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Ebola,
varíola, antraz: o horror invisível
A arma biológica é utilizada
desde as primeiras guerras
da humanidade, mas ela foi bastante aprimorada no último
século
CARLOS
TIDEI
Um
único membro do Taleban contaminado por varíola,
andando no metrô de Nova York, pode causar a morte
de centenas de milhares de pessoas em poucas semanas.
A varíola é uma doença erradicada
no mundo, sem registro de qualquer pessoa contaminada.
Mas o vírus causador da moléstia existe
armazenado, trancado a sete chaves em dois laboratórios,
e não há vacina para proteger a população
de até 20 anos, que jamais foi imunizada.
Eles
são bem capazes de contaminar algum suicida com
esse intuito, alerta a infectologista Maria Luiza
Moretti Branchini. A ameaça de uso de armas biológicas
tornou-se mais real depois dos recentes atentados com
correspondências contendo antraz nos EUA. Do possível
arsenal a ser usado por terroristas fazem parte, além
da varíola e do Bacillus anthracis, o vírus
Ebola e a tularemia, entre outros. Considera-se arma biológica
todo agente capaz de causar doença ou morte em
indivíduos.
No
mundo todo são realizadas experiências biológicas
destinadas à guerra. Pelo menos 12 países
possuem comprovadamente armas biológicas, entre
eles o Iraque, que sintetizou o Bacillus anthracis. Nas
guerras empreendidas pela humanidade o recurso de uso
de doenças sempre foi empregado e mais desenvolvido
cientificamente no último século. O uso
de armas químicas e biológicas introduziu
máscaras de proteção no equipamento
básico dos soldados.
Alguns
agentes precisam ser produzidos de forma especial para
se tornarem infectantes. O antraz enviado ao Senado norte-americano
foi geneticamente desenvolvido para não aglutinar
e se espalhar melhor pelo ar. A forma de disseminação
mais comum é aérea, por vaporizador agrícola,
o que explica a proibição de vôos
de pulverização naquele país depois
dos atentados.
A
qualidade do antraz dos atentados nos EUA não se
compara à bactéria desenvolvida na Rússia,
que em 1979 causou a morte de 68 pessoas nas imediações
do laboratório Biopreparat, depois de um acidente
que liberou um grama da substância. Este mesmo laboratório,
que já foi dos mais modernos do mundo, também
realizou experiências genéticas para aumento
da virulência do Ebola e varíola.
Primórdios
Segundo Maria Luiza Moretti Branchini, desde os primórdios
da humanidade existem registros de uso de armas biológicas
nos conflitos humanos. Antes da teoria dos germes, os
gregos, romanos e persas colocavam cadáveres para
contaminar o inimigo. Na era medieval eram usadas catapultas
com cadáveres que tinham a peste bubônica.
O que eles não sabiam é que a peste é
transmitida por pulgas, o vetor natural, e não
por pessoas contaminadas. Os ingleses, no século
18, usavam lençóis contaminados por varíola
para exterminar os índios americanos, acertadamente,
porque o vírus se propaga pelo ar e o depósito
é o indivíduo doente.
Entre
as toxinas que podem ser usadas como arma biológica
atualmente, uma das mais viáveis para os terroristas
é mesmo o antraz, devido ao baixo custo, relativa
facilidade de armazenamento, requerendo pouco conhecimento
e sendo de difícil prevenção. Não
é transmitido,, no entanto, de uma pessoa para
outra. No caso da varíola, o início de uma
epidemia geraria um movimento mundial de vacinação
e poderia ser debelada novamente. A tularemia exige um
vetor, as pulgas, para se propagar, e contamina as pessoas
através da transmissão por animais.
Sem
fronteiras
Com a globalização, que elimina as fronteiras
para as doenças, o mundo investe na luta contra
três grandes epidemias, que são a malária,
a tuberculose e a infecção pelo HIV. Mas
algumas podem voltar, porque a evolução
dos microorganismos é completamente imprevisível,
mais ainda quando manipulada pelo homem. A gripe espanhola,
por exemplo, dizimou toda uma população
em 1918 e hoje a humanidade ainda é suscetível
ao vírus porque não ficaram cicatrizes:
não houve sobreviventes que pudessem passar para
a geração futura a resistência à
moléstia, que pode ressurgir com o mesmo poder
de contaminação e morte.
Se
o século passado foi marcado mais pela tecnologia
das ciências exatas, o século 21 será
marcado pelo desenvolvimento do genoma humano, alterarando
todo o conhecimento do organismo humano, proporcionando
uma bagagem imensurável que vai influenciar toda
a saúde no planeta, finaliza Maria Luiza.
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Temor
com os alimentos
Doenças
de origem alimentar também figuram entre os temores
dos cientistas. O bioterrorismo alimentar é
o mais fácil de todos os processos, afirma
Edir Nepomuceno da Silva, professor da Faculdade de Engenharia
de Alimentos (FEA) da Unicamp. Entre as bactérias,
depois do antraz, que causou mais pânico que mortalidade
na população dos EUA, uma das mais temidas
é a toxina botulínica (bactéria Clostridium
botulinum), causadora do botulismo, que contamina alimentos
e tem alta letalidade para o consumidor. Um grama
de toxina botulínica purificada é capaz
de matar toda a população brasileira,
alerta. Todas as formas de botulismo são consideradas
emergências médicas, e o esporo existe em
abundância na natureza, na terra e no solo. A
bactéria pode ser transformada em laboratório
para causar a doença, afirma Nepomuceno.
A
origem do nome botulismo vem da freqüência
com que era encontrado em alimentos embutidos, mas atualmente,
embora raro, é mais comum em alimentos envasados
sem esterilização adequada, como palmitos,
entre outras conservas, e temperos. Imagine se um
terrorista colocar a bactéria no reservatório
de abastecimento de água da cidade, reforça
o pesquisador.
O
efeito do botulismo no organismo humano é como
um apagão dos estímulos elétricos
musculares, causando paralisia gradativa até que
os pulmões deixam de funcionar. O período
de incubação é de dez horas a dez
dias, e como o diagnóstico exige testes especiais
que demoram mais de 48 horas, dificilmente se consegue
reverter o processo. O tratamento muitas vezes envolve
respiração por aparelhos e fisioterapia
para manter o corpo em atividade. Como prevenção
deve-se sempre aquecer os alimentos, evitar mel para crianças
de até um ano e vacinar pessoas suscetíveis.
As
doenças de origem alimentar nos EUA afetam 76 milhões
de pessoas todo ano. Destas, 325.000 são hospitalizadas
e 5.200 morrem. Ascausas mais comuns são a salmonela,
que causa prejuízos estimados em US$ 8 bilhões
por ano, a Campylobacter sp., com alta incidência
mas baixo índice de mortes, e a Listeria monocytogenes,
bastante freqüente em queijos, com baixa incidência
e alto número de óbitos. O pior terrorismo
alimentar ainda é a fome, que mata o equivalente
a nove World Trade Centers por dia, pondera Nepomuceno.
Outra
forma de ação possível na área
alimentar é bioterrorismo animal, pela contaminação
de rebanhos de bovinos, suínos e aves com doenças
epidêmicas, como a febre aftosa, a peste suína,
ou a doença de New Castle em aves. A facilidade
com que os agentes patogênicos podem ser transportados
para infectar rebanhos de outros países e sua capacidade
de disseminação é evidente. Nestes
casos o efeito seria mais econômico que de saúde
pública. Se a febre aftosa atingir rebanhos
nos EUA, teria um impacto econômico imensurável.
Todos os países deixariam de comprar carne deles,
destaca. De agora em diante devem surgir ocorrências
estranhas na área animal e vegetal, de origem terrorista,
acredita Nepomuceno.
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