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Jornal da Unicamp -- Dezembro de 1999
Página 7

Pesquisa
Vôo de mil aterrissagens
Osires Silva, criador da Embraer, recebe prêmio no CNPQ

Marcelo Burgos

Dentre os vôos protagonizados por Osires Silva, 69 anos, criador da Embraer e do avião Bandeirante, que acaba de ganhar o prêmio Almirante Álvaro Alberto para Ciência e Tecnologia, do CNPQ*, aquele talvez fosse dos mais prosaicos.

Afinal de contas, àquela altura, Osires, aos 27 anos, já havia pilotado Catalinas (aviões anfíbios, que pousam tanto na terra como na água) trabalhando para o Correio da Fronteira e nas mais remotas regiões da na Amazônia (veja box nesta página). Já tinha, também, voado mais de três mil horas no Correio Aéreo Nacional e pousando em locais perigosos de quase todos os países da América Latina. Mas foi naquele viagem de 21 de maio de 1958 que aconteceu a Osires um fato que iria transformar sua vida. "O que aconteceu comigo foi curioso: entrei em um avião como piloto e desci engenheiro."

A história, contada em entrevista ao Jornal da Unicamp e também no livro "A Decolagem de um sonho" (Editora Lemos, 1999) cita um vôo de renovação de licença em que Osires, já casado e pai de dois filhos, optou pela carreira de engenheiro aeronáutico que iria transformar a história da aviação no país. Uma carona dada de São Paulo ao Rio a um aluno do ITA (Instituto Tecnológico da Aeronáutica) deu espaço a um convite e uma sugestão: porque não concorrer a uma vaga de Engenheiro Aeronáutico no ITA?

Família humilde - Uma sugestão aparentemente simples tinha ressonância profunda na vida de Osires Silva. Vindo de família humilde de Baurú, sofreu grande resistência familiar por optar pela carreira de piloto. "Meu pai queria que eu fosse eletricista, como ele", lembra. Aos 17 anos, por exemplo, quando foi fazer exame para a Força Aérea Brasileira no Rio de Janeiro, esperou três meses no Rio de Janeiro para repetir um exame que havia sido cancelado. Era mais fácil – e barato – do que voltar para casa.

Mas resistir e contrapor-se de forma obstinada e ao mesmo tempo arguta aos obstáculos criou uma espécie de padrão na vida de Osires Silva. O mesmo vale para o nascimento do Bandeirante. "Transformei cada negativa do projeto em afirmativa. Me disseram que fazer um avião pequeno, para transporte regional, era loucura, pois os Estados Unidos não faziam isso. Nunca vi uma confirmação tão veemente do nicho de mercado do Bandeirante, que hoje voa não só nos Estados Unidos como em cerca de 36 países, da África do Sul à Venezuela, passando pela Inglaterra, Finlândia e Nova Guiné, entre outros". Não só isso. Hoje privatizada, a empresa fundada por Ozires está presente no mercado internacional de alta tecnologia como nenhuma outra. Cerca de 90% do seu faturamento vem de vendas feitas no exterior e ela é uma das maiores exportadoras do país.

Tranformar negativas em empreendimentos. Foi assim que Osires chegou até 1969, com a criação da Embraer, muito da qual se deve à sua incansável insistência, sua disposição de estudar, fazer e refazer projetos, sempre tendo em vista constituir uma empresa de aviação nacional. "Muitos me olhavam com descrédito, sugerindo que avião é coisa que não se fabrica, compra-se". Mas o sonho de criança de Osires, quando ele deixou a Embraer, era uma empresa de seis mil funcionários e 270 mil metros quadrados, produzindo os aviões Bandeirante, Brasília, Xingú e Tucano e provando que um produto de alta tecnologia podia ser feito no terceiro mundo.

*O prêmio também foi dado ao Prof. Aziz Ab’Saber (IEA-USP), de quem publicaremos um perfil na próxima edição.

Trechos do livro

(...) "O Correio da Fronteira passou a ser uma obrigação que estabelecia um circuito a cada 15 dias. Saíamos de Belém para cumprir missões junto às populações carentes das mais remotas regiões amazônicas e, como requerido, transportávamos, médicos, dentistas e assistentes sociais, enfermeiros e especialistas em diversos outros campos; era comum termos conosco padres que, normalmente quando chegávamos, batizavam crianças e casavam grande número de casais, em geral acompanhados dos próprios filhos.(...)

(...) "O momento do "vamos ver" tinha chegado. Agora, o trabalho teria de ser organizado: iniciar o projeto, criar e desenvolver um avião nacional para o transporte de passageiros e de carga. Olhava para os lados e pensava: não poderia ser verdade. Era incrível. Tinha sonhado com esse momento praticamente durante a vida inteira, começando com a imaginação do menino de Bauru, passando pelo esforço de conseguir a graduação como Engenheiro Aeronáutico e, finalmente,à nossa frente havia uma realidade que, para materializar-se, dependeria de nós – e por muitos anos. (...)

(...) Assinado tudo, os discursos de praxe e a sala esvaziou-se. E agora? , perguntávamo-nos. A sensação era estranha. Montamos uma batalha e tínhamos vencido. De um momento para o outro éramos transformados em empresários, sem a menor experiência. Vontade não faltava, mas vontade e disposição para trabalhar seriam suficientes? A partir daquele momento, a EMBRAER ganhara vida e nós estávamos com a responsabilidade de transformá-la em algo que materializasse os sonhos de termos aviões fabricados no Brasil, voando no país, e, quem sabe, no exterior.

"A escola pública me fez"

Osires Silva dedica seu livro de mais de 600 páginas à escola pública brasileira. "Ela me fez crescer", afirma, categórico Osires, que ocupou, entre outros cargos, a presidência da Petrobrás e a pasta do Ministério da Infra-Estrutura do Governo Fernando Collor.

Jornal da Unicamp- Porque o Sr. dedica seu livro à escola pública?
Osires Silva – Porque ela deu oportunidade que se operasse uma transformação fantástica em mim. De menino pobre, consegui, por meio da educação gratuita e de qualidade, realizar meus sonhos de desenvolver uma indústria aeronáutica brasileira, com a criação e administração da Embraer. Este tipo de fato deve inspirar nossos dirigentes.

Jornal da Unicamp- O que o Prêmio Almirante Álvaro Alberto para Ciência e Tecnologia significa para o Sr?
Osires Silva – A vitória de uma idéia simples. Espero que este tipo de premiação atinja as pessoa que pensam simples, que observam a realidade e a partir daí realizam seu salto. Ao ouvir – ouvir e não apenas escutar - a queixa de prefeitos de regiões ermas do país, que reclamavam que os aviões não tinham onde pousar, descobri que tinha de insistir em um modelo que chegasse em qualquer lugar. Transformar sim em não e perseverar: este foi o meu comportamento.

Jornal da Unicamp Além do preparo técnico-científico, quais são então os atributos para fazer ciência aplicada no país?
Osires Silva – As pessoas tendem a evitar o óbvio, e lá que as principais descobertas estão. Em vez de mudar o combustível por ele ser poluente, porque não fazer outro motor? O Governo, por exemplo, vive criando programas de incentivo à qualidade, mas porque não começa implementando um programa de qualidade da própria gestão?

Jornal da Unicamp - Porque o sr resolveu contar a sua vida em um livro?
Osires Silva- Porque parte da história, especialmente a criação da Embraer, está apenas comigo, não tem outras fontes de documentação. Tanto que fiz o trabalho sozinho: só uma pessoa foi consultada. Mas fiz o livro com calma e prazer e muita gente que participou da história se surpreendeu de eu saber tudo com riqueza de detalhes.


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