ANO XVII - 16 a 22 de dezembro de 2002 - Edição 202
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Em busca do projeto intelectual brasileiro.

O sonho acabou?

Álvaro KASSAB


Marcelo Ridenti, autor de Em busca do Povo Brasileiro: amplo painel das décadas de 1960 e 1970Na apresentação de Em busca do povo brasileiro - artistas da revolução, do CPC à era da TV ( Editora Record), o sociólogo Marcelo Ridenti compara as introduções dos livros aos manuais de eletrodomésticos: apesar de o fabricante advertir que a leitura é indispensável, o usuário ignora as instruções e nem por isso o aparelho deixa de funcionar. "É sabido que a introdução serve não só para o autor explicar o que pretendeu fazer, traçando um guia de leitura, mas também para justificar-se sobre o que não foi possível realizar".

O exemplo não se aplica à obra de Ridenti, professor do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH). Nos seis capítulos que compõem Em busca do povo brasileiro, o professor esmiuça um tema presente nas mais de 400 páginas do livro: a importância da identidade nacional e política do povo brasileiro no ideário dos artistas e intelectuais que na década de 1960 e na primeira metade da de 1970 buscavam as raízes populares e a ruptura com o subdesenvolvimento. O autor, porém, não fica à mercê do datado. Avança nas décadas seguintes, faz algumas projeções e aponta desdobramentos, mesmo reconhecendo que o final de século é um período que precisa ser melhor investigado à luz dos últimos acontecimentos.

Ridenti enfileira referências históricas para fundamentar seu trabalho, a começar da constituição do romantismo revolucionário impregnado pela utopia "da integração do intelectual com o homem simples do povo", em voga de 1960 até meados dos anos 1970 e fio condutor "para compreender o movimento contraditório das diversificadas ações políticas de artistas e intelectuais, inseridos em partidos e movimentos de esquerda, enraizados sobretudo na classe média". Estão lá o CPC, o Arena, o Oficina, o Cinema Novo, os "artistas guerrilheiros", as canções de protesto.

Nesse contexto, o professor historia a trajetória dos partidos de esquerda - sobretudo o PCB e suas dissidências - e a inserção de seus militantes na ebulição cultural e artística da época. "Eles procuraram no passado uma cultura popular genuína, para construir uma nova nação, antiimperialista, progressista - no limite, socialista", escreve o autor, que além de vasculhar arquivos, entrevistou mais de 30 personagens fundamentais para os movimentos da época, entre eles Antonio Callado, Ferreira Gullar, Dias Gomes, Capinan, Carlos Nelson Coutinho, José Celso Martinez Corrêa, Moacyr Félix, Nelson Pereira dos Santos e Sérgio Ferro.

Dois dos artistas referenciais - na cena do período e de hoje -, Chico Buarque e Caetano Veloso, mereceram capítulos à parte. Do primeiro, Ridenti analisa o romance Benjamim, ponto de partida de um balanço do conjunto da obra do compositor carioca entre 1960 e 1990. Na avaliação de Ridenti, o romance "recoloca e atualiza o lirismo nostálgico e a crítica social, paralelamente ao esvaziamento da variante utópica da obra de Chico Buarque, expressando a perplexidade da intelectualidade de esquerda às portas do século 20".

Quanto a Caetano Veloso, Ridenti chega à conclusão de que o tropicalismo teve a marca da formação político-cultural dos anos 1950 e 1960 e, ao contrário do que apregoa a maioria dos críticos, esteve longe de ser uma ruptura com os modelos anteriormente estabelecidos nos campos da arte e político. Ridenti prefere vê-lo como um "fruto diferenciado" do "ensaio geral de socialização da cultura". Entretanto, "ao encerrar o ciclo participante, o tropicalismo já indicava os desdobramentos do império da indústria cultural na sociedade brasileira, que transformaria a promessa de socialização em massificação da cultura, até mesmo incorporando desfiguradamente aspectos dos movimentos culturais contestadores dos anos 60", avalia Ridenti.

Uma contestação que, na opinião do autor de Em busca do povo brasileiro, foi se diluindo ao longo das décadas de 1980 e 1990 por conta de muitos fatores, entre eles a debandada de intelectuais e artistas para a indústria cultural, a mundialização e o fim do comunismo. Ridenti não deixa de mencionar também seus pares da academia, que passariam a optar pela carreira, ignorando a esfera pública e o campo das alternativas. Mas o romantismo revolucionário ainda tem lugar nos dias de hoje?
Ridente Responde na entrevista que segue:

Ridenti - Digamos que nos anos 1950, 1960 e em uma boa parte dos 1970, configurou-se um modelo de intelectual comprometido com vários aspectos da realidade brasileira, entre eles a ruptura com o subdesenvolvimento e a criação de uma sociedade mais justa, com a afirmação da identidade política-cultural do povo brasileiro. Isso se esvaziou a partir da década de 1980, no fim da ditadura militar. Até porque no tempo dos militares havia um grande inimigo comum a ser vencido. Depois, os projetos políticos das antigas oposições se diversificaram muito. Mas, particularmente, a mudança de rumo da intelectualidade foi marcada por um processo marcado por vários fatores.

JU - Quais seriam?

Ridenti - O avanço da indústria cultural foi um deles. Em A Moderna Tradição Brasileira, nosso colega Renato Ortiz [ professor da Unicamp] mostra que uma indústria cultural que merece esse nome - quer dizer, que produz mercadoria cultural em larga escala num sistema avançado - só se desenvolveu no Brasil plenamente a partir dos anos 1960. Incluo aí a indústria fonográfica, editorial, a televisão, a imprensa etc. Esse é um dado importante. A produção dos intelectuais e dos artistas a partir da década de 1960 torna-se cada vez mais determinada por esse mercado. Um outro aspecto é que, nesse mesmo período, em que se consolidou uma modernização conservadora da sociedade brasileira, também se desenvolveu um novo sistema de universidades no Brasil - fossem públicas ou privadas.

JU - Em que medida a academia entra nesse contexto?

Ridenti - Até mesmo no sistema de pós-graduação, com mestrado e doutorado, que foi generalizado durante os anos da ditadura e gerou um padrão de profissionalização. Os intelectuais, dentro e fora da academia, até a década de 1960 tinham voz na esfera pública, na imprensa, nas artes, nos palcos. Participavam de uma série de debates que não necessariamente tinham lugar institucional. Depois desse período, esses intelectuais começam em grande escala a se aninhar nas universidades. Ocorre então um processo interessante de uma certa dissociação dos intelectuais com a vida coletiva mais ampla. Tem um livro interessante do Jacoby em que ele mostra como aconteceu esse processo nos Estados Unidos, de como ocorreu a perda do espaço do intelectual na esfera pública. Ele passa a viver quase isolado da sociedade nos campi universitários.

JU - Como assim?

Ridenti - A institucionalização de intelectuais e artistas neutralizaria a liberdade de que em teoria dispõem, de modo que eventualmente o sonho com a revolução conviveria com o investimento na profissão, na qual prevaleceria a realidade cotidiana da burocratização e do emprego. A profissionalização da vida intelectual nos limites do campus universitário conduziria à privatização ou à despolitização, à transferência da energia intelectual de um domínio mais amplo para uma disciplina mais restrita, em que as pressões da carreira e da publicação intensificariam a fragmentação do conhecimento.

JU - Foi um processo anterior ao registrado no Brasil?

Ridenti - Sim. Às vezes você tem hoje discussões acaloradas e aparentemente muito críticas, mas que não passam a fronteira das revistas universitárias, do ambiente acadêmico. Alguma coisa que era muito diferente nos anos 1960. Se você pega por exemplo a cidade de São Paulo daquela época, havia um espaço geográfico que concentrava o que era então a Faculdade de Filosofia, na Rua Maria Antonia, vizinha do Mackenzie, da Faculdade de Direito (São Francisco), da Politécnica, da Faculdade de Economia. Eram todas muito próximas. E ainda era uma universidade não marcada por esse aspecto, digamos, contemporâneo. Eram pioneiros da universidade pública no Brasil, inclusive com uma missão clara de compromisso com a ruptura com o subdesenvolvimento nacional. E naquele mesmo espaço você tinha o Teatro de Arena, o Teatro Oficina, o Bar Redondo, o Cine Bijou, o Teatro Municipal. Havia uma concentração espacial/geográfica de intelectuais, universitários, artistas. E naquele tempo o Brasil era um país com pouca gente que atingia o ensino superior. Era uma minoria efetivamente que podia estar na universidade.

JU - A inserção da intelectualidade era muito maior nessa época?

Ridenti - Sem dúvida. A convivência entre professores universitários, cineastas, teatrólogos, artistas plásticos, arquitetos, estudantes e jornalistas era muita concentrada no espaço geográfico. Ao mesmo tempo havia uma inter-relação entre os vários campos do conhecimento. Algo que, com o desenvolvimento da sociedade, com a especialização e com a formação de campos de atuação mais específicos, acabou esgarçando essa unidade.

JU - Como se deu essa ruptura?

Ridenti - Foi se esvaziando aquele projeto de aproximar o intelectual com o homem simples do povo, que era colocado, por exemplo, na Revista Civilização Brasileira, famosa na década de 1960. Ela congregou intelectuais e artistas de vários campos. Havia uma certa utopia que aparecia no cinema, no teatro, na literatura, enfim. Havia um compromisso do intelectual em elevar a mentalidade do homem simples. Com o tempo, essa tentativa de aproximação passou a ser vista de uma maneira crítica por alguns setores da intelectualidade, que passaram a acusar os intelectuais dessa época de pretender transformar o seu saber - um privilégio numa sociedade subdesenvolvida - em instrumento de poder sobre o povo. Eles foram acusados de não permitir que o povo expressasse sua própria voz. Para esses críticos, os intelectuais impunham um projeto de revolução brasileira, de transformação social que não passava efetivamente pelos próprios agentes que constituiriam esse povo. Esse tipo de crítica foi muito forte sobretudo na década de 1980.

JU - Qual foi a conseqüência?

Ridenti - De um lado, gerou uma tentativa de avançar esse processo e dizer: "olha, não é ao intelectual que caber dizer os desejos do povo, mas é preciso que os próprios grupos e classes que compõem esse povo expressem a sua voz". Não é à toa que nos anos 1980 surge o PT, por exemplo. Ele tentou dar expressão a suas bases que eram formadas sobretudo por novos sindicalistas, por setores da comunidade eclesiais de base da Igreja Católica, dos movimentos sociais que surgiam e por alguns intelectuais que tinham sido de grupos de esquerda naquele cenário de fim de ditadura.

JU - Essa nova esquerda era diferente daquela predominante até então?

Ridenti - Esse projeto de "esquerda" pregava uma certa ruptura com o momento anterior, então o papel do intelectual não seria dizer o que seria bom para o povo, mas ajudar a criar condições democráticas para que o próprio povo ou classes sociais se expressassem.

JU - O que há de errado nessa proposta?

Ridenti - Essa tendência teve uma contrapartida, que foi o fato de muitos intelectuais, sob essa alegação, se sentirem descompromissados de vincular a sua existência aos problemas do povo e aos próprios destinos do País.

JU - No que resultou esse tipo de postura?

Ridenti - Começa a surgir a figura de um intelectual acadêmico, do scholar, dissociado ou acima dos problemas nacionais. Ele detinha uma suposta neutralidade, um descompromisso supostamente necessário para fazer ciência, que envolveu um distanciamento dos grandes problemas nacionais e das lutas sociais. Os intelectuais estavam muito mais preocupados em desenvolver suas carreiras individuais. O processo de desenvolvimento da indústria cultural - jornais, editoras, gravadoras, agências de publicidade - também gerou um enorme potencial de emprego para esses intelectuais. Muitos deles acabaram empregados também em governos que se democratizavam. A demanda passou a ser enorme... Essa acomodação do intelectual e do artista aparece bem retratada no filme recente O Príncipe, de Ugo Giorgetti.

JU - O senhor acredita que este tipo de romantismo revolucionário ainda pode germinar no Brasil hoje?

Ridenti - Para um estudo do enfraquecimento da arte política nos anos 70 e sobretudo nos 80 e 90, é instigante a análise de Jameson sobre os problemas envolvidos na produção de uma arte política em nossos dias, em que o capitalismo praticamente inviabilizaria quaisquer atividades grupais que pudessem embasar socialmente uma arte subversiva, numa era de ocupação quase completa do espaço cultural pela lógica mercantil. Haveria uma atomização reificada, imposta pelo capitalismo de hoje. Jameson admite, contudo, como fundamento social para uma nova arte política e uma produção cultural autêntica a ser criada, a constituição de um grupo novo e orgânico, por meio do qual o coletivo abriria caminho na atomização reificada da vida social, a partir da luta de classes. A necessidade de romper a submissão ao círculo de ferro do mercado tem aparecido, por exemplo, sobretudo no teatro, mas expandindo-se para outras artes. Vimos se desenvolver no Brasil, a partir de 1999, o movimento Arte contra a Barbárie, que tem mobilizado artistas e intelectuais comprometidos com a "função social da arte" e com a crítica à "visão mercadológica que transforma a obra de arte em produto "cultural" e cria uma série de ilusões que mascaram a realidade da produção cultural no Brasil de hoje". Em âmbito internacional, temos o exemplo do movimento Dogma no cinema, que produziu um filme político dos mais expressivos dos dilemas mundiais no fim do século 20: a obra-prima Dançando no escuro, do dinamarquês Lars von Trier.

JU - Mas, com a mudança do pêndulo político para a esquerda, após a eleição de 2002, como fica o "círculo de ferro do mercado"?

Ridenti - No atual cenário político brasileiro, podem-se abrir novas perspectivas com o próximo governo. Mas a própria participação remunerada de artistas na campanha pode ser um sinal de integração do PT à lógica do showbusiness. Tomara que prevaleçam no governo políticas mais afinadas com o espírito alternativo do Fórum Mundial de Porto Alegre. Isto é, penso que devemos encontrar alternativas melhores de inserção do Brasil e de sua cultura no mundo de hoje do que a briga por uma fatia do mercado, que implica o ceticismo passivo, de submissão à lógica do mercado e da nova ordem mundial (que a esta altura já está ficando velha) do "consenso de Washington". Não cabe reviver o passado dos anos 60, mas retomar suas esperanças, apostar em novos projetos coletivos de transformação social - inclusive no terreno das artes - ao invés da carreira individual de cada um no mercado. Simpatizo com a posição já antiga de Walter Benjamin, que aconselha o artista ou intelectual questionador a recusar-se a meramente "abastecer o aparelho de produção, sem o modificar, na medida do possível, num sentido socialista". Resta saber se - e como - isso é possível. Os próximos anos no Brasil serão um interessante laboratório para testar nossa capacidade de invenção.

JU - Até que ponto a globalização influi na identidade cultural de um povo?

Ridenti - Como é sabido, a generalização do mercado, da indústria cultural, tende a reduzir qualquer manifestação artística a mera mercadoria, processo que se potencializa com a chamada "globalização", que também coloca em questão as identidades culturais nacionais dos povos. O processo de internacionalização cultural não é necessariamente conservador: é conhecido por exemplo o trecho do Manifesto Comunista em que Marx e Engels imaginam, para a sociedade livre do futuro, o fim das literaturas presas à estreiteza e ao exclusivismo nacionais, que dariam lugar a uma literatura universal. Sucede que hoje estamos muito longe dessa saudável utopia, ao contrário, a internacionalização globalizada implica a submissão às exigências quantitativas e de (baixa) qualidade do mercado, sob hegemonia cultural norte-americana.

JU - Os indicadores da indústria cultural nacional são superlativos para um país em desenvolvimento. Como o senhor avalia essa contradição?

Ridenti - Na década de 1960 estavam em luta pelo menos dois projetos para o desenvolvimento do capitalismo no Brasil. Um que foi derrotado em 1964, que era o projeto de construir um capitalismo de massas, como pregava o economista Celso Furtado. Ou seja, utilizar os investimentos do Estado para o desenvolvimento do país e promover um mercado popular, de produtos acessíveis para a maioria da população, com uma relativa distribuição da riqueza. Esse projeto foi derrotado. Não sei se teria viabilidade ou não.

JU - O que triunfou?

Ridenti - Um outro projeto, que foi na direção do que tem sido o desenvolvimento do capitalismo em escala internacional. Esse projeto criou um fosso entre uma minoria ínfima de proprietários do capital e a maioria da população, despossuída. Mas soube desenvolver uma poderosa e importante classe média - talvez 20% da população brasileira, com alto poder de consumo, de bens duráveis, de bens de mercado. Por outro lado, praticamente metade da população brasileira fica fora de qualquer possibilidade de consumo. Mas veja, 20% de 170 milhões de pessoas é um mercado de mais de 30 milhões, é um mercado mais que suficiente para dar conta da produção e de certo desenvolvimento econômico. Agora, sobram 50% que ficam praticamente excluídos do mercado, vivendo em condições subumanas de moradia, de saúde, de educação - gerando um terreno fértil para a criminalidade, por exemplo.

JU - Nos anos 1960 essa diferença era muito menor?

Ridenti - Essas desigualdades que fendem a sociedade brasileira sempre foram enormes. É interessante estudar a década de 1960 porque havia a utopia de romper com esse fosso, que era menor. Esse fosso atualmente é não só material, mas é também existencial.

JU - Como fica o papel do artista e do intelectual na medida em que ele é absorvido por esse mercado que de uma certa forma acaba difundindo a desigualdade?

Ridenti - Existe uma posição cética, dos que pensam que não há saída. Mas é muito confortável dizer "já que não cabe ao intelectual e nem artista resolver esses problemas, deixa eu me acomodar e conseguir o melhor lugar para minha carreira dentro desse sistema". Essa é uma posição cínica. É impossível que uma sociedade viva nessas condições durante tanto tempo. Diria que é muito importante o compromisso dos professores universitários, dos artistas, dos intelectuais em geral, dos próprios estudantes, com mudanças sociais que permitam diminuir esse fosso - não só material como também o existencial. É preciso criar alternativas de solidariedade social. Como já disse, talvez tenhamos possibilidade de caminhar nessa direção nos próximos anos, com as perspectivas abertas após as últimas eleições.

JU - Quais artistas jovens preservam hoje o "romantismo" de revelar pela arte a identidade dos brasileiros e tentar romper com o subdesenvolvimento?

Ridenti - O nacionalismo cultural no estilo dos anos 50 e 60, de resgate das raízes nacionais consideradas autênticas, apesar de fora de moda, encontra hoje expressão em vários artistas destacados, como Ariano Suassuna, Antonio Nóbrega, Quinteto Violado, Zé Ramalho, nas obras de teóricos como José Ramos Tinhorão, nas atividades de teatro e música popular desenvolvidas pelo CPCs, recriados sem muito alarde no movimento estudantil, etc. Mas o resgate da brasilidade - de maneiras diversificadas, que se desenvolveram criativamente a partir dos anos 60, como destaco no livro - encontra-se também nos herdeiros do tropicalismo e em quase todos os artistas da época atuantes até hoje, nas mais diversas áreas. As novas gerações parecem esboçar respostas inovadoras aos velhos dilemas, como o mangue-beat, o rap, o hip-hop e outros movimentos alternativos que sintetizam à sua maneira as influências culturais externas e a expressão popular brasileira, com um viés socialmente engajado. No campo da literatura, um correlato desses movimentos musicais aparece por exemplo no romance Cidade de Deus, de Paulo Lins, que agora deu base a um filme de muito sucesso. Mas esse já é um tema de que não trato no livro e me parece exigir uma chave explicativa diferente daquela que usei para pensar os movimentos artísticos e políticos dos anos 60 e 70, o "romantismo revolucionário".

Quem é Marcelo Ridenti
Marcelo Ridenti é formado em Ciências Sociais e Direito pela USP. É professor livre-docente do Departamento de Sociologia do IFCH/Unicamp e pesquisador do CNPq. Nasceu em São Paulo em 1959. É autor dos livros: Em busca do povo brasileiro - artistas da revolução, do CPC à era da TV. Rio de Janeiro: Record, 2000; Professores e ativistas da esfera pública. São Paulo: Cortez, 1995; Casses sociais e representação. São Paulo: Cortez, 1994 (2º ed. 2001); O fantasma da revolução brasileira. São Paulo, Editora Unesp, 1993 (1º reimpressão, 1996); Política pra quê? Atuação partidária no Brasil contemporâneo. São Paulo: Atual, 1992 (10º edição, 2001); História do marxismo no Brasil, 5. Campinas: Editora Unicamp, 2002.