Edições Anteriores | Sala de Imprensa | Versão em PDF | Portal Unicamp | Assine o JU | Edição 299 - 29 de agosto a 4 de setembro de 2005
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Recursos psicodramáticos revelam necessidades de deficientes visuais


CARMO GALLO NETTO


Gelse Beatriz Martins Monteiro: ferramenta para os profissionais da área (Foto: Antoninho Perri)Escolares deficientes visuais, portadores de visão subnormal, revelam dificuldade de adaptação ao uso dos auxílios ópticos prescritos, nem sempre seguem o tratamento médico recomendado e se ressentem da desinformação por parte das pessoas com quem se relacionam no ambiente escolar.

Em relação aos aspectos socioculturais e emocionais, esses jovens mostram desconforto no uso de recursos ópticos em público e limitam seu uso ao período escolar, e mesmo assim sob pressão, pois manifestam necessidade preponderante de socialização que sobrepuja à de enxergar melhor. Consideram também as atividades de contato social e doméstico, que não exigem boa acuidade visual, dissociadas das atividades escolares, revelam-se em geral pessoas passivas e conformistas e não participam das decisões sobre os tratamentos que lhes são indicados.

Estas são as conclusões de uma pesquisa qualitativa realizada por Gelse Beatriz Martins Monteiro, que analisou o comportamento de sete pacientes do Serviço de Visão Subnormal do Hospital de Clínicas (HC) da Unicamp, previamente selecionados, na faixa etária de 10 a 14 anos completos, submetidos a seis sessões de teatro espontâneo, que à época cursavam o ensino fundamental e recebiam apoio pedagógico em sala de recursos para deficientes visuais de uma unidade escolar do sistema público de ensino de Santa Bárbara d’Oeste.

A idéia da pesquisa surgiu no Serviço de Visão Subnormal, do Departamento de Otorrino-oftalmologia do Hospital de Clínicas da Unicamp, chefiado pela oftalmologista Keila Monteiro de Carvalho, preocupada com a falta de adesão dos pacientes jovens ao tratamento prescrito e que sentia necessidade de investigar suas razões. Esta constatação e a circunstância de Gelse Beatriz Martins Monteiro fazer parte da Companhia do Teatro Espontâneo, que tem sede em Campinas, levaram o Departamento a convidá-la a fazer um diagnóstico do problema, utilizando os recursos psicodramáticos de que dispunha. O trabalho, orientado pela professora Edméa Temporini Nastari, deu origem à dissertação de mestrado que aborda as concepções e o uso de auxílios ópticos por escolares com deficiência visual e mostra como os estudantes entendem os auxílios ópticos e como encaram os tratamentos.

Gelse esclarece que “estavam entre os objetivos da proposta identificar concepções, fatores socioculturais e emocionais que envolvem o uso de auxílios ópticos por escolares deficientes visuais e oferecer informações a profissionais da área”. Utilizou pesquisa qualitativa mediante aplicação da técnica do teatro espontâneo – modalidade de teatro interativo, de improviso, construído a partir de historias contadas pelos participantes.

Ela explica que através das sessões de teatro espontâneo foi possível identificar necessidades, dificuldades e barreiras encontradas na efetivação dos tratamentos prescritos, e concepções e comportamentos que dificilmente apareceriam no ambiente de assistência à saúde. Gelse revela que pretendeu juntar os olhares da ciência e da técnica aos dos adolescentes inseridos na sociedade, como forma de ampliar o enfoque reabilitacional do atendimento oftalmológico. Segundo a pesquisadora, esse tipo de dramatização permite conhecer o ambiente em que vive esse jovem, como a escola, as relações familiares e sociais: “revelam seu modo de vida e através dele se chega à sua relação com o auxílio óptico. Ou seja, os seus contextos familiar, escolar, social vão mostrar as dificuldades que ele tem com o tratamento oftalmológico, que seriam diferentes ou não existiriam se as pessoas vivessem em outros contextos. Há estudos mostrando que quando os colegas e o entorno conhecem os problemas do deficiente, ele tem muito mais facilidade de integração social, de aceitação, sua auto-estima é maior”.

Segundo a pesquisadora, os resultados mostraram que os escolares têm conhecimento insuficiente da própria deficiência e dificuldade de adaptação ao uso dos auxílios ópticos, revelam inibição para mostrá-los, desconforto no uso em público, negam os problemas de visão que enfrentam e a super proteção da família os tornam apáticos e sem iniciativa. E complementa: “Conhecer o modo de pensar e agir das pessoas com dificuldades visuais pode ajudar muito na inserção na vida social e profissional e vai ajudar o profissional da saúde a orientar suas ações. Os adolescentes do grupo estudado revelaram muito maior preocupação com o relacionamento social, o que os leva a abrir mão da acuidade visual. A estranheza que os colegas de classe revelam em relação aos equipamentos, a ridicularização que sofrem dos colegas que já chamam qualquer usuário de óculos de ‘quatro-olhos’, e o desconhecimento das pessoas do entorno agravam sobremaneira os problemas enfrentados por esses jovens”.

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Foto: Antoninho PerriFoto: Neldo CantantiFoto: Antoninho PerriFoto: Gustavo Miranda/Agência O GloboFoto: Antoninho Perri