Mendes explica que o modelo predominante de redes de comunicação é o das redes proprietárias, ou seja, de empresas como de telefonia ou de televisão a cabo que controlam e cobram por seus serviços. “A infovia, ao contrário, possui uma infra-estrutura semelhante à das vias públicas. Assim como qualquer pessoa circula livremente pelas ruas e avenidas, qualquer cidadão pode ‘circular livremente’ pela infovia”.
O projeto foi iniciado com a construção da rede de fibras ópticas do governo municipal, mas já neste segundo semestre ela será aberta para a comunidade. “Em cima desta rede de alta velocidade vamos colocar uma série de soluções e de serviços adicionais para a população”, antecipa o pesquisador da Unicamp.
Os dois serviços iniciais serão de internet rápida e de telefonia IP. Leonardo Mendes observa que a internet comercializada como sendo rápida oferece taxas entre 200 e 400 kilobits por segundo, mas com garantia de apenas 10% destes valores. “Na infovia estamos lidando com taxas acima de 2.000kbps, havendo a possibilidade de alcançar até 100.000kbps”.
Segundo o professor, é esta capacidade que viabilizará a migração total do uso de telefonia da cidade para a infovia com VoIP, fazendo com que a tarifa local passe a ter preço irrisório ou mesmo nada custe. “Este valor já estará inserido no custo de acesso à rede compartilhada pela comunidade. Sendo universal, teremos um custo bastante razoável para a qualidade e a variedade dos serviços disponibilizados. A infovia não é apenas para quem pode pagar, é para todos”.
Neste primeiro momento, o acesso será gratuito, pois se dará através de rádio e a taxas até 400kbps, abaixo da capacidade da infovia. Mendes justifica esta redução por causa da legislação que impõe limites à oferta gratuita, reservando os canais que permitem tratamento de voz e de vídeo somente para as empresas autorizadas.
“Estamos discutindo parcerias com as empresas autorizadas para que prestem seus serviços por meio da infovia. A rede é destinada também às empresas, que não poderiam custear a implantação de uma rede como esta. As parcerias justificarão o aumento da taxa para até 1 Gbps, com o usuário pagando um pouco mais para ter isso”, argumenta o professor.
Independentemente das parcerias, a meta é chegar ao final do ano com 80% da infovia iluminando Pedreira. “Nesta área iluminada, todo cidadão poderá ter acesso à rede. E queremos que a população esteja integralmente atendida em 2008”.
Cartão cidadão Leonardo Mendes lembra que a Unicamp já desenvolveu muitas tecnologias e-Gov (ferramentas de governo eletrônico) em parcerias com municípios, sempre focando um modelo como a infovia municipal. “Até a execução deste projeto em Pedreira, não tínhamos um espaço para testar as tecnologias no contexto da rede”.
Agora, os pesquisadores concentram-se na construção da Plataforma Município Digital um conjunto de soluções para fazer com que a relação do cidadão com a prefeitura se dê totalmente através de um canal digital. “A pessoa acessará os serviços municipais por um portal autenticado, como fazem os clientes de banco, via internet”.
Para identificar o usuário na infovia, idealizou-se o “cartão cidadão”, que valerá para todos os serviços públicos. “Com a integração dos sistemas e o cartão cidadão, a distribuição de auxílios (medicamentos, bolsas, cestas básicas, etc) poderá ser cuidadosamente controlada, evitando que a prefeitura perca recursos com a retirada indevida de benefícios duplicados”.
Ainda na saúde, o cartão cidadão evitará uma situação incômoda e comum, que é a repetição de exames e procedimentos para pacientes cujo histórico não seja de conhecimento da equipe. Isto se dará através das informações contidas no cadastro de saúde, com todo o histórico de atendimento e prontuários do paciente. “Mesmo não conhecendo o usuário pessoalmente, o médico encontrará o histórico dele no sistema, continuando e não repetindo o tratamento”.
No fundo, o professor Leonardo Mendes vislumbra uma cidade digital, estruturada sobre os cadastros integrados de todos os serviços prontuários, matrículas escolares, escrituras, fichas de emprego. “Vejo uma espécie de cartório virtual, que possibilitaria um serviço de altíssima qualidade, armazenando e provendo a comunidade de informações autenticadas em todos os níveis”.
Cenário futuro Dentro da infra-estrutura montada para Pedreira, a equipe da Unicamp já está desenvolvendo um sistema de distribuição de vídeos que vai atender principalmente às escolas, onde as crianças contarão com ambientes multimídia para aprender e produzir conhecimento nesta linguagem.
Os pesquisadores também prometem reduzir os gastos da prefeitura com operação e manutenção de equipamentos de rede. “Vamos trocar as máquinas atuais por outras de custo bem menor, mas com alta capacidade de processamento. É uma tecnologia chamada Multimídia Center, cuja patente já solicitamos”.
A rede de alta velocidade permite que o professor anuncie ainda a construção de modelos da tevê via internet (IPTV), que tem no YouTube experiência de distribuição de vídeos um exemplo promissor. “A infonia promete produtos mais sofisticados, como filmes, canais a cabo e mesmo a TV digital, que nem entrou no ar mas já poderíamos oferecê-la”.
Sistemas de controle do trânsito e de identificação de veículos, câmeras de vigilância em locais públicos e todo um leque de serviços privados compõem o cenário futuro, que em Pedreira está bem próximo. “A infovia não é apenas um ambiente da internet, é um ambiente de construção da cidade inteligente. Obviamente que ainda não temos todas as soluções e há muito a fazer. Mas podemos afirmar que este modelo é o caminho”.
Soluções de alta capacidade
A Infovia Municipal não é o único modelo de redes de comunicação, havendo projetos semelhantes no Brasil e no exterior. O professor Leonardo Mendes afirma, no entanto, que a infovia é o projeto voltado para comunidades que utiliza uma infra-estrutura robusta e de primeira linha, equivalente à das grandes de redes de telefonia e de transmissão de canais de tevê.
“Os projetos para municípios geralmente estão focados na construção de redes sem fio (wireless). Elas são consideradas de segunda categoria, pois apresentam muitas limitações de alcance, velocidade e oferta de serviços. Já a infovia leva serviços de qualidade e transmissão de dados em altíssimas taxas, tudo por meio de uma única tomada na parede”.
Mendes ressalta ainda que a infovia é uma rede híbrida, que não se baseia apenas na fibra óptica, oferecendo acesso também por rádio em alta velocidade. A questão é que atualmente predominam os conceitos de wireless e de Fiber to the Home (a fibra levada até a porta da casa do usuário), o último adotado em cidades como Paris e Tóquio.
O professor da Unicamp vê o cidadão como consumidor e gerador de altas taxas de informação, e que por isso deve contar com soluções de alta capacidade. “O nosso conceito é de Fiber to the Curb, a fibra até a esquina ou a calçada. Dali até a casa do cidadão, a distribuição pode se dar de várias maneiras”, esclarece o docente. Assim, uma residência terá um link de rádio e eventualmente com um cabo coaxial; já uma indústria precisará de um link de fibra óptica.
Apesar de melhor servidos com infra-estrutura de comunicações, os ditos países desenvolvidos também vêm repensando seu modelo de negócios em comunicações, visto que a diversidade de tecnologias está gerando um emaranhado de redes implantadas por diferentes empresas de serviços. “É muito mais razoável investir em uma única rede a ser compartilhada por poder público, consumidores e empresas. Este é o modelo da infovia”.
Outras cidades Leonardo Mendes informa que cidades como Amparo, Campinas, Jaguariúna, São José do Rio Preto e Penápolis manifestaram interesse pelo Projeto de Infovia Municipal. Entretanto, ele destaca um projeto já elaborado para Capão Redondo, na Grande São Paulo, uma região bastante carente e populosa, com 200 mil habitantes.
“Estamos ajudando a comunidade a buscar financiamento, inclusive no exterior. Implantamos o projeto de Pedreira com recursos de programas federais, que não fazem distinção quanto ao tamanho do município, e que são insuficientes para Capão Redondo. É uma região que apresenta desafios que queremos enfrentar”, admite o pesquisador.
O projeto piloto da infovia foi concebido em Morungaba há quatro anos, mas ele não teve continuidade devido a uma troca de governo. “Isto não vai se repetir em Pedreira, onde frutos já estão surgindo, e a tendência é de rápido aumento da demanda por projetos desta natureza”.
O mais importante, segundo o professor, é que a Unicamp já cumpriu seu papel de desenvolver e provar o conceito à sociedade. “A infovia é uma rede cujo controle está nas mãos da comunidade com seus interesses gerais, e não de empresas com seus interesses específicos. Ao invés de esperar o mercado atender à sua demanda, a sociedade agora tem como construir sua própria solução e convidar o mercado a participar dela”.