Edições Anteriores | Sala de Imprensa | Versão em PDF | Portal Unicamp | Assine o JU | Edição 262 - de 16 a 22 de agosto de 2004
Leia nessa edição
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Artigo: Inovação nas
   multinacionais
Cartas
Fapesp: sucessor de Perez
Sabor mais brasileiro
Reestruturação de banco
Software em sala de aula
Novos indicadores da economia
Sensores químicos
Compostos canceríginos
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Unicamp na mídia
Consumo abusivo de drogas
Fórum: área da saúde
Tela angelical
 

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Pesquisador do Instituto de Química
desenvolve trabalho pioneiro na determinação de substâncias

Sensores
descomplicam
análises químicas



CARMO GALLO NETTO


O disco constituído de sílica/óxido de titâneo/carbono-grafite e, à esquerda, a distribuição idealizada das partículas no material.Não há muito tempo, a determinação de substâncias químicas presentes em misturas, entre as quais a vitamina C em sucos e remédios, exigia um conjunto de operações trabalhosas e muitas vezes complexas. A identificação e a determinação quantitativa em geral só eram possíveis com o isolamento da substância ou com a eliminação de espécies que poderiam interferir na análise.

Pesquisa resultou em pedido de patente

Nas últimas décadas, porém, foram desenvolvidos sensores químicos que permitem determinar quase que instantaneamente a presença e a quantidade de um universo de substâncias. Softwares adequados comparam dados padronizados com os que chegam ao computador, através da utilização de um eletrodo imerso na solução. A transformação química que ocorre junto ao eletrodo produz uma corrente elétrica com certa intensidade, numa operação que permite a determinação. Simples? Aparentemente.

O professor Yoshitaka Gushikem, do Departamento de Química Inorgânica do Instituto de Química da Unicamp, começou trabalhos nesta área específica no final da década de 80. Os resultados de hoje são conseqüência de um percurso de quinze anos, muito embora seus estudos tenham começado na década de 70, há cerca de 30 anos. Até pouco mais de uma década eram utilizados eletrodos de elementos condutores: ouro, platina, grafite. Estes materiais, pouco reativos, impunham grande limitação ao processo.

O professor Yoshitaka Gushikem, do Instituto de Química, com sua equipe de pesquisadores:  interesse pelo desenvolvimento de novos materiaisSurgiu então a idéia de utilizar óxidos metálicos, mais reativos, e incorporá-los a eletrodos de materiais porosos, que constituem a estrutura de sustentação. Como material poroso utiliza-se a sílica (argila) a que se adiciona óxidos de determinados metais, além de grafite. A sílica constitui apenas suporte e é responsável pela porosidade e o óxido metálico, nela disperso, é utilizado pela capacidade reativa e constitui o sítio ativo. O grafite torna o conjunto condutor, sem o que sistema ficaria paralisado, pois ocorre uma reação de oxiredução em que há troca de elétrons entre os reagentes. São características físicas importantes destes materiais o grau de dispersão dos óxidos, resistência mecânica e térmica da matriz, conferidas pelo esqueleto de sílica. Gushikem foi um dos pioneiros no desenvolvimento dessas pesquisas.

No início, Gushikem fazia a mistura mecânica do grafite, utilizando simples agitação. A mistura resultante não era muito homogênea e nem reprodutível, o que além de interferir nos resultados limitava a sensibilidade do processo. Mesmo assim, a técnica foi usada durante uns quinze anos e levou a excelentes resultados, que renderam aos trabalhos reconhecimento internacional.

A sílica, devido à alta porosidade e ao conseqüente volume de reentrâncias, determina uma área de reação muito superior à superfície externa do eletrodo, o que aumenta enormemente o número de sítios ativos e multiplica a sensibilidade do processo, que está atrelada ao número de elétrons transferidos. Gushikem patenteou os materiais desenvolvidos.

Há cerca de três anos, o pesquisador passou a fazer a incorporação química do grafite, utilizando o processo sol-gel em substituição à adição mecânica. Essa inovação fez com que as partículas de grafite se distribuíssem na matriz cerâmica de forma muito mais homogênea, permitindo a obtenção de eletrodos reprodutíveis e elevando a sensibilidade. Esse novo salto resultou em requisição de patente.

Interdisciplinaridade é fundamental

O trabalho desenvolvido por Gushikem conta com a cooperação de outros pesquisadores. Assim, o estudo da morfologia dos materiais obtidos, muito complexa, está sendo realizado no Laboratório Nacional de Luz Sincontron (LNLS), instalado em Campinas, em trabalho de cooperação com o professor Richard Landers, do Instituto de Física “Gleb Wataghin”, da Unicamp. A interpretação das reações que acontecem na interfase é realizada com base no desenvolvimento de modelos e cálculos e conta com a ajuda do pesquisador ucraniano professor Yury V. Kholin,, da Universidade de Khrakov, na Ucrânia, com o qual é mantida uma forte interação. No Instituto de Química da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) a troca de informações se dá com o pesquisador professor Edílson V. Benvenutti , que trabalha com catálise e preparação de novos materiais e sintetização de materiais compósitos a altas pressões. No âmbito do Instituto de Química da Unicamp, Gushikem destaca a cooperação do professor Lauro T. Kubota na área de eletroquímica. O pesquisador enfatiza, também a importância da cooperação de vários especialistas e até da necessidade de conhecimentos de outras áreas. Destaca da mesma forma a necessidade da interdisciplinaridade e do trabalho conjunto, lembrando que a multiplicidade de conhecimentos específicos se manifesta já no seu laboratório, onde convivem vários pesquisadores em nível de pós-doutoramento e de pós-graduação, aos quais atribui o sucesso das pesquisas: “Hoje não se faz mais nada sozinho; o trabalho em equipe é fundamental.”



Quem é Gushikem

Yoshitaka Gushikem nasceu em Getulina, próxima a Marília, no interior de São Paulo, de país japoneses oriundos de Okinawa, em uma época em que na cidade predominavam as colônias italiana e japonesa. Até os sete anos falava quase que apenas japonês o que lhe valeu dificuldades de aprendizado no início da escola primária: “Tinha dificuldade de entender o que diziam.” Mais tarde, já morando em São Paulo, ingressou no Instituto de Química da USP onde concluiu a graduação e o doutorado, dispensado que foi do mestrado. Realizou o pós-doutorado no Departamento de Físico – Química da Universidade de Tohoku, na cidade de Sendai, no norte do Japão. Antes de enveredar pelos sensores químicos realizou pesquisas em outras áreas. No início, ainda na USP, trabalhou com compostos de terras raras. Depois dedicou-se à espectroscopia vibracional mas, confessa, sempre teve grande interesse pelo desenvolvimento de novos materiais.

Composição dos materiais

Idealização dos resultados: à esquerda  a mistura mecânica e à direita o processo sol-gel. Os materiais cerâmicos são isolantes elétricos. O problema foi contornado com a adição de grafite, primeiro através da mistura mecânica e, depois, com a utilização do processo sol-gel.
Na mistura mecânica o grafite fica distribuído entre as partículas de sílica e do óxido metálico (Si02/Mx0y), enquanto no processo sol-gel as partículas se disseminam muito mais homogeneamente na sílica, como mostram as figuras. Neste caso, os centros ativos estão em contato direto com as partículas de grafite, o que aumenta significativamente o processo de troca eletrônica na superfície da matriz, elevando sensivelmente a eficácia dos sensores. Os sensores eletroquímicos assim obtidos permitem, por exemplo, a determinação das concentrações de oxigênio dissolvido em águas naturais, de vitamina C em sucos e medicamentos, de ácido oxálico em vegetais, de derivados de fenóis, etc.


Como funciona

O óxido do metal pode receber os mais diferentes sítios ativos (D).O eletrodo constituído pela mistura sólida sílica/óxido de metal/carbono-grafite é prensado na forma e no tamanho de uma pequena moeda, como mostra a figura.

A porosidade do material aumenta enormemente a área de reação: um grama chega a determinar de 500 a 700 metros quadrados de superfície de reação. O óxido metálico constitui uma interface para a fixação de outros sítios ativos.

Acima (foto), o disco constituído de sílica/óxido de titâneo/carbono-grafite e, à esquerda, a distribuição idealizada das partículas no material.

Os sítios constituídos pelos óxidos metálicos são passíveis de modificações posteriores através de reações químicas, recebendo novas moléculas que os envolvem. Com este procedimento, a superfície modificada passa a apresentar propriedades bem diferentes da original, já que ostenta outros grupos funcionais. Pode, por exemplo, imobilizar (prender) enzimas, porfirinas e ftalocianinas, grupos orgânicos contendo grupos funcionais básicos, íons trocadores, etc. O esquema permite entender como a superfície do sólido é modificada através de uma reação química.

Através da reação química ocorre um acoplamento perfeito entre D e R de maneira que a superfície resultante (à direita da figura) difere da anterior. Os novos sítios ativos D constituem partículas de dimensões nanométricas (menos de 50 angstrons) e homogeneamente distribuídas no interior da matriz de sílica. Na superfície modificada a camada formada é constituída geralmente por filmes monomoleculares, isto é, com a espessura de uma única molécula. Esses materiais são utilizados na confecção de dispositivos de reconhecimento químico, os sensores químicos, ou melhor, sensores eletroquímicos. O laboratório do professor Gushikem também tem sido pioneiro nesses estudos.

Desenvolvidas as matrizes, o laboratório de Gushikem parte para o estudo aplicativo, com pesquisas que envolvem a adição das espécies ativas. Daí surgirão várias outras patentes. Vale destacar que o sistema é novo e não encontra descrição na literatura. A utilização prática dos sensores exigirão posteriores desenvolvimentos técnicos e de engenharia.


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