Produto, que está prestes a ser
industrializado, inibe proliferação de bactérias patogênicas
Bebida à base de soja desenvolvida pela FEA
previne doenças intestinais
MANUEL ALVES FILHO
Pesquisadores da Faculdade de Engenharia de Alimentos (FEA) da Unicamp acabam de desenvolver uma bebida fermentada à base de soja que se enquadra no conceito de alimento simbiótico. O produto reúne microorganismos com funções prebióticas e probióticas, que atuam conjuntamente para manter o equilíbrio da flora intestinal, impedindo assim a proliferação de bactérias patogênicas. Estas podem ser responsáveis pelo surgimento de uma séria de doenças, tais como infecção intestinal, insuficiência pancreática e até mesmo a depressão. De acordo com o professor Francisco Maugeri Filho, coordenador do projeto, a bebida está sendo processada em escala laboratorial. O próximo passo será produzi-la em planta piloto, etapa imediatamente anterior à da industrialização. A tecnologia é objeto de um pedido de patente por parte da Universidade.
O novo alimento, conforme o docente da FEA, já despertou o interesse da iniciativa privada. Algumas empresas têm mantido contato com Maugeri, com o objetivo de firmar um acordo que permita a produção em larga escala. “A área médica também tem voltado a sua atenção para o produto, em virtude dos benefícios que ele pode trazer à saúde”, revela o especialista. O extrato hidrossolúvel de soja desenvolvido pelos pesquisadores da Unicamp, nome técnico da bebida, é resultado de vários anos de estudos. Os cientistas têm trabalhado, entre outras áreas, na formulação dos chamados alimentos funcionais, ou seja, aqueles que oferecem às pessoas mais do que nutrientes e energia. Eles também têm a propriedade de desempenhar funções benéficas ao organismo humano, como prevenir doenças, proteger órgãos e tecidos e manter as reações básicas. Em outras palavras, têm ação terapêutica.
Maugeri conta que os pesquisadores, entre eles Olga Lúcia Bernal, autora de uma dissertação de mestrado sobre o tema, optaram por uma bebida à base de soja porque muitas pessoas perto de metade da população mundial - são intolerantes ao leite e seus derivados. Além disso, o grão contém substâncias importantes para a saúde humana, como as isoflavonas, atualmente empregadas no tratamento hormonal de mulheres que entram na menopausa. Para chegar ao alimento simbiótico, os especialistas da Unicamp primeiramente fizeram uma seleção de microorganismos com propriedade prebióticas.
Foram coletadas 500 amostras de leveduras presentes em flores e frutos de diversas regiões brasileiras, como Pantanal, Floresta Amazônica, Serra do Mar e Cerrado. Destas, cinco foram escolhidas para compor a bebida. O docente da FEA explica que, embora sejam benéficos à saúde, os agentes prebióticos não são absorvidos pelo organismo. Além disso, eles são os alimentos preferenciais dos microorganismos probióticos bifidobactérias, por exemplo -, que, ao se proliferarem, combatem as bactérias patogênicas presentes no intestino, potenciais causadoras de enfermidades.
Até pouco tempo atrás, destaca Maugeri, acreditava-se que o intestino era responsável apenas pela assimilação dos nutrientes fornecidos pela comida. Recentemente, descobriu-se que os microorganismos do trato intestinal podem ser responsáveis pelo desenvolvimento de uma série de doenças. “A prevalência das bactérias patogênicas sobre os agentes probióticos promove um desequilíbrio no organismo, o que traz reflexos importantes para o estado geral da pessoa”, explica o docente da FEA. Segundo ele, alguns neurotransmissores, como a serotonina, popularmente conhecida como “hormônio do humor”, são produzidas no intestino. Ou seja, a deficiência na geração dessa substância pode concorrer para o aparecimento da depressão, mal anteriormente associado apenas ao âmbito da psique.
“Os alimentos simbióticos têm justamente a missão de ajudar a prevenir esses problemas. Estamos partindo de uma bebida relativamente simples para proporcionar maior bem-estar às pessoas”, afirma o professor Maugeri. Segundo o especialista, antes de ser produzida comercialmente, a bebida à base de soja ainda terá que cumprir algumas etapas. Além da fabricação em planta piloto, será necessário promover testes sensoriais, de modo a escolher que aromatizantes devem ser adicionados ao produto, assim como optar pela embalagem mais adequada para acondicioná-lo. Por fim, será preciso realizar ensaios com animais e humanos para definir qual a dose diária para gerar bons resultados ao organismo. “Preliminarmente, estamos inclinados a acreditar que 100 mililitros já seriam suficientes para proporcionar ganhos à saúde”, estima.
Ainda de acordo com o docente da FEA, a expectativa é que dentro de aproximadamente seis meses a tecnologia já esteja pronta para ser transferida para o setor produtivo. Maugeri adianta que o produto final será semelhante às bebidas à base de soja presentes no mercado, mas com as vantagens já mencionadas. Deverá ser mantido resfriado e terá uma vida útil de prateleira de 30 dias. Os estudos realizados pelos especialistas da FEA contam com financiamento e concessão de bolsas de estudos da Capes, CNPq e Fapesp.