulos, achou a idéia excelente e ofereceu-se para ajudar a lançá-lo em inglês, fazendo a revisão dos textos e uma criteriosa análise de consistência dos capítulos. O professor veio ao Brasil, trabalhou no livro por cerca de um mês e acabou como co-autor de mais um capítulo”.

O livro em português está em fase de verificação final das provas e será lançado até o meio do ano, estando destinado a graduandos, pós-graduandos e pesquisadores de engenharia de bioprocessos, engenharia química, farmácia, biologia, microbiologia, química, biomedicina e áreas afins. Os autores dos capítulos do livro em português são do Brasil, Argentina, Chile, Alemanha, Canadá, Cuba, Uruguai, Espanha e Portugal.

FICHA TÉCNICA

Animal Cell Technology: From Biopharmaceuticals to Gene Therapy
Organizadores: Leda R. Castilho (UFRJ), Ângela Maria Moraes (Unicamp), Elisabeth F. P. Augusto (IPT), Michael Butler (Universidade de Manitoba, Canadá)
Ano: 2008
Editora: Taylor & Francis Group
ISBN: 978-0-415-42304-5

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