Jornal da Unicamp 181 -  22 a 28 de julho de 2002
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Universidade e o
"quase mercado" educacional

WANDA JORGE

José Dias Sobrinho: "Toda universidade é uma instituição com função públicaO delicado equilíbrio entre aperfeiçoar métodos de avaliação que, ao medir eficiência, privilegiem a qualidade e não caiam na armadilha do “eficientismo”, é um dos desafios apontados pelo professor José Dias Sobrinho, pesquisador da Faculdade de Educação da Unicamp, em sua conferência sobre Avaliação da Universidade no primeiro dia da 54ª Reunião Anual da SBPC, ocorrida em Goiânia de 7 a 12 de julho. Ele avalia que existe hoje um cenário de controle dos resultados que resulta em perda de autonomia e na imposição da ideologia da produtividade adotada pelo setor empresarial.

Dias Sobrinho reconhece que o mercado tem urgência na capacitação profissional, mas estes critérios temporais de pressa, que se justificam na burocracia ou no ritmo das agências, nada têm a ver com a temporalidade de médio e longo prazo da pesquisa.

A avaliação democrática e ética tem que ter o bem público e o atendimento a toda sociedade como eixos fundamentais. E estes fundamentos devem ter primazia sobre qualquer quantificação da pesquisa, acrescenta.

O pesquisador explica que a universidade é uma das mais complexas instituições, destinada historicamente a formar plenamente os cidadãos. “Independentemente da origem dos recursos que a mantém, toda universidade deve ser considerada uma instituição com função essencialmente pública”. Alerta que, entretanto, um deslocamento de sentido se vai amplamente produzindo: há uma tendência em alterar profundamente sua essência de instituição social para a reduzir numa organização que se estrutura e age em função da economia.

“No ‘quase-mercado’ educacional, a educação e os conhecimentos tendem a ser uma ‘quase-mercadoria’ para uso do indivíduo e dos grupos de clientes ou consumidores que a podem possuir. A formação plena do ser humano tende a se reduzir, na educação superior instrumentalizada para o mercado, ao sucesso individual, especialmente à capacitação para empregos, quer estes existam ou não”.

Essa nova configuração de sentidos faz parte de um processo de grave deslocamento ético, acrescenta. Dentro dessa lógica derivada do mercado, a qualidade é algo que se mede segundo indicadores de produtividade e eficiência e tem sua expressão na quantificação do produto. Este procedimento acaba produzindo os rankings para informação do governo e dos consumidores do mercado educacional.

“A opção preferencial pelos procedimentos quantitativos, que em alguns casos chega a constituir-se como uma verdadeira quantofrenia e que transforma a avaliação numa corrida de contagem de pontos, deve-se à necessidade de organizar resultados comparativos e classificatórios que informem rápida e objetivamente tanto a administração superior, em função de suas políticas de fiscalização e regulação, quanto o mercado, para efeito de orientação dos consumidores ou clientes”. Sobrinho lembra a filósofa da USP, Marilena Chauí, ao criticar o modelo de produtividade adotado no meio acadêmico: “a universidade, em lugar de criar os seus padrões e critérios próprios de avaliação, imita, e mal, os padrões da empresa privada e da lógica do mercado”.