Eletricidade também se polui, como ar e água
José Pomílio informa que modo de espera pode representar
até 15% do consumo de energia em uma residência

CARLOS TIDEI

utro problema que a crise vem tornando cada vez mais importante é o relacionado com a qualidade da energia elétrica. Conceitualmente, a poluição da rede elétrica é análoga à do ar e da água. “A eletricidade é um bem comum, onde todos compartilham os mesmos recursos. Se eu coloco um aparelho que é poluidor (em termos elétricos), posso estar prejudicando todos que estão na rede, porque compartilham o sistema”, comenta o professor José Tomílio. Um exemplo atual é a lâmpada fluorescente compacta, que consome menos energia, mas impõe grande deformação na corrente que circula pela rede. “Ela gasta menos água na usina hidroelétrica, mas do ponto de vista eletrônico é muito ruim. O fator de potência é 0,5, enquanto o ideal é 1. As lâmpadas compactas seriam melhores com a introdução de uma pequena modificação no circuito, que já é feita nas lâmpadas vendidas para a Europa, mas não realizada no Brasil por falta de uma norma técnica que obrigue”, detalha Pomílio. Ele acrescenta que existem diversas normas internacionais limitando a distorção da forma da corrente que um equipamento ou uma instalação industrial podem produzir, ainda não aplicadas devidamente em nosso país.

“Nós enviamos uma proposta, em nome da Sociedade Brasileira de Eletrônica de Potência, para a Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), que respondeu tê-la encaminhado ao setor responsável e também à Abilux (Associação Brasileira da Indústria de Iluminação), entidade que deve sentar-se à mesa para discutir estas normas. Não existem até o momento estudos para as lâmpadas compactas, apenas para as tubulares, que já estão devidamente regulamentadas”, informa o pesquisador.

A eletrônica de potência é uma área que pesquisa o processamento de energia, tendo como um de seus focos a redução do consumo através de equipamentos mais racionais, mantendo ou mesmo melhorando o desempenho dos processos e sistemas. Para José Pomílio, a questão é como ter equipamentos elétricos mais eficientes e com maior rendimento elétrico. “Por que se troca a lâmpada incandescente por uma fluorescente? Porque proporciona a mesma qualidade de iluminação com menor consumo de energia. Oitenta por cento da potência da incandescente é calor, enquanto na fluorescente, chamada de luz fria, o consumo praticamente é só para a luz”.

O Procel (Programa de Conservação de Energia Elétrica) também age neste sentido: incentivar o desenvolvimento e o uso de aparelhos como geladeiras, máquinas de lavar roupa ou qualquer outro equipamento elétrico que gastem menos eletricidade e tenham a mesma eficiência e desempenho.

Estabilizadores – Em relação à qualidade da energia, algumas situações são especialmente críticas, como em hospitais onde existem centenas de aparelhos funcionando simultaneamente. Em uma tomografia, por exemplo, ao se ligar simultanemanete outro equipamento que polua a rede elétrica, o exame pode apresentar imagem distorcida que não corresponda à realidade, levando a um diagnóstico equivocado. Em muitos casos, o próprio fabricante do aparelho indica a necessidade do uso de um no break profissional que garanta uma tensão adequada ao equipamento, com uma alimentação separada da rede elétrica local.

A ABNT definiu recentemente normas técnicas para os estabilizadores, muito usados em computadores para garantir uma boa tensão de alimentação ao equipamento. Estas normas tornaram-se obrigatórias a partir deste mês de julho. O principal benefício é o estabelecimento de padrões mínimos de qualidade para tais produtos, retirando do mercado aparelhos tecnicamente ineficazes e até mesmo perigosos. O papel de um estabilizador é o de compensar variações da rede elétrica de modo a manter a carga estabilizada. Mas geralmente o próprio aparelho conta com este recurso. O estabilizador funciona, nestes casos, mais como um fator de segurança adicional, incluindo a proteção contra descargas elétricas.

“Certamente os fabricantes de estabilizadores vão utilizar a redução da tensão proposta pelo governo como ferramenta de marketing para vender seus produtos. Já os filtros de linha, divulgados como redutores de consumo, não proporcionam economia alguma”, alerta Pomílio. O próprio estabilizador, segundo ele, não colabora com a economia de energia. “É mais um equipamento ligado, consumindo mais alguns watts”, avalia.

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Canseira pode ser maior que a de trocar as lâmpadas

CARLOS LEMES PEREIRA

Para os consumidores residenciais, seguir à risca certas recomendações simplistas que o governo federal anda insistindo em popularizar, na campanha de economia de energia elétrica, pode resultar em mais que a simples canseira de trocar todas as lâmpadas tradicionais da casa pelas de modelo considerado menos “gastão”, e até mesmo em prejuízo de terem aparelhos eletroeletrônicos danificados. O alerta é da professora Francisca Aparecida de Camargo Pires, do Departamento de Sistemas e Controle de Energia da Faculdade de Engenharia Elétrica e de Computação (FEEC) da Unicamp. Segundo ela, de nada adiantará o esforço caseiro se as concessionárias não forem obrigadas a adequar a tensão nas redes secundárias ao nível das novas taxas reduzidas de consumo que estão sendo impostas.

“A primeira providência indicada pelo governo aos consumidores residenciais foi a de trocar as lâmpadas incandescentes pelas fluorescentes compactas. Acontece que esta, de um modo geral, causa distúrbios na rede”, esclarece a engenheira. “Se a gente for monitorar a onda da corrente destas lâmpadas, verificaremos que, de sinoidal, não tem nada; a forma é totalmente picotada e, para a maior parte dos consumidores, poderá se comportar como cargas não-lineares. Isso pode causar alguns problemas na própria distribuição e mesmo atingir o sistema de transmissão”.
A explicação técnica, segundo ela, é a seguinte: “Cargas não-lineares podem acarretar sobretensões; além disso, habitualmente, quando uma carga normal (aquela que corresponde ao consumo normal) é ligada, você tem a tensão num determinado nível, porque isso foi regulado, não nos postes, mas em subestações encarregadas de manter o abastecimento de uma certa área. Quando você alivia muito a carga, a tendência é a tensão na rede aumentar”.

Lembrando que a “grande ansiedade das pessoas é ter de economizar em função da média de consumo registrada no ano passado”, a especialista frisa: “Só que aquela, até então, era a média que normalmente você e seus vizinhos tinham como consumo sob certa tensão. Agora, com muita gente baixando esse consumo, teremos aumento de tensão (que poderá ou não estar na faixa dos 5% previstos legalmente), e que poderá, também, apresentar distorções consideráveis pela presenção das lâmpadas fluorescentes compactas”.

Além de as “lâmpadas milagrosas” correrem o risco de não fazer nenhum milagre, a engenheira alerta: “Um equipamento mais sensível, que dependa de controle de tensão, pode pifar. Inclusive computadores com estabilizadores, até porque tem muito estabilizador no mercado que não cumpre tudo o que está na propaganda”.
A solução, para ela, seria “alguém lá de cima” forçar as concessionárias a modificarem seus parâmetros, para adequar a transmissão aos novos níveis de consumo. Exemplos a seguir não faltam, de acordo com ela: “Nos EUA, o expediente do blackout pode muitas vezes ser superado pela técnica do brownout, ou seja, ao invés de apagar tudo, mapeia-se os pontos mais críticos de tensão nas redes, diminuindo-a em consonância com o consumo verificado em cada parte dos centros urbanos”.


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