Energia
da churrasqueira Carlos
Luengo atua na construção de um forno capaz de produzir novo
tipo de carvão vegetal JOÃO
MAURÍCIO DA ROSA atmosfera
ao redor da churrasqueira em brasa está impregnada pelo aroma de gases
voláteis óxidos de carbono, ácido acético e
aldeídos, entre outros. Se a estrutura da churrasqueira fosse mais eficiente,
poderia aprisionar esses gases e transformá-los em energia elétrica,
assim como já está sendo feito com o calor aprisionado de um gerador
da Universidade Federal do Acre. Estas duas fontes energéticas os
gases do carvão e o calor dos geradores são algumas das pesquisas
desenvolvidas no Instituto de Física Gleb Wataghin (IFGW) da Unicamp, pelo
Grupo de Combustíveis Alternativos (GCA). A
churrasqueira capaz de aprisionar gases, na verdade é um forno. O professor
Carlos Alberto Luengo aponta para a obra, erigida no quintal do GCA.
Coordenador e orientador de pós-graduação do Grupo, Luengo
mostra uma construção rústica, em tijolos refratários,
com alguns dutos acoplados nas paredes. A
rusticidade, porém, é mera ilusão. Trata-se de um sofisticado
forno para produção de um novo tipo de carvão
vegetal, com propriedades diferentes do carvão tradicional. Propriedades
que o tornam uma alternativa interessante para a produção de energia
e capaz de abastecer, por exemplo, pequenas comunidades rurais que atuam de forma
cooperativa. Nascido
em Buenos Aires, formado e doutorado em Bariloche, Luengo foi por alguns anos
pesquisador na Universidade da Califórnia, em San Diego. Aqui, coordena
uma verdadeira usina de alternativas para produção de energia. Atualmente,
além do forno de torrefação de biomassa, como é chamada
a construção de tijolos, tem outro trabalho desenvolvido na Unicamp
já em operação no Acre, refrigerando o ar de instalações
da universidade daquele Estado, e capaz até alimentar a rede de distribuição
elétrica estatal. O
forno de torrefação está sendo desenvolvido pelo aluno de
pós-graduação Félix Fonseca
Felfli, numa pesquisa com nome complicado: Estudo das Vias de Introdução
da Biomassa Torrada no Mercado de Insumos Energéticos do Brasil. Ao
contrário do forno tradicional para produção de carvão
vegetal, este conserva gases voláteis que o outro desperdiça por
falta de um controle preciso de temperatura e tempo de queima, explica Félix,
formado em engenharia mecânica pela Universidade do Oriente, de Cuba, e
doutorando no curso de Planejamento Energético na Unicamp. Enquanto
os fornos tradicionais fazem combustão da lenha a uma temperatura de 400
graus, controlada por intuição, este não passa de 200 graus
e é controlado por parâmetros exatos, informa. Este controle
reduz o tempo de queima de 4 ou 5 dias para 4 horas. Também apresenta um
rendimento superior: se o sistema normal obtém 30 quilos de carvão
em 100 quilos de lenha, o forno de Felfli consegue 70 quilos. E ainda conserva
gases como óxidos de carbono, ácido acético, aldeído
e outros que são canalizados para a produção de energia,
a razão dos dutos nas paredes. Para
quem não conhece os gases citados por Felfli, o professor Luengo pede que
apure o olfato diante da churrasqueira ardente. São gases que fazem
parte do cotidiano das famílias, observa. Complexidade
Apesar da aparência rudimentar, a construção do forno
experimental envolve complexos modelos matemáticos para simulação
do processo, meticulosos cálculos de engenharia para desenvolvimento do
projeto da unidade básica e experimentos com os produtos obtidos. Se
não fosse complexo, não justificaria um doutoramento, observa
Felfli. Ao
contrário dos fornos tradicionais utilizados para a produção
de carvão, em forma de iglus, que controlam a temperatura através
de furos que são abertos ou fechados, este forno hightech tem o calor controlado
por rigorosos parâmetros. É possível determinar com
precisão a temperatura e o tempo de queima sem margem de erros, garante
o pesquisador. O
processo de carbonização visa eliminar os voláteis e a água
da madeira para facilitar a combustão e concentrar energia. A torrefação
vai atingir o mesmo objetivo, mas conservará aqueles voláteis que
têm energia. O carvão torrefato, assim chamado tecnicamente,
é considerado ecologicamente compatível frente as exigências
atuais e pode ser amplamente utilizado por empresas preocupadas com a preservação
ambiental. É uma alternativa para a substituição da
madeira na alimentação de caldeiras e cerâmicas, por exemplo,
explica Felfli. Uso
doméstico Utilizado domesticamente, o forno pode gerar energia
para associações de produtores rurais que disponham de matéria-prima
como palha de arroz, cana e quaisquer outros produtos carbonizantes. Basta aliar
o equipamento de Felfli a um gerador e um gaseificador para acender as luzes ou
fazer rodar a bomba de irrigação. O forno vai consumir apenas
os resíduos da lavoura normalmente desperdiçados, argumenta
o pesquisador. O
professor Luengo acredita que, sendo um produto ecologicamente compatível
com a nova ordem mundial, o carvão torrefato tem tudo para consolidar-se
no mercado como alternativa energética. Trata-se de um processo que
só precisa demonstrar sua economicidade, afirma. A
pesquisa é financiada pela Fapesp (Fundo de Amparo à Pesquisa do
Estado de São Paulo), com prazo de conclusão em dois anos. O resultado,
segundo Felfli, deverá ser obtido em 2002. No ano seguinte será
realizada pesquisa de mercado para a disseminação do produto. que
já está em processo de patenteamento pela Fapesp. ---------------------------------------------------------
Universidade
do Acre adota co-geração energética Localizado
no lado mais ocidental da Amazônia, o Estado do Acre, assim como grande
parte da região Norte, é abastecido por energia termelétrica
a partir de óleo diesel transportado em balsas que saem de Manaus e, portanto,
caríssimo. Por isso, não poderia ser mais apropriado o projeto de
doutorado do estudante Francisco Eulalio dos Santos, da Universidade Federal do
Acre (Ufac). Conhecido
pelos colegas da Unicamp como Magnésio, Francisco veio com uma bolsa de
estudos para concretizar uma idéia que já está produzindo
resultados junto à sua instituição de origem. Ele vem aproveitando
o calor desprendido por geradores da Ufac para refrigerar o ar de suas instalações;
o método ainda pode gerar energia para a rede elétrica local. Magnésio
transformou um grupo motogerador de uns 300 kVA a diesel, similar aos emergenciais
do Hospital das Clínicas da Unicamp e muito freqüentes na região
Norte, em um co-gerador compacto, explica o professor Carlos Luengo. Utilizando
refrigeradores por absorção de calor, ele obtém ar condicionado
e eletricidade. O
professor lembra que a tecnologia de co-geração energética
é amplamente difundida nas indústrias de papel e de cana, mas sua
aplicação no setor terciário, como está fazendo Francisco
dos Santos, foi negligenciada até o momento. A
Ufac é a primeira universidade brasileira a implementar esta forma de conservação
energética, mas graças à crise alguns shoppings e outros
estabelecimentos do setor terciario já estão considerando esta possibilidade,
informa. O
projeto de Magnésio foi desenvolvido como parte de seu doutorado junto
ao CPE/FEM (Curso de Planejamento Energético da Faculdade de Energia Mecânica),
do qual o Instituto de Física também participa. Sua apresentação
na Unicamp ocorrerá assim que o projeto for testado pela Eletronorte, estatal
de energia da região Norte.
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