Universidade tem pelo menos 20
grupos de trabalho atuando na área de partículas
Nanociência. A Unicamp reúne seus 20 grupos
MARIA TERESA COSTA
A nanotecnologia e a nanociência ainda estão começando no Brasil, mas a Unicamp já tem um significativo número de pesquisadores atuando na exploração de propriedades de partículas em escala atômica e trabalhando na construção de estruturas complexas, átomo por átomo. Numa área em que tudo se mede numa escala de um milhão de vezes menor que um milímetro, a Unicamp já tem, no mínimo, 20 grupos envolvidos nesse campo onde ainda há muitos fenômenos a serem explicados, estudados ou mesmo descobertos. É um número considerável para uma só universidade, observa o professor Oswaldo Luiz Alves, do Instituto de Química. A produção de alguns desses grupos já tem resultados importantes, como é o caso de patente para um nanocomposto obtido de uma mistura de argilas e polímeros que poderá ser utilizado em embalagens. "Esse material vai resolver um dos problemas relacionados com a permeabilidade do oxigênio. Qualquer substância que não pode ser embalada em plástico, como a cerveja, por exemplo, poderá ser guardada em recipiente à base desse nanocomposto", afirma. Esse projeto foi desenvolvido no âmbito do Instituto do Milênio de Materiais Complexos, do Ministério da Ciência e Tecnologia, coordenado pelo professor Fernando Galembeck, do Instituto de Química.
O pesquisador observa que o importante é introduzir funcionalidade a coisas em escalas tão pequenas. A funcionalidade é dada agregando inteligência (ou reconhecimento molecular) às nanoestruturas. Desse modelo, abre-se possibilidade para usá-las como veículos para ministrar medicamentos, por exemplo. Essa funcionalidade vem sendo buscada pelo grupo coordenado pelo professor Marcello Mantovani Martiniano de Azevedo, do Laboratório de Química Biológica, do Instituto de Química, que está formulando micro e nanopartículas de polímero biodegradável que veiculem compostos de atividade farmacológica importante. Entre esses compostos estariam a violaceína, que possui atividades antitumoral, antituberculose e antiviral, a trans-desidrocrotonina (antiulcerogênica), além de outros compostos de reconhecida importância terapêutica, como a isoniazida e a estreptomicina.
Há muitos trabalhos teóricos que são importantes na área de nanociência, lembra o físico Fernando Cerdeira, que integra Grupo de Propriedades Ópticas do Departamento de Física da Matéria Condensada, do Instituto de Física. Esse grupo investiga propriedades eletrônicas, de transporte e ópticas em heteroestruturas e nanoestruturas de semicondutores e propriedades ópticas de semicondutores.
Um dos grupos que atua em ciência básica é coordenado pelo professor Marcelo Knobel, do Laboratório de Materiais e Baixas Temperaturas do Instituto de Física. O grupo vem produzindo materiais nanocristalinos magnéticos com diversos métodos e estudando a sua formação, evolução e propriedades físicas finais. "Tentamos em particular entender como modificar ou otimizar certas propriedades que podem vir a ser úteis em aplicações, ou ainda entender fenômenos que surgem e ninguém ainda sabe o por quê", diz. São estudos, observa Knobel, que poderão ser importantes quando os sistemas computacionais tiverem bits de informações cada vez menores.
Na área da Biologia, no entanto, as experimentações ainda são muito iniciais, conforme a professora Maria Alice Cruz-Hofling, que integra o grupo liderado por Vítor Baranauskas, da Faculdade de Engenharia Elétrica e de Computação. Esse grupo vem obtendo processos para geração de micro e nanotubos de diamantes ou carbono, com diferentes porosidades e terminações para aplicações, por exemplo, em peneiras tubulares moleculares, implantes e próteses e dispositivos de emissão de campo fortemente luminescentes. Esse grupo utilizou a nanoscopia de força atômica para análise de biossistemas, formados por células e biomoléculas ou por experiências in-vivo
Trabalhos ganham projeção internacional
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Os trabalhos em nanotecnologia e nanociência que vêm sendo desenvolvidos nos mais diferentes laboratórios da universidade já ganharam repercussão internacional em publicações importantes. É o caso dos estudos para a utilização de fios de ouro em circuitos nanoeletrônicos, desenvolvidos por três físicos brasileiros, entre eles o pesquisador Edison Zacarias da Silva, da Unicamp. A pesquisa, publicada na revista Science, recebeu do editor M. Levine a referência de melhor literatura mundial em ciência de materiais.
Os físicos usaram simulações de dinâmica molecular e cálculos de primeiros princípios para estudar as estruturas do fio de ouro, mostrando a formação, evolução e a quebra de um nanofio. O estudo detalha como se comportam os átomos de ouro quando esticados até formar um único fio, que só se rompe após obter uma cadeia de até cinco átomos enfileirados
Grande parte dos estudos que vêm acontecendo na universidade diz respeito à busca de compreensão e o controle da matéria na escala nanométrica ou, de forma mais abrangente, desde a escala do átomo até cerca de 100 nanômetros. Mas há também ciência aplicada sendo produzida. Uma das áreas que deve ter interesse mais amplo dentro da Unicamp é a de microssistemas (MEMS), na avaliação do coordenador do Centro de Componentes Semicondutores e professor da Faculdade de Engenharia Elétrica e de Computação, Jacobus Swart.
A produção de máquinas tão pequenas quanto um fio de cabelo, mas que possuem componentes elétricos e mecânicos são cada vez mais necessárias para automatizar e melhorar processo com aplicações em várias áreas. Nessa linha se encaixam biossensores e vários tipos de sensores para medidas químicas, biológicas, entre outras. Swart integra um grupo que vem se dedicando a otimização dos processos e caracterização de nanotubos, planejando utilizá-los em sensores e outros dispositivos e para nanoinstrumentação.
A microfabricação de arcabouços tridimensionais para engenharia de tecidos é outra investigação que está em andamento dentro da Unicamp, envolvendo pesquisadores do Departamento de Materiais da Faculdade de Engenharia Mecânica e do Centro de Componentes Semicondutores. O grupo, liderado por Cláudio Cutrim Carvalho, da FEM, vem usando litografia macia para gerar, na superfície dos biomateriais, padrões e arranjos morfológicos capazes de influenciar eventos físicos e biológicos importantes que determinam, por exemplo, a adesão celular a um substrato, expressão fenotípica e crescimento celular.
Há um grupo, liderado pelo pesquisador Luiz Carlos Kretly, do Departamento de Microonda e Óptica da Faculdade de Engenharia Elétrica e de Computação, que está investigando a propagação de ondas eletromagnéticas em nanotubos de carbono. Como os nanotubos de carbono são elementos com grandes possibilidades de aplicações, o grupo pretende utilizar esse dispositivo para comunicação em nanoescala, que vão desde conexões entre transistores ópticos até canais de comunicação para dispositivos nanorobóticos em aplicações na medicina.
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Oficina vai agregar esforços
A Unicamp vai reunir nos dias 5 e 6 de junho pesquisadores da universidade e da região de Campinas que atuam nas mais diversas áreas com interesse especial em nanociência e nanotecnologia. Mais que gerar contatos entre os pesquisadores e troca de informações entre os grupos que já atuam em escala de bilionésio de milímetro, a Unicamp espera o surgimento de programas multidisciplinares em nanociência ou nanotecnologia.
Organizada pela Pró-Reitoria de Pesquisa, a Oficina terá 19 apresentações orais e 17 painéis que permitirão aos participantes apresentar as facilidades, capacidades e competências de seus grupos de pesquisas. A Oficina, diz o assessor da Pró-Reitoria de Pesquisa, Roberto de Alencar Lotufo, será uma oportunidade de conhecer as facilidades instrumentais e de equipamentos da universidade, maximizar a sua utilização e criar novas possibilidades. "Esse talvez seja o primeiro esforço da universidade em saber exatamente suas capacidades, facilidade e instrumentação para uma área especifica", observa.
A proposta, de acordo com o físico Fernando Cerdeira, que integra o Comitê Organizador da Oficina sobre Nanociência e Nanotecnologia, é agregar as pessoas que nesse momento estão desenvolvendo projetos por iniciativa própria e com isso estimular o surgimento de algum projeto que eventualmente possa ter impacto nessa área. "Temos pesquisadores, as pessoas estão trabalhando, mas há uma certa falta de conhecimento dos grupos e dos pesquisadores entre si e do potencial que poderia ser desenvolvido se várias dessas pessoas e grupos decidissem embarcar em um projeto juntos", acredita
O professor Jacobus Swart, da Faculdade de Engenharia Elétrica e de Computação e que também integra o Comitê Organizador da Oficina exemplifica. "Trabalhamos com tecnologia de microfabricação e nanofabricação. Temos alguma infra-estrutura e algum conhecimento nessa área, mas falta um contato maior com as pessoas que necessitam dessas estruturas para outras fabricações", diz.
Já há colaboração entre as áreas, mas ela pode ser mais abrangente e é isso que a universidade está buscando nesse momento, podendo, a partir do interesse dos diversos grupos, derivar para um programa multidisciplinar em nanociência e nanotecnologia, avalia o professor Oswaldo Luiz Alves, do Instituto de Química. Além de Lotufo, Cerdeira, Swart e Alves, integram o Comitê Organizador da Oficina os professores Maria Alice Cruz-Höfling, do Instituto de Biologia, e o professor Fernando Galembeck, do Instituto de Química.