Pesquisa junto a multinacionais, coordenada
pelo Instituto de Geociências, vai prospectar mais investimentos em P&D
Brasil se prepara
para o jogo da inovação
LUIZ SUGIMOTO
Em 1º de agosto último, no Departamento de Política Científica e Tecnológica (DPCT) do Instituto de Geociências (IG) da Unicamp, começou-se a detalhar a metodologia para uma ampla pesquisa em multinacionais no Brasil, com o objetivo de prospectar oportunidades de investimento por parte dessas empresas em pesquisa e desenvolvimento no país. “Existe um movimento internacional de disputa por investimentos em P&D e precisamos nos preparar melhor para o jogo.”, afirma o professor do DPCT Sérgio Queiroz, coordenador do projeto que faz parte do edital “Políticas Públicas” da Fapesp.
A prospecção terá início em seis meses, quando estará montada a equipe da qual participarão pesquisadores do Grupo de Estudos de Economia Industrial (Geein) da Faculdade de Economia da Unesp-Araraquara. O parceiro externo será a Secretaria de Ciência e Tecnologia do Estado de São Paulo, interessada em identificar, intermediar e criar mecanismos para atrair investimentos em atividades tecnológicas ao território paulista. “Ainda não definimos o número de empresas a serem pesquisadas, mas certamente atentaremos para os setores automobilístico, de telecomunicações, microeletrônica e informática, que já vêm apresentando investimentos importantes em P&D no país”, informa o professor da Unicamp.
Em artigo intitulado “Inovação nas multinacionais do Brasil”, para a edição nº 262 do Jornal da Unicamp, Sérgio Queiroz descreve o contexto em que essas empresas aparecem mais propensas a investir em atividades tecnológicas fora de seus países de origem. “Há uma literatura extensa sobre esta internacionalização a montagem de redes globais de P&D , que alguns autores preferem chamar de ‘triadização’, visto que o movimento de descentralização se limitaria aos territórios dos Estados Unidos, Europa e Japão. Mas países fora da tríade estão começando a atrair investimentos, sobretudo China e Índia, cabendo ao Brasil se garantir como pólo de atração na América do Sul”, observa o pesquisador na entrevista.
Dados citados por Queiroz sobre as 359 maiores empresas mundiais, no período de 1990-94, indicam que menos de 1% das patentes registradas nos Estados Unidos foi originária das subsidiárias fora da tríade. Nos anos recentes, porém, os gastos das filiais americanas em P&D fora do Canadá, Europa e Japão, por exemplo, cresceram de 10,7% em 1998 para 15% em 1999 e 17,8% no ano de 2000. A China, sozinha, recebeu 2,6% dos investimentos das subsidiárias americanas. “A China, particularmente, é extremamente agressiva nesse aspecto. Ao invés de receber investimentos apenas em manufatura, exige a montagem de centros de excelência para que seus engenheiros também possam fazer desenvolvimento. É a maior receptora mundial de investimentos estrangeiros dentre os países do terceiro mundo, chegando a disputar a ponta com países ricos”, ressalta.
A Índia, por sua vez, recebeu mais de 70 unidades de P&D de multinacionais nos últimos cinco anos, ultrapassando em número centros como Japão, Israel, Europa Oriental e mesmo a China. É correto que muitos desses centros são voltados para simples tarefas de desenvolvimento, mas outros são centros sofisticados, como o da General Eletric, que emprega mais de mil técnicos especializados, sendo 31% de doutores e 44% de mestres. A Índia forma 200 mil engenheiros a cada ano, com salários que equivalem a uma fração do que é pago a um engenheiro americano. Além disso, a mão-de-obra indiana domina a língua inglesa, o que facilita a integração com as redes globais de P&D. “Quando a Índia atraía investimentos em manufatura, tudo bem. Mas quando começa a roubar empregos qualificados nos Estados Unidos, o problema causa espécie”, afirma Sérgio Queiroz.
Aposta alta De acordo com o coordenador da pesquisa, embora o Brasil não tenha atraído a mesma atenção dedicada a China e Índia, as multinacionais têm sido um ator importantíssimo do sistema nacional de inovação, acumulando um significativo conjunto de competências tecnológicas. Como no artigo publicado recentemente, Queiroz insiste no exemplo do setor automobilístico. “As montadoras já superaram a fase da ‘tropicalização’ dos veículos, em que apenas se adaptavam projetos vindos das matrizes para as condições locais, criando, por exemplo, as versões sedan e pick-up. É o caso da Meriva, da GM, cujo projeto nasceu e foi coordenado no Brasil, sendo depois adaptado às condições européias pela Opel alemã. A Volks brasileira deu passo semelhante ao projetar o Fox para exportá-lo à Europa”, ilustra.
Sérgio Queiroz lembra que possuímos infra-estrutura igual ou superior à dos países concorrentes, com destaque para os centros de pesquisa e a mão-de-obra qualificada. “O objetivo da pesquisa em preparação no DPCT é pintar o quadro e propor caminhos. As empresas estrangeiras interessadas em ampliar suas atividades manufatureiras e de serviços no país são bem-vindas, mas elas também devem ser encorajadas a estabelecer unidades de P&D. Dentre vários fatores internos, como os econômicos, algumas condições para atrair os investimentos em tecnologia estão relacionadas com as políticas públicas. O fato é que a concorrência vem se acirrando e o Brasil precisa apostar alto”, finaliza.