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Olhar espectral
Nova tecnologia de imagens aéreas digitais permite
prever safras e planejar produção

CARLOS TIDEI

mais moderna tecnologia de captação de imagens aéreas de culturas agrícolas já está disponível aos agricultores brasileiros, graças a uma técnica desenvolvida pelo Grupo de Estudos em Geoprocessamento, da Faculdade de Engenharia Agrícola (Feagri) da Unicamp. O novo equipamento fornece informações fundamentais para previsão e planejamento da safra agrícola, revelando, por exemplo, o estágio de desenvolvimento das plantações em determinadas áreas e incidência de pragas ou doenças, entre outras características.
Segundo Jansle Vieira Rocha, professor da Feagri, o trabalho é acessível aos pequenos agricultores, que podem se cotizar em cooperativas e dividir as despesas com vôo e processamento das imagens, obtendo informações de todas as áreas plantadas. O aluguel de um pequeno avião para captar imagens durante uma hora, tempo suficiente para filmar uma extensa área, fica em torno de R$ 300,00.

A coleta de informações sobre as condições das culturas agrícolas utilizando a nova técnica representa um grande avanço científico diante dos métodos tradicionais, tanto pela redução da margem de erro e de tempo de pesquisa, como pela maior gama de informações obtidas. O projeto de pesquisa foi financiado pela Fapesp, ao custo de R$ 80 mil, e utiliza imagens aéreas coletadas por videografia multiespectral (a bordo de aviões e helicópteros) para auxiliar o processo de estimativa de safras. A técnica consiste em capturar imagens digitais de áreas plantadas, na faixa do espectro do infravermelho, e gerar mapas de variabilidade espacial da cultura.

Uma mesma imagem capturada pelo equipamento (uma pequena câmera de vídeo, semelhante às utilizadas para vídeos caseiros, que registra imagens em menos quadros por segundo) fornece quatro bandas espectrais distintas das plantações: azul, verde, vermelho e infravermelho. A radiação do sol refletida nas plantas revela, no infravermelho, propriedades da cultura que o olho humano não enxerga. Pela análise das diferenças das cores apresentadas, obtida por meio de processamento digital, é possível apontar, por exemplo, áreas onde é necessário reforço de adubação, irrigação, combate a pragas e até planejar a colheita em uma seqüência que priorize faixas onde a cultura está mais desenvolvida.

Segunda Guerra – A técnica não é recente: foi bastante utilizada durante a Segunda Guerra para detectar tropas e tanques camuflados na vegetação. A novidade é o aperfeiçoamento da tecnologia, com maior definição das imagens e pesquisas que podem estabelecer padrões dos diferentes comportamentos espectrais de culturas agrícolas. “Mais avançada que esta tecnologia é a imagem hiperespectral, desenvolvida e estudada por meio de sensores em aviões da Nasa (agência espacial norte-americana), mas que já está sendo disponibilizada em sensores a bordo de satélites. Os sensores hiperespectrais deverão fornecer mais detalhamento do comportamento espectral dos diversos alvos na superfície terrestre, facilitando a sua diferenciação e mapeamento”, esclarece Rocha.

Estão envolvidos no projeto três docentes e 10 alunos de graduação e pós-graduação da Feagri, todos em áreas específicas de pesquisas, tais como meteorologia, biomassa, análise de solo e trabalho de campo, entre outras. “A partir das imagens captadas e coleta de dados no campo estudamos os diversos padrões das culturas e sua correlação com a produção de biomassa e produtividade”, detalha. Os estudos poderão abranger outras culturas, em parceria com produtores ou cooperativas.
Como as imagens são digitais e de alta definição, trabalha-se com a câmera conectada diretamente ao computador, onde um programa as registra e as trata.

Pequenas diferenciações no interior das plantações podem ser ampliadas para análises mais detalhadas. “Com o tratamento digital podemos realçar mais ainda os detalhes de determinadas ocorrências. O infravermelho revela a estrutura celular interna das plantas e as deficiências causadas por pragas, doenças, seca etc. Por exemplo, se a plantação for alterada em sua forma somente pelo vento (acamamento), haverá uma pequena diferença de luminosidade; mas se o problema for de ordem orgânica, a alteração da resposta da planta à radiação solar fica mais evidente nas imagens”, explica o pesquisador.

 

Tecnologia promissora para a cultura de cana

 

A aplicação da nova tecnologia de sensoriamento remoto, orbital ou não orbital, tem se revelada particularmente promissora no setor sucro-alcooleiro, tanto por ser uma cultura dinâmica, de ciclo anual, que abrange grandes áreas, como por possuir um complexo esquema de planejamento, gerenciamento e logística, além de alta tecnologia agroindustrial.

Informações mais precisas e com antecedência em relação à época da safra são essenciais para o planejamento do transporte, processamento e armazenamento da produção, bem como para a tomada de decisões relacionadas à sua comercialização, fatores importantes para o planejamento estratégico do setor. A crise energética tem chamado a atenção de volta à cultura de cana-de-açúcar, dado o seu potencial de produção de biomassa que pode ser aproveitada para a geração de energia.

O processo tem sido utilizado com grande sucesso em plantações de cana no interior paulista. Em um trabalho realizado junto com a Usina São João Açúcar e Álcool, em Araras, este método possibilitou uma melhora de até 12% nos valores estimados de produção. A usina fecha contratos antecipados, em até oito meses, para venda do produto, e necessita de uma avaliação dos resultados da colheita antecipadamente.
Não é possível, por exemplo, retardar a colheita de cana devido à perda de teor de açúcar. Mas em alguns casos é possível antecipar a colheita com aplicação de maturador. A previsão do volume proporciona a redução de custos de armazenagem, e a avaliação dos danos causados por intempéries ou queimadas acidentais também pode ser mais precisa.

Métodos tradicionais de coleta de informações sobre produção agrícola do setor sucro-alcooleiro, como levantamentos e observações de campo, consomem muito tempo e estão sujeitos a imprecisões que comprometem as estimativas do volume dos produtos finais (álcool e açúcar), o que influencia diretamente na composição de preços e no fechamento de contratos de fornecimento das empresas ligadas ao setor.
O sensoriamento remoto proporciona uma visão sinótica da superfície, permitindo a análise e o mapeamento da distribuição espacial das áreas plantadas. Com esses mapas é possível detectar regiões com maior ou menor produção de biomassa dentro das áreas de plantio, auxiliando os técnicos encarregados a estimar a produção das usinas, direcionando suas observações de campo.

 

Serviço pode ser usado em mapeamento de mata

 

A tecnologia multiespectral pode ser aplicada em qualquer cultura agrícola e também no estudo de florestas. A fundação para preservação da Mata Santa Genebra, em Campinas, estuda contratar os serviços de mapeamento das clareiras existentes na área, que não são detectadas pelas imagens do Landsat (satélite de prospecção espacial). O satélite Landsat 7 fornece imagens com resolução de 30m X 30m para cada ponto (pixel), enquanto a imagem multiespectral obtida por videografia digital pode fornecer pontos de até 10cm X 10cm. A resolução espacial é reduzida ou ampliada de acordo com a altitude dos aviões ou helicópteros, pelo controle da distância de captação das imagens, o que não é possível com satélites.

Pelas imagens obtidas é fácil identificar as áreas onde há cana, pasto, frutas, grãos, florestas, eucalipto, cursos de água, terra nua etc. Difícil é distinguir culturas muito semelhantes, tais como soja e feijão. “Nesses casos, somente trabalhando com dados multitemporais, ou seja, com imagens captadas em épocas diferentes, acompanhando o desenvolvimento da planta ao longo do tempo”, esclarece Rocha. “Ou através de imagem hiperespectral, ainda pouco disponível, o que ocorrerá em breve. Aí reside a importância da pesquisa. Estamos realizando um trabalho de vanguarda na área, que futuramente terá aplicações mais eficientes”, acrescenta Rubens Augusto Camargo Lamparelli, pesquisador do Centro de Ensino e Pesquisas em Agricultura (Cepagri), que integra o Grupo de Geoprocessamento.

Com base nos mapas fornecidos pelos pesquisadores, acompanhados de um relatório simplificado do comportamento das áreas filmadas, o agricultor pode planejar melhor sua produção. “O produtor, mesmo sendo leigo na tecnologia, conhece muito bem sua propriedade e identifica as ocorrências nas imagens”, afirma Lamparelli. Existem apenas quatro câmeras semelhantes no Brasil, todas em órgãos de pesquisa e universidades. Por uma questão de custo e também por falta de conhecimento, a tecnologia ainda é pouco utilizada por pequenos produtores.

 


 

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