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Saúde ambiental tenta recuperar o atraso

Como enquadrar a questão ambiental entre os fatores importantes de análise por parte da área de saúde pública? Quais os impactos das mudanças ambientais de larga escala na saúde da coletividade? Em 1995, o Ministério da Saúde brasileiro só tinha indagações como estas a apresentar em uma conferência panamericana de saúde ambiental convocada pela Organização Mundial de Saúde. Precisava de idéias.

“Só há 15 dias a Associação Brasileira de Saúde Coletiva criou um Comitê Técnico de Saúde de Meio Ambiente; no âmbito do Ministério, tal comitê foi criado apenas em janeiro deste ano”, informa o pesquisador Ulisses Confalonieri, da Fiocruz (Escola Nacional de Saúde do Rio de Janeiro), que socorreu o governo federal naquela época e ainda tenta tirar o atraso do Brasil neste setor.

“Todos os problemas ambientais têm impacto na saúde, alguns podendo ser detidos, outros não. Mas não existem indicadores, que estão fora da rotina do Ministério”, afirma Ulisses, acusando a omissão do poder público na questão, embora não no debate. “O governo é omisso na geração de informação. O problema é que não se estudam e produzem estatísticas? Muito pouca gente está preocupada”.

A Fiocruz, porém, segundo o professor, vem desenvolvendo estudos e corroborando tudo o que se anunciava diante da onda de devastação do planeta. “O Brasil ainda não tem problemas com a perda da camada de ozônio, mas ela já se avizinha no Cone Sul. Assim mesmo, por conta da demasiada exposição ao sol, no lazer ou no trabalho, temos câncer da pele. Uma grande parte dos 30 milhões de cegos no mundo adquiriu a deficiência por causa da catarata, cujo principal fator também é a exposição ao sol”.

Indicadores – Visando alcançar um indicador mais confiável sobre o problema no Brasil, a equipe do professor Ulisses Confalonieri utilizou alguns parâmetros de saúde para monitorar o problema ambiental. A proposta levada ao Ministério mostra que a degradação do saneamento causa diarréia, por exemplo; que o trânsito caótico mata por atropelamento; que a malária chega à área urbana; que ruído urbano causa perda auditiva; que inundações trazem leptospirose. E o que o professor considerou mais curioso: “O morcego nos deu uma mostra de como a perda de ecossistema pode agir contra a saúde humana. Nas regiões do garimpo que devasta a fauna, o morcego, na falta de animais, vai e suga o sangue humano, fato comum no Mato Grosso, Rondônia, Acre...”.

Seminário vira livro em Encontro Mundial

O seminário Dimensões Humanas de Mudanças Ambientais Globais: Perspectivas Brasileiras reuniu 11 pesquisadores de diversas áreas de conhecimento. Eles terão seus trabalhos publicados em livro a ser lançado no IV Encontro Aberto da Comunidade Internacional de Pesquisas sobre Dimensões Humanas de Mudanças Ambientais Globais, programado para os dias 6, 7 e 8 de outubro, no Hotel Glória do Rio de Janeiro.

“Esta será a primeira vez que pesquisadores de um país anfitrião apresentarão um trabalho desta natureza, mostrando suas contribuições para a questão”, explica Maurício Tiomno Tolmasquin, da UFRJ, um dos membros do comitê responsável pela organização do encontro do Rio e presidente da Comissão Brasileira para as Dimensões Humanas de Mudanças Ambientais Globais.

O conjunto dos trabalhos expostos na Unicamp é uma reflexão sobre como as mudanças ambientais afetaram as populações, a partir do início da década passada – em aspectos como economia, saúde e comportamento –, e como os governos vêm agindo na negociação de mecanismos de controle das emissões de poluentes atmosféricos.

Neste ponto, o Brasil aparece como duplamente importante. “Primeiramente em relação à importância de suas emissões no conjunto das emissões mundiais, particularmente em relação ao desmatamento. Em segundo lugar, por seu papel ativo na construção de um regimento ambiental global para enfrentar a mudança climática”, adianta o professor Eduardo Viola, mencionando a Convenção do Rio em 92 (Eco 92) e o Protocolo de Kyoto em 97. Viola é cientista político do Departamento de Relações Internacionais e Centro de Desenvolvimento Sustentável da UnB.

Os autores reconhecem que o livro não pretende der a palavra final sobre a problemática e que ainda existem muitos retoques necessários, bem como lacunas a serem preenchidas. “Mas vai mostrar exatamente qual é a colaboração da pesquisa brasileira para a questão das mudanças globais, o que não correu em encontros anteriores nos EUA (1995), Áustria (1997) e Japão (1999)”, frisa o pesquisador Maurício Tolmasquin.

Ciências humanas reforçam a luta pelo meio ambiente

 

O seminário realizado na Unicamp mostrou a entrada das ciências humanas no grupo das áreas de conhecimento que até então predominavam nas questões ambientais. “Toda a preocupação com as mudanças ambientais globais, até muito recentemente, foram tratadas por oceanógrafos, cientistas da atmosfera e outros cientistas de exatas e biológicas, ao passo que quase todas as perguntas têm sua origem na ação humana”, analisa o sociólogo Daniel Joseph Hogan, coordenador geral do evento e do Nepo.

Eduardo Viola, da UnB, encontra outro diferencial no movimento. “Até agora, aconteceram no País seminários na dimensão da ciência natural, apenas em nível local ou brasileiro nas dimensões humanas, e um ou outro sobre as dimensões globais. Este encontro envolve totalmente o humano-global-ambiental, quando antes era disperso. É o primeiro evento com algo de novo em termos de história da ciência, com papers representativos do que há de melhor na comunidade científica”.

Hogan admite a demora da chegada das ciências humanas nas discussões ambientais. “Esta mobilização de cientistas políticos, sociólogos, demógrafos, economistas, tem sido difícil. Surgiu então a idéia deste seminário, a fim de que esses pesquisadores mudassem seu foco para os problemas ambientais globais, avaliando determinantes na estrutura da sociedade, de consumo, e quais são suas respostas e inovações institucionais exigidas em nível nacional e internacional”, explica Hogan. “Todos esses problemas são matéria para humanas”, reforça.

As respostas da sociedade, segundo um estudo específico incluído no livro, vão da indiferença diante das mobilizações, passando pelo consumo. Floresceram conceitos e terminologias. Comunidades de áreas de proteção ou de interesse ambiental passaram a ser chamadas de “populações tradicionais”; o retirante nordestino de “refugiado ambiental”; e produtos ecologicamente corretos de “verdes”.

 


 

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