O papel social das universidades públicas brasileiras é um conceito recente, compondo o tripé “ensino, pesquisa e extensão universitária”. A extensão envolve o desenvolvimento de atividades educativas, culturais e científicas junto à comunidade externa, viabilizando uma relação transformadora entre a universidade e a sociedade.
A Unicamp marca presença junto à população com seus cursos de extensão, oferecendo atualização e especialização para profissionais de todas as áreas. Nas Ciências Biomédicas, residentes são inseridos em programas de saúde pública e serviços comunitários em Campinas e cidades vizinhas.
As consultorias, as parcerias em pesquisa e a prestação de serviços junto aos setores público e privado, além das inúmeras ações comunitárias, compõem as atividades de extensão das áreas de Exatas e Tecnológicas, com importante atuação das empresas juniores. As Olimpíadas de Matemática e de Computação envolvendo estudantes do ensino médio têm repercussão nacional.
Docentes e principalmente alunos das Humanidades e das Artes interagem com a sociedade na criação de organizações não-governamentais e de projetos sociais. As apresentações de música, dança e teatro já fazem parte da cultura do distrito de Barão Geraldo, onde se localiza a Unicamp.
A inclusão da Unicamp entre as 200 melhores universidades do mundo, no ranking do The Times, é festejada pela Pró-Reitoria de Extensão e Assuntos Comunitários (Preac) e vista como um resultado natural para uma instituição que já nasceu com a vocação para pesquisas científicas de excelência.
O objetivo da Preac, no entanto, é o incremento das ações de extensão, equilibrando o tripé com o ensino e a pesquisa. Segue-se assim o exemplo das universidades líderes do ranking, há muito tempo estão engajadas em políticas públicas do Estado, que destina pesados recursos para estudos e projetos no campo social.
Uma premissa da extensão universitária é a de diagnosticar as necessidades da população que não tem acesso à Unicamp, ao passo que as pesquisas aplicadas atendam às demandas de setores da sociedade que já conhecem o caminho para a universidade.
CIÊNCIAS TECNOLÓGICAS
Com forte visibilidade no exterior, a Faculdade de Engenharia Elétrica e de Computação (FEEC) certamente contribuiu para a boa colocação da Unicamp no ranking do The Times. No entanto, ao mesmo em que procura manter-se no topo da pesquisa avançada, a unidade tem a tradição de participar de iniciativas voltadas ao atendimento imediato de questões sociais.
“Como exemplo, posso citar um trabalho de cooperação com as áreas da saúde e da educação visando tecnologias de apoio a pessoas com deficiência”, informa o diretor associado José Raimundo de Oliveira, que participa de um consórcio internacional sobre o tema.
São tecnologias relacionadas com a mobilidade (cadeiras de rodas e próteses automáticas) e a comunicação no sentido mais abrangente, desde o atendimento a surdos e cegos até a criança com paralisia cerebral grave. “A viabilização deste atendimento avançado está um pouco distante. Antes, resolvemos problemas simples no aspecto tecnológico, mas importantes do ponto de vista pessoal e social”.
Química
As pesquisas na Faculdade de Engenharia Química (FEQ) têm enfoque científico-tecnológico, com a transferência deste conhecimento para a sociedade principalmente através de projetos e convênios com empresas do setor químico. Em 2006, os 48 docentes da FEQ participaram de 128 projetos de pesquisa, com financiamentos das agências de fomento e de empresas públicas e privadas.
Osvaldir Pereira Taranto, diretor da FEQ, prega o fortalecimento da interação entre universidade e empresa para que os benefícios cheguem à sociedade. “Por um lado, é preciso convencer as empresas de que a universidade pode oferecer respostas para os desafios tecnológicos dos processos produtivos. Por outro, convencer os docentes da necessidade de realizar pesquisas aplicadas para problemas reais do setor produtivo”.
A Engenharia Química é uma das unidades da Unicamp com maior produção científica. Apenas no ano passado, foram originadas 14 patentes e dois pedidos de registro de software. “Para aumentar ainda mais esta produção é preciso garantir uma infra-estrutura básica de pesquisa e aumentar a quantidade e o valor das bolsas de iniciação científica e de pós-graduação”, reivindica Taranto.
Somente entre as pesquisas que resultaram em patentes, encontramos um equipamento para secagem de polpas vegetais (celulose) visando à produção de papel reciclado; um conjunto de arcos dentais pré-fabricados, flexíveis e com dentes ajustáveis; um processo de secagem da laranja para a utilização em suco natural, alimentos e composições farmacêuticas; e uma tecnologia que recupera água 100% limpa de compostos fenólicos.
Mecânica
A maioria das pesquisas na Faculdade de Engenharia Mecânica (FEM) visa ao aumento da produtividade e da capacitação de indústrias brasileiras. “Estamos envolvidos, por exemplo, em projetos para elevar a produção de petróleo junto à Petrobras, desenvolvimento de produtos para o setor de biodisel, otimização de motores e sensores para medição da pureza do combustível. Mesmo que indiretamente, essas pesquisas têm grande impacto social”, ilustra o diretor Anselmo Eduardo Diniz.
Segundo o diretor, as principais ações para que esta produção aumente já vêm sendo tomadas, como a melhoria da infra-estrutura de pesquisa com a construção de um novo prédio para laboratórios, em fase de construção. “Buscamos também o aumento do número de pós-graduandos, por meio de acordos com cursos de outras universidades, e a criação do mestrado profissional em engenharia automotiva e de um programa de incentivo ao recém-formado para cursar a pós-graduação”.
Diniz informa que, em 2006, a FEM bateu seu recorde com a publicação de 77 trabalhos em períodos internacionais, estando ainda entre as três unidades da Unicamp que registram maior número de patentes.
Alimentos
A Faculdade de Engenharia de Alimentos (FEA) atua em um eixo estratégico para todos os países, principalmente para o Brasil, considerando o impacto da área de alimentos na economia. Além da formação de profissionais altamente capacitados para a indústria de alimentos, a FEA estuda e desenvolve novas tecnologias e produtos, mantendo sólido vínculo com o setor produtivo.
“As pesquisas envolvem aspectos a qualidade de produtos industrializados, novos ingredientes que substituam os aromatizantes e corantes artificiais e as propriedades funcionais dos alimentos”, exemplifica a diretora Gláucia Pastore. Segundo ela, a produção científica e de patentes da FEA está entre as mais elevadas do país nesta área, inclusive servindo de parâmetro para outras instituições nacionais e da América Latina.
A diretora acrescenta que as pesquisas na Engenharia de Alimentos já permitem conhecer profundamente os alimentos das diversas regiões brasileiras, suas propriedades e a melhor maneira de processá-los para torná-los de qualidade, saudáveis e seguros para o consumo.
CIÊNCIAS HUMANAS, SOCIAIS E ARTES
A principal contribuição social da Faculdade de Educação (FE) está na formação inicial e continuada de professores da educação básica, de gestores escolares e demais profissionais da área. Suas pesquisas visam justamente à melhoria desses processos de formação e também de ensino-aprendizagem das crianças e adolescentes.
“Para que essa interação com a sociedade aumente, é preciso expandir a formação em serviço, permitindo ao profissional de educação refletir sobre sua prática coletivamente, no próprio local de trabalho e também coletivamente buscar a transformação dessa prática”, afirma o diretor Jorge Megid Neto.
Outra contribuição da FE refere-se à formação de quadros docentes das instituições de ensino superior. O programa de doutorado em educação conta na grande maioria com docentes que já atuam nessas instituições, públicas ou privadas, provenientes de quase todos os estados do país.
No amplo leque de pesquisas da Faculdade de Educação estão aquelas que focam o desenvolvimento cognitivo, intelectual, moral, afetivo e social das crianças e a influência deste desenvolvimento nos processos de aprendizagem; o uso de tecnologias de informação e comunicação em educação; e as relações entre educação e trabalho.
Humanas
O Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH), com seus departamentos de Antropologia, Ciência Política, Demografia, Filosofia, História e Sociologia, tem contribuído de forma decisiva para o pensamento das questões sociais.
“Além da formação de recursos humanos para todas essas áreas, o IFCH mantém centros temáticos de estudos que respondem por uma grande e variada produção de pesquisas, chegando aos maiores índices de produtividade da Unicamp”, afirma o diretor Arley Ramos Moreno.
O IFCH abriga doze centros de pesquisas, entre eles o Centro de Estudos Brasileiros, o Centro de Estudos Internacionais e de Política Contemporânea, o Centro de Pesquisa em Etnologia Indígena, o Centro de Estudos Rurais, o Centro de Estudos de Opinião Pública e o Centro de Estudos sobre a Cidade.
Linguagem
O Instituto de Estudos da Linguagem (IEL) é uma referência no Brasil e no exterior tanto no âmbito do ensino como das pesquisas e publicações envolvendo estudos da linguagem e das literaturas, mantendo intercâmbios de cooperação com universidades brasileiras e também da Europa e dos Estados Unidos.
O IEL tem como tripé de sustentação acadêmica a Lingüística, a Teoria Literária e a Lingüística Aplicada, com a missão de formar profissionais qualificados para o exercício do magistério e da pesquisa. As atividades de extensão visam repassar à sociedade os resultados deste trabalho de ensino e pesquisa na forma de cursos, projetos e serviços comunitários e parcerias com as secretarias de educação.
Sobre o efeito social das pesquisas acadêmicas, o diretor Alcir Pécora cita um exemplo na sua área, a literatura. “O professor Jefferson Cano realiza no IEL estudos sobre folhetins do século 19, que têm grande impacto sobre os lugares comuns a respeito, por exemplo, de Machado de Assis. Não vejo efeito social maior do que nos dar de volta a vontade e a liberdade de repensar Machado, a literatura produzida nos jornais e o sentido das crônicas”.
Artes
No Instituto de Artes, a arte é assumida como uma área de conhecimento, tal como as ciências. No entanto, diferentemente daquelas, não se trata de uma área de conhecimento intelectual, mas do conhecimento sensível. “Sendo uma área do conhecimento, a arte, por si só, tem o poder de educar e de ajudar na formação da cidadania. É a educação do sensível”, explica a diretora Sara Lopes.
A operacionalização deste conceito, acrescenta a diretora do IA, passa por estratégias que reúnem o olhar sobre o cultural e o social do país. “É com este olhar que comunidades indígenas, moradores e meninos de rua, internos de presídios e manicômios têm sido, ao mesmo tempo, objeto e sujeito de projetos de pesquisa e extensão”.
Segundo Sara Lopes, moradores de rua tiveram parte de sua identidade resgatada com o trabalho “Vicinhos do Fundo”, com suas histórias recontadas por um grupo de alunos de teatro. Em uma pesquisa de mestrado, meninos de rua transformaram-se em bailarinos, apropriando-se da dança e ganhando uma qualificação que mudou sua condição social.