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Os físicos e a Bíblia

 

JU – Qual sua avaliação sobre o Big Bang?

Danhoni – É uma questão atual e complicada, porque uniu várias físicas, desde a cosmologia até a relatividade e criou uma estrutura que não pode ser testada. Tem sido um paradigma que está se tornando um dogma quase religioso da criação: “Existiu, há 15 ou 20 bilhões de anos, um momento onde só havia trevas e tudo virou luz...”.

Lattes – Isso é frescura do George Gamow (físico norte-americano, 1904-1968, a quem se atribui a teoria do Big Bang). O que possui o Gamow, além do Big Bang? A penetração das barreiras de potencial. Isso acontece em qualquer noite de núpcias. Esse é o George Gamow...

Danhoni – Ele ficou até chateado com Penzias e Wilson (Arno Penzias e Robert Wilson), que ganharam o Nobel (em 1978) pela descoberta da radiação fóssil, por não terem lembrado dele.

Lattes – Mas a radiação fóssil é uma descoberta experimental, não precisa se encaixar numa teoria...

Danhoni – Gamow, numa carta que enviou ao Penzias, fala: “Eu perdi uma moeda e vocês a encontraram”.

Lattes – Modesto...

Danhoni – Mas a história do Big Bang tem essa questão da bola de fogo, do Gamow, que ganhou força.

JU – Lemaître (Georges-Henri Lemaître, padre e cosmólogo belga, 1894-1966) foi o primeiro a propor um modelo específico para o Big Bang, a estudar modelos teóricos que deram origem à teoria de Gamow...

Lattes – Espera, vamos com calma. Lemaître escreveu “O átomo primitivo”. O abade era respeitável.

Danhoni – Tinha o Friedmann (matemático e meteorologista russo Alexander Friedmann, 1888-1925, que descobriu soluções das equações da teoria da relatividade geral, a teoria de gravitação que suplantou a de Isaac Newton, 1643-1726)...

Lattes – O Friedmann era bom também.

Danhoni – A história do Big Bang, de que foi Gamow quem propôs esse modelo, utilizando até os estudos do Friedmann e do Lemaître, é tida como oficial. Mas a predição da temperatura da radiação fóssil é uma coisa do final do século retrasado, de quando havia gente que acreditava em um modelo estático de Universo. Como o Guillaume (C. Guillaume), que ganhou o Nobel (em 1920).

Lattes – Você também está aderindo a essa história de predição? No meu tempo era previsão. Sabe por que eu não ganhei o prêmio Nobel? Em Chacaltaya, quando descobrimos o méson-pi, se publicou: Lattes, Occhialini (Giuseppe Occhialini) e Powell (Cecil Powell, físico britânico que ganhou o Nobel em 1950 por fotografar os núcleos atômicos e pela descoberta do méson). E o Powell, malandro, pegou o prêmio Nobel pra ele. Occhialini e eu entramos pelo cano. Ele era mais conhecido, tinha o trabalho da produção de pósitrons em 1933. Depois fui para a Universidade da Califórnia, onde foi inaugurado o sincrociclotron em 1946. Já era 1948 e estava produzindo mésons desde que entrou em funcionamento em 46, tinha energia mais que suficiente. Então, detectamos, Garden (Eugene Garden) e eu, o méson artificial, alimentando a presunção de retirar do empirismo todas as pesquisas que se relacionassem com a libertação da energia nuclear. Sabe por que não nos deram o Nobel? Garden estava com beriliose, por ter trabalhado na bomba atômica durante a Guerra, e o berílio tira a elasticidade dos pulmões. Morreu pouco depois e não se dá o prêmio Nobel para morto. Me tungaram duas vezes.

JU – Professor Marcos, qual a teoria defende para a origem do Universo?

Danhoni – Não acredito num Universo que nasce. Acredito, diferentemente do professor Lattes, num Universo infinito, que não tem origem, que sempre existiu.

Lattes – Concordo com você, mas não chamo de infinito, chamo de indefinido.

Danhoni – Pode ser. Minha idéia é quase uma idéia Bruniana.

Lattes – Sabe o que Giordano Bruno disse quando estava ardendo, morrendo queimado pela Inquisição (acusado de conspiração contra a Igreja)? “O Sol é uma estrela como as outras!”.

Danhoni – Giordano é mesmo um monstro universal, mas ainda pesa sobre ele essa censura. Ele falava em pluralidade dos mundos infinitos: que o Universo é infinito e Deus está em todas as coisas, portanto, em lugar algum. É um Universo aninimista. A estrela tem origem, desenvolvimento e morte. Ela vira uma fábrica atômica, produzindo elementos pesados como hélio, oxigênio, ferro e aí implode, explode e lança isso, que vai semear vida ou destruir vidas em outros sistemas. Assim talvez o Universo fosse contínuo, perpétuo dentro de sua infinidade. Agora, toda essa história do Big Bang explica a interpretação de uma coisa única: você tira o espectro de uma galáxia, o Universo está se expandindo e um dia ele esteve num ponto singular. E eu faço uma pergunta: todos nós sabemos que, pela Teoria da Relatividade, nada pode escapar de um buraco negro...

Lattes – Isso é uma bobagem. O buraco negro do Gamow (risos), uma bobagem, só tem o dele.

Danhoni – Mas a pergunta: se nada pode escapar de um buraco negro, como pôde o Universo nesse ponto singular se expandir? Ou seja, é uma coisa muito fantasiosa.

JU – Pois é. Mas permanece a dúvida: de onde teria vindo a matéria para explodir e originar o Universo, no caso do Big Bang? E que vale também para a teoria de um Universo infinito. De onde veio a matéria?

Danhoni – Eu acho que jamais conseguiremos uma resposta para isso. E isso dará emprego aos físicos (risos).

Lattes – Deus pode ter criado a matéria, pode até ter criado o espaço, mas o tempo, não. O tempo é uma variável termodinâmica, que cria a si mesmo, pelo fato de tender para a desordem. (Pára, pensativo). Mas ainda estou aprimorando isso no meu tratado. Fica para a próxima sessão. Vai haver próxima sessão?... Acho que ainda leva tempo.

JU – O senhor é um crítico ferrenho da Teoria da Relatividade e do próprio Einstein (Albert Einstein, físico alemão, 1878-1955).

Lattes – Coitadinho, a culpa não é sua, foi assim que te ensinaram. Mas você sabe de quem é o princípio de relatividade?

Danhoni – Não nasce com o Poincaré (Jules Henri Pincaré, físico, matemático e astrônomo francês, 1854-1912)?

Lattes – Mesmo antes, mesmo o Galileu (Galileu Galilei, físico, matemático, astrônomo, filósofo, literato italiano, 1564-1642), o próprio Newton (Isaac Newton, físico, matemático e astrônomo inglês, 1642-1727) certamente falaram em relatividade. Mas quem anunciou corretamente e colocou em ordem foi o Poincaré, em 1900. Lá já aparece que o movimento retilíneo uniforme não pode ser detectado num laboratório. Admitindo como postulado (algo que não pode ser demonstrado) que o movimento retilíneo uniforme não altera os fenômenos de um laboratório fechado, e chamando a isso de princípio da relatividade – como eles falam –, mesmo que mais tarde viesse a ser provado o contrário pela experiência, Poincaré queria ver quais seriam as conseqüências lógicas. É assim que ele começa seu trabalho. Tudo o que Einstein diz, sobre dilatação do período dos relógios em movimento, variação da massa com a velocidade, isso é Lorentz (Hendrik Antoon Lorentz, físico holandês, 1853-1928). Einstein é uma bobagem. Eu não acredito na relatividade. Mas se ela fosse verdadeira, numa espaçonave que está em repouso em relação às galáxias ou em movimento retilíneo uniforme – o que não é possível porque o espaço está cheio de radiação –, você observaria os mesmos fenômenos, tanto num laboratório parado quanto num em movimento. O princípio do movimento retilíneo uniforme é do Poincaré. Einstein confundiu medida de grandeza física com grandeza física, que é uma coisa objetiva. O metro dele encolhe dependendo da velocidade. Depois, ele fez uma teoria da gravitação fajuta, que chamou de relatividade geral. Não tem relatividade geral. A teoria é furada. O movimento de aceleração é absoluto. Einstein é um palhaço, plagiador! Um século de tapeação e ninguém desmascarou.

Danhoni – É essa adesão ao modelo tido como real. Quem fez a fama do Einstein foi o Arthur Eddington (astrônomo e físico inglês, 1882-1944).

Lattes – Esse é um palhaço puro.

JU – O Eddington é o inglês...

Danhoni – O Eddington mandou uma equipe para o Brasil em 1919, em Sobral, e outra acompanhou na Guiné os melhores pontos para se observar um eclipse. É só durante um eclipse que você vê as estrelas de fundo e pode comparar se elas estão no mesmo ponto ou se a luz delas está defletida ou não. Só que ele pegou as chapas com desvio acima ou abaixo do previsto por Einstein e desconsiderou. Fez uma análise estatística de erros observacionais e experimentais e aquilo se encaixava dentro do previsto por Einstein. Isso fez a fama de Einstein.

JU – Como vocês avaliam a física no Brasil?

Danhoni – A ciência brasileira está muito condicionada pela Califórnia, que tem um indexador de revistas científicas, o ISI, “Institute for Scientific Information” (Web of Cience), um grande truste que indexa revistas do mundo inteiro – oito mil dentre cerca de 150 mil publicações, pouquíssimas no Brasil. E se você não publica nessas revistas, não faz ciência séria. A ciência séria, portanto, está atrelada à ciência que é feita no primeiro mundo.

JU – Danhoni, você é doutor em Educação e se mostra didático ao falar dos fenômenos astronômicos em “O Mago que veio do Céu”, um livro para crianças...

Danhoni – No livro de criança quero algo de ciência informal e tento recuperar o sistema referencial geocêntrico. Não por crença, mas porque é o que a gente vive inicialmente.

JU – O “Memórias do Invisível” enfoca um pouco dessa sua postura contra a doutrina educacional seguida atualmente...

Danhoni – O “Memórias...” tem vários livros dentro dele. É uma reunião de minha produção em 15 anos, sempre enfocando essa questão da não dogmatização da ciência, para estimular de alguma forma o pensamento divergente. Só que infelizmente a academia, no mundo, trata mal os divergentes, ela está interessada em comércio. E se você começa a questionar a física do estado sólido, a cromodinâmica quântica, fica meio de lado porque não vai produzir tecnologia. Você começa a incomodar.

JU – O que resta ser descoberto?

Danhoni – Tudo. E tudo o que for descoberto será reinterpretado no futuro.

Lattes – O que era aceito já não é mais.

Danhoni – A maioria das vezes a gente vê o que o nosso esquema teórico pede para a gente ver.

Lattes – Eu não vou nessa, não.

 

 

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