Unicamp Hoje - O seu canal da Noticia
navegação

Unicamp Hoje. Você está aquiAssessoria de ImprensaEventosProgramação CulturalComunicadosPublicações na Unicamp

ciliostop.gif
Jornal da Unicamp

Semana da Unicamp

Assine o "Semana"

Divulgue seu assunto

Divulgue seu evento

Divulgue sua Tese

Cadastro de Jornalistas


Mídias

Sinopses dos jornais diários

Envie dúvidas e sugestões

ciliosbott.gif (352 bytes)

1 2 3 45 6 7 8 9 1011 12 13 14 15 1617 18 19 20

Jornal da Unicamp -- Janeiro de 2001

Página 19

Diálogos
com a França


A partir da Revista Niteroy, pesquisadora analisa o afrancesamento da cultura
brasileira no século 19


"Litteratura de um povo é o desenvolvimento do que elle tem de mais sublime nas
ideias, de mais philosophico no pensamento, de mais heroico na moral, e de maisbello na natureza, é o quadro animado de suas virtudes, e de suas paixoens, o
despertador de sua gloria, e o reflexo progressivo de sua intelligencia. E quando
esse povo, ou essa geração desaparece da superficie da Terra com todas as suasinstituiçoens, suas crenças, e costumes, a Litteratura só escapa aos rigores do
tempo, para annunciar ás geraçoens futuras qual fóra o caracter do povo, do qual é ella o unico representante da posteridade..."

ANTONIO ROBERTO FAVA

O texto acima, na verdade um suposto ensaio sobre a história da literatura
brasileira, foi publicado na Revista Niteróy — Sciencias, Letras, e Artes, lançada
em Paris há exatos 164 anos, e publicada pela Dauvin, et Fontaine, Libraires.
Considerada um marco do Movimento Romântico brasileiro, a publicação, que teve
apenas duas edições — editadas em português—, é um dos elementos de
pesquisa que integram a tese de doutorado da professora Ana Beatriz Demarchi
Barel, defendida ano passado na Universidade Paris III, sob a orientação da
professora Jacqueline Penjon, especialista em literatura brasileira. A pesquisadora
se propôs a tentar entender como se davam as relações culturais entre a Europa e
o Brasil no século passado, “pois é nesse momento que se define um conceito
fundamental para as nossas letras, o conceito de identidade; o que somos nós no
que diz respeito à literatura”, observa Ana Beatriz. Mas como uma publicação de
poucas páginas, que não passou da segunda edição, pode servir de subsídio para
um estudo desse fôlego?

O criador da revista na França foi Domingos José Gonçalves de Magalhães. Ele
integrava um grupo de jovens intelectuais brasileiros, o chamado Grupo de Paris, e
estabeleceu contatos com a elite intelectual francesa, o que acabou
proporcionando “interessantes relações para o Brasil”. O contato francês foi
Ferdinand Denis, que esteve no Brasil entre 1816 e 1819 e tornou-se anfitrião dos
brasileiros e um dos responsáveis pelo aparecimento da Niteróy na França. O
conteúdo era extremamente heterogêno, tratando não apenas de literatura como
também de filosofia, artes, química, física e as modernas (para a época) técnicas
de extração de açúcar, além de música e economia.

Mas por que uma publicação feita por poetas, voltada para este segmento, trazia
assuntos tão díspares? Ana Beatriz ressalta que a revista era marcada pelo
caráter amador, improvisado e heterogêneo. “Ela parece um ato de fé nos valores
da civilização francesa e uma das partes de um acordo diplomático que previa forte
atuação da França no cenário cultural brasileiro”, ressalta. Talvez por isso mesmo
Niteróy é uma revista mal estudada nos meios acadêmicos, que se limitam a uma
leitura superficial e parcial do texto de Gonçalves de Magalhães. “Para mim, a
revista é mais um documento de valor diplomático do que propriamente um
documento literário”, avalia a pesquisadora.

Galicismo – Ferdinand Denis foi pioneiro na divulgação da literatura brasileira na
França. Quando voltou ao seu país, levou esboços de obras consideradas
importantes sobre a história da nossa literatura, assim como sobre a fauna e a
flora. O Brasil do século 19 foi bastante influenciado pela França. Não raro,
comentava-se no meio literário que aquela época era de um grande galicismo, com
referência ao afrancesamento dos costumes e hábitos dos brasileiros.

Ainda que a Inglaterra dominasse o comércio de produtos manufaturados com o
Brasil, era da França que vinham os folhetins, os romances e a moda. Isso leva a
outros questionamentos: por que tanto interesse pela França, se a nossa
metrópole era Portugal, se por ali fazíamos nossa ligação mais direta com a
Europa e se a nossa língua é o português?

A resposta talvez esteja na proclamação da independência política do Brasil, em
1822. “Com isso, deixamos de ser colônia de Portugal e passamos a exibir status
de nação autônoma. Diante disso, por uma questão de demarcação de limites —
políticos, econômicos e principalmente culturais – não po-díamos continuar
utilizando o modelo luso e ibérico como padrão”, explica Ana Beatriz. Por volta de
1816, o perspicaz D. João VI já tinha em mente um projeto de construção de uma
nova imagem para o Brasil lá fora. Foi quando encomendou aos franceses o que
eles têm de melhor: cultura. Inclusive uma escola, que viria a ser a nossa Escola
de Belas Artes.

No mesmo ano, desembarcavam no Rio de Janeiro pintores, escultores, artesãos
de todo tipo, formando o que se chamou de Missão Artística de 1816 ou Missão
Artística Francesa, cuja principal proposta era, de fato, desenvolver intercâmbio de
informações culturais, “de forma a intensificar o universo da intelectualidade
brasileira”, como lembra Beatriz. Entre esses franceses imigrantes estava Félix
Taunay, avô do escritor Alfredo Taunay, autor de Inocência, romance que mais
tarde seria transcrito para o cinema em filme protagonizado pela atriz Fernanda
Torres.


© 1994-2000 Universidade Estadual de Campinas
Cidade Universitária "Zeferino Vaz" Barão Geraldo - Campinas - SP
E-mail:
webmaster@unicamp.br