Tecnologia preserva
componentes nutricionais de óleos
RAQUEL DO CARMO SANTOS
Na busca de soluções para os problemas enfrentados pela indústria no refino de óleos vegetais, entre os quais as perdas nutricionais e no processamento do produto, o professor Antonio José de Almeida, da Faculdade de Engenharia de Alimentos (FEA), e as engenheiras Christianne Elisabete da Costa Rodrigues e Cintia Bernardo Gonçalves chegaram à tecnologia chamada desacidificação por extração líquido-líquido para a remoção da acidez dos óleos. Depois de testada, nos óleos de farelo de arroz e de palma, os resultados da aplicação foram positivos para preservar altos níveis dos componentes nutricionais. O teste revelou também uma metodologia viável economicamente, pois minimiza a perda do óleo neutro ou isento de acidez.
O foco dos pesquisadores no processamento dos óleos vegetais é porque possuem importantes nutrientes para o organismo humano. O óleo de farelo de arroz, por exemplo, apresenta um complexo único de substâncias antioxidantes formado, principalmente, pelo orizanol e vitamina E que, se ingeridos em quantidades aceitáveis, podem reduzir o colesterol. O processamento deste tipo de óleo bruto até o produto final, no entanto, não é dos mais fáceis. Ele é dificultado pelo elevado índice de acidez, alto conteúdo de ceras e forte coloração, além de acarretar a perda de grande parte do complexo antioxidante durante seu método tradicional de refino, conhecido como refino químico. “Mesmo com as dificuldades de processamento, o potencial econômico deste tipo de óleo não deve ser desprezado. No Brasil, ao contrário dos países asiáticos que o utilizam, esse óleo é produzido em índices muito baixos”, destaca Meirelles.
Um exemplo do possível ganho econômico é que as estimativas apontam uma produção de arroz em casca de cerca de 11 milhões de toneladas para o ano de 2004. Considerando-se um rendimento de 10% em termos de farelo, que pode conter em torno de 15% de óleo, estima-me uma capacidade de produção em torno de 165 mil toneladas de óleo bruto. Isto representaria uma significante fonte adicional de renda para o pequeno e médio produtor de arroz, que atualmente utiliza o farelo de arroz na produção de ração animal e fertilizantes, desprezando seu potencial em termos nutricionais.
O óleo de palma merece destaque entre os óleos vegetais, principalmente por sua vasta aplicação industrial e por ser considerado uma das maiores fontes naturais de carotenóides (precursores de vitamina A). São importantes pela eficiência na redução do risco de certos tipos de câncer e da incidência de cegueira noturna. Os benefícios nutricionais, porém, somente são usufruídos quando este óleo é consumido em sua forma bruta, mais conhecida como azeite de dendê, bastante utilizado na cozinha baiana. No método tradicional de refino do óleo de palma, conhecido como refino físico, os carotenóides são destruídos devido ao emprego das altas temperaturas de operação.
Para este óleo, a tecnologia de desacidificação por extração líquido-líquido também se mostrou bastante eficaz, uma vez que permite a obtenção de um óleo sem acidez e com alto nível de carotenóides. “Acredito que exista um nicho de mercado que poderá tranqüilamente absorver o produto”, opina Cintia. A produção de óleo de palma no Brasil é bastante volumosa. Estima-se uma produção para o ano de 2004 de cerca de 133 mil toneladas, um aumento de 13,7% em relação ao ano anterior.
As investigações foram realizadas no Laboratório de Separações Físicas (Lasefi) da FEA e, segundo Meirelles, o desenvolvimento da pesquisa aguarda uma parceria com empresas para realização de testes em escala industrial, visando eventuais ajustes do processo. Os trabalhos constam das teses de doutoramento de Christianne, defendida em maio último, denominada “Desacidificação do óleo de farelo de arroz por extração líquido-líquido” e de Cintia, “Equilíbrio de fases de sistemas compostos por óleos vegetais, ácidos graxos e etanol hidratado”, apresentada em junho na FEA. Ambas as teses foram orientadas por Meirelles.
Óleo neutro Da extração até chegar à mesa do consumidor, os óleos vegetais têm um rendimento baixo com efeito no custo final do produto. Meirelles explica que a remoção dos ácidos graxos livres, denominada desacidificação, é o passo mais importante do processo de refino, principalmente porque o rendimento do óleo isento de acidez (ou neutro), nesta etapa, tem um efeito significativo no custo do processo. “Quanto maior a acidez, mais óleo neutro é perdido. Para cada 1% de acidez presente no óleo bruto, perde-se o dobro de óleo neutro”.
A tecnologia proposta pelos pesquisadores da FEA apresenta como principal vantagem em relação ao refino físico o menor consumo de energia, pois é realizada em temperatura ambiente e pressão atmosférica. Quanto ao refino químico, baseado na adição de soda cáustica ao óleo contendo acidez, a nova tecnologia de desacidificação se destaca pelo fato de não gerar sabões, diminuindo a produção de dejetos industriais, além de minimizar a perda de óleo neutro.
O solvente sugerido nesta pesquisa é o etanol grau alimentício, o que torna o processo bastante atrativo do ponto de vista ambiental. “Uma vez que este solvente é produzido por via biotecnológica, não gera resíduos tóxicos e é considerado seguro para a saúde humana”, explica Christianne. Ela esclarece ainda que as vantagens do ponto de vista econômico também são evidentes, uma vez que o etanol é produzido em larga escala no Brasil e pode ser facilmente recuperado para posterior reutilização no processo.