Suave, a dor A Caism recorre à arte para proporcionar
um ambiente menos árido aos pacientes
ISABEL
GARDENAL nquanto
espera, Marilane Oliveira Garcia olha para o infinito, como se estivesse prestes
a desvendar mais um mistério. Está grávida. Aguarda a chegada
do segundo filho e tem apenas 18 anos. Aos poucos tenta desviar o foco de preocupação,
olhando o movimento ao redor: gente chegando, gente saindo, gente esperando para
ser atendida. O
cenário não é o de um shopping center - chafariz, escada
rolante, lojas, jogos de luzes onde as pessoas vão porque se sentem
bem. O ambiente é outro, onde outras tantas pessoas vão para curar
a dor e a angústia. Por isso temos procurado suavizar o tempo de
permanência debaixo do mesmo teto, sob o qual convivem lado a lado doentes
e pessoas sãs, explica o oncologista Luiz Carlos Zeferino, diretor-executivo
do Centro de Atenção Integral à Saúde da Mulher (Caism).
De repente,
Marilane detém os olhos em um ponto diferente de tudo aquilo, fora da atmosfera
triste. A visão é sugestiva: cores, formas, ação.
Parece ter sido transportada para uma galeria de arte. É a arte sendo
levada ao hospital, acrescenta Zeferino. Por que não?.
Na tarde
de 5 de junho, a direção do Caism promoveu em suas dependências
uma vernissage para tornar oficial o trabalho voluntário que vinha sendo
realizado há exatos três anos por seis pintores: Fúlvia Gonçalves,
Luciane Gardesani, Luise Weiss, Jeronimo Noboru, Marilene Laubenstein e Rejane
Barros. Boa safra de artistas do Instituto de Artes (IA) da Unicamp. Foi
uma prazerosa parceria com o hospital, avalia Noboru, um dos organizadores
da exposição. A
mostra reúne 20 dos 100 quadros em aquarela ainda previstos para integrar
o acervo do hospital. São pinturas abstratas, lúdicas, holísticas,
paisagísticas, de traços japoneses e do universo da infância.
Segundo Zeferino, a introdução da pintura em lugares estratégicos
pode trazer, de certa forma, benefícios terapêuticos aos pacientes.
Os mesmos
quadros ilustram as páginas do catálogo Acervo do Caism: Primeiro
Módulo e o site www.caism.unicamp.br. Concluída esta fase do projeto,
que culminou com a mostra, o diretor do hospital adianta que a segunda etapa está
praticamente pronta, desta vez com a chancela de outros artistas. Onde a
arte puder atuar, ela atuará, enfatiza Noboru, referindo-se à
rotina hospitalar como fonte de inspiração. Nossa proposta
e a da direção do Caism é tornar o ambiente interno menos
árido e mais humano. Maria
Aparecida Campanholi, enfermeira no Pronto-Atendimento, acredita que os quadros
doados pelos artistas para ficarem expostos no hospital permanentemente
trazem um pouco mais de esperança a pacientes e familiares, que
passam a refletir sobre a beleza dos temas, tendo aliviada a tensão da
espera. Hermano Paião, funcionário do Serviço de Apoio Médico
e Estatístico, diz que o paciente poderá apreciar pintura de boa
qualidade e, quem sabe, estimular-se a fazer o mesmo. O dom é natural,
mas o incentivo faz despertar para a arte. Humanizar
é o lema | Desde
quando era chamado de o caçula da área de saúde
da Unicamp, o Caism se notabiliza como hospital-modelo no tratamento exclusivo
à mulher. Criado nos moldes ingleses de assistência, em 1986, teve
sempre incorporada a filosofia de oferecer mais que um simples atendimento. Prova
disso é o processo de humanização pelo qual vem passando
principalmente nos últimos cinco anos, com a prática mais voltada
ao paciente, mas sem deixar de lado seus funcionários.
Dinâmicas como agendamento de consultas com hora marcada por telefone, trabalho
da capelania, coral, fóruns semanais entre equipe médica e paramédica
enfocando a atenção ao paciente e reuniões com familiares
são constantemente estimuladas pela instituição, somadas
à modernização de áreas clínicas, cirúrgicas
e de pesquisa. De acordo com o diretor Luiz Carlos Zeferino, nada disso seria
suficiente sem que houvesse a recuperação da auto-estima dos funcionários,
hoje bem treinados, de bem com o ambiente e com eles mesmos. Esses fatores
fizeram ressurgir uma plêiade de programas que têm o paciente como
ponto de convergência. E são estas características que fazem
do Caism um hospital público diferente dos demais. Quanto melhor formos,
mais teremos a oferecer, finaliza Zeferino.
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