| Edições Anteriores | Sala de Imprensa | Versão em PDF | Portal Unicamp | Assine o JU | Edição 362 - 18 a 24 de junho de 2007
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Grupo desenvolve extrato fitoterápico

ÁLVARO KASSAB

O médico Alexandre Eduardo Nowill (à esquerda), a química Carmen Lucia Queiroga e o farmacêutico Gilberto Carlos Júnior, três dos quatro autores da patente, no Cipoi: resultados promissores (Fotos: Antoninho Perri/Divulgação)Um estudo envolvendo pesquisadores de diferentes áreas da Unicamp chegou à obtenção de um extrato fitoterápico retirado da planta Bidens alba. Em testes preliminares, realizados in vitro, grupos químicos separados do extrato mostraram eficiência quando submetidos a três linhagens de carcinoma e a cinco tipos de leucemia. O processo de obtenção da composição fitoterápica teve a patente internacional depositada em dezembro de 2006.

Os autores são o médico Alexandre Eduardo Nowill, a química Carmen Lucia Queiroga, o farmacêutico Gilberto Carlos Franchi Júnior e a botânica Maria Tereza Grombone Guaratini. Atualmente, as pesquisas vêm sendo conduzidas por cientistas do Centro Integrado de Pesquisas Onco-Hematológicas da Infância (Cipoi), em parceria com o Centro Pluridisciplinar de Pesquisas Químicas, Biológicas e Agrícolas (CPQBA).

Segundo o farmacêutico Gilberto Carlos Franchi Júnior, do Cipoi, as pesquisas tiveram origem em 2000, quando a botânica Maria Tereza Grombone Guaratini desenvolvia seu trabalho de pós-doutorado no âmbito do programa Biota, financiado pela Fapesp. Seu foco eram os componentes genéticos do picão-preto (Bidens pilosa), planta também conhecida por infestar grandes extensões da cultura de soja.

Em seus estudos sobre a variabilidade genética da planta, informa Franchi, a bióloga constatou a existência de três tipos de picão-preto – duas bastante conhecidas, ambas da espécie Bidens pilosa, e uma terceira, a Bidens alba, planta originária do México e encontrada no país apenas em uma pequena faixa do litoral paulista – especula-se que tenha chegado a bordo de embarcações.

Folha de Bidens alba: substâncias químicas abundantesSe de um lado as menções na literatura internacional sobre a ação antimicrobiana e antiulcerogênica das espécies Bidens pilosa eram fartas, por outro, a pesquisadora não havia encontrado nenhuma referência acerca da Bidens alba. Ademais, Maria Tereza sabia que o picão-preto é usado popularmente para aplacar dores musculares e outras finalidades, tanto na forma de emplastro quanto ingerido como chá.

“Maria Tereza é uma profunda conhecedora de pragas agrícolas. Logo descobriu que havia ali um material inédito de pesquisa. Constatou, por exemplo, que a Bidens alba era geneticamente diferente das demais espécies da família. Descobriu também que a planta possuía composições químicas que ainda não haviam sido descritas”, testemunha Franchi.

Disposta a ir além da tradição oral, a botânica enviou amostras do extrato de Bidens alba ao Instituto de Biociências da Unesp de Botucatu, onde constatou-se, por meio de testes em camundongos coordenados pela professora Clélia Akiko Hiruma Lima, que o material retirado da planta funcionava como protetor da mucosa gástrica, podendo vir a ser utilizado no tratamento de úlcera. O sucesso das pesquisas originou o primeiro depósito de patente do extrato, feito pela Agência de Inovação Inova Unicamp em 2004.

Outras aplicações – Começa aí, de acordo com Franchi, a “internacionalização” da patente. Querendo saber se a Bidens alba possuía propriedades anticancerígenas, a botânica enviou, no início de 2005, amostras do extrato ao Cipoi, centro voltado para o desenvolvimento de pesquisa básica e aplicada na área de onco-hematologia. A patente começava a ser escrita.

Os trabalhos foram abertos em duas frentes. Como o extrato estava dividido em 73 frações – e tornava-se inviável conhecer a composição química de cada uma delas –, foram selecionadas algumas para os primeiros testes. Coube à pesquisadora Carmen Lúcia Queiroga, do CPQBA, a tarefa de empreender a separação química.

Depois da operação, teve início a segunda etapa: as amostras passaram a ser analisadas pelo próprio Franchi e pelo médico Alexandre Eduardo Nowill, coordenador adjunto do Cipoi. Ambos ficaram surpresos com os primeiros resultados. Decidiram tocar adiante o projeto, com a devida autorização de Maria Tereza.

“Fizemos testes in vitro para cinco tipos de leucemia e para três tipos de adenocarcinoma [câncer] – de próstata, de ovário e de mama. Em todas as investigações, as frações selecionadas se mostraram eficazes, inibindo o crescimento das linhagens oncológicas” revela Franchi.

As tarefas foram facilitadas, prossegue Franchi, pelos equipamentos de ponta de que dispõe o Cipoi. Dois robôs, por exemplo, colocam as células sobre a droga, diluem o extrato e promovem a leitura das placas de cultura, entre outras tarefas. “Isso garante maior confiabilidade e agilidade aos procedimentos”. Segundo o farmacêutico, o centro tem capacidade de analisar até sete concentrações diferentes de 80 drogas diariamente. “Nosso ritmo de screening é muito rápido”.

Os pesquisadores do Cipoi e do CPQBA estão agora repetindo o “desmonte” das frações químicas da droga. “A equipe faz uma série de testes in vitro até chegar na fração química responsável pelo efeito”, revela Franchi

“Estamos refinando os aspectos químicos”, esclarece o pesquisador que, juntamente com Alexandre Nowill, coordenou as pesquisas. O Cipoi trabalha em parceria com o Centro Infantil Boldrini e com outros 13 pesquisadores de diferentes centros, institutos e faculdades da Unicamp e de outras universidades brasileiras.

A próxima etapa, após a localização do composto químico responsável pelo efeito, consistirá em testar o fármaco in vivo. “Invariavelmente, quimioterápicos comerciais, investigados in vitro, apresentaram resultados promissores quando testados em animais. Esperamos que, após a obtenção do produto químico, tenhamos o mesmo sucesso”, afirma o farmacêutico.

Na opinião de Franchi, as perspectivas para o desenvolvimento de fármacos à base do extrato de Bidens alba são “muito boas”, embora ressalte que ainda há “um longo caminho” a ser trilhado até que se chegue a um composto final. “Muitos quimioterápicos utilizados atualmente em diversas neoplasias são derivados de plantas naturais”, compara.

O pesquisador observa que a planta Bidens alba é da família das Asteraceae. Substâncias químicas são particularmente abundantes em algumas famílias de dicotiledôneas. Algumas das inúmeras espécies de plantas da família das Asteraceae já tiveram seus compostos fitoterápicos estudados, e a sua atividade farmacológica comprovada in vitro e in vivo, como no caso da arnica. Estudos farmacológicos e fitoquímicos realizados em outras espécies do gênero Bidens, entre as quais, a Bidens pilosa, têm demonstrado que diferentes extratos apresentaram inúmeras atividades.

Segundo o pesquisador, a Bidens alba é uma erva que pode atingir 1,5 metro de altura, tem o caule ereto e quadrangular, e apresenta muitas folhas grandes. Seu ciclo de vida é de aproximadamente dois anos, tempo considerado pelo farmacêutico como ideal para o agronegócio. “Infelizmente, não temos a planta em abundância no país, mas esse problema pode ser solucionado a partir de estudos agrotecnológicos”, pondera.

O pesquisador acredita que o fato de a patente internacional ter sido registrada é fundamental para o avanço das investigações. “Todo pesquisador que busca resultados, busca também parcerias. Sem elas, fica muito difícil chegar a definições concretas”. Nesse aspecto, avalia Franchi, a patente tem a dupla vantagem de atrair a indústria e de salvaguardar a invenção. No âmbito do registro internacional, acredita o cientista, as garantias são certas. “Os laboratórios dispõem de mecanismos que zelam pela invenção”.

Ademais, acredita Franchi, cabe à universidade a produção do conhecimento e da pesquisa. As empresas, prossegue o cientista, ficam incumbidas de desenvolver o produto final. “No caso da nossa pesquisa, por exemplo, apenas a indústria farmacêutica poderia finalizar o medicamentos à base da planta. Essa parceria é fundamental. (A.K.)

Inova faz a gestão da propriedade intelectual

VANESSA SENSATO
Especial para o JU

Vera Crósta: apoio aos pesquisadores (Foto: Divulgação) O pesquisador da Unicamp que tem uma pesquisa a ser patenteada pode procurar a Agência de Inovação Inova Unicamp, que é o núcleo de inovação tecnológica da Universidade. A Agência faz a gestão da propriedade intelectual da Unicamp, oferecendo aos pesquisadores o apoio necessário para a busca e redação de patentes e outras formas de proteção dos resultados de sua pesquisa.

Por ano, a Inova faz cerca de 60 depósitos de patentes no Instituto Nacional de Propriedade Industrial (Inpi), dentre as quais, cerca de 12 são depositadas no exterior. Atualmente, em vigor, a Universidade possui 14 tecnologias protegidas internacionalmente, com 38 desdobramentos em diversos países. Cada desdobramento, em linhas gerais, representa um pedido de proteção em um mercado diferente.

De acordo com Vera Crósta, agente de Parcerias da Inova Unicamp, o patenteamento das tecnologias possibilita a sua transferência para a indústria. No caso de empresas internacionais, o pedido é levado à escala internacional através do PCT, o Patent Cooperation Treaty, que se refere ao tratado de cooperação em matéria de patentes, com a finalidade de facilitar a obtenção de proteção para tecnologias em qualquer dos países signatários do tratado, que são atualmente 137 em todo o mundo.

Vera explica que o PCT permite a solicitação para proteção patentária em vários países porque o titular ganha um maior prazo para definir em quais países a tecnologia deve ser protegida. “Após o depósito do PCT, a tecnologia está protegida em todos os países signatários do tratado e o titular da patente tem 18 meses para escolher os mercados mais interessantes”, afirma. Segundo Vera, este processo dá mais tranqüilidade para a tomada de decisão e evita maiores custos, já que o depósito da patente custa em torno de dois mil dólares por país.

A agente de Parcerias comenta que esta decisão também é apoiada porque durante o processamento do PCT é feita uma avaliação da patente, por meio de um documento chamado writting opinion, que é um balizador da tecnologia em questão. “O documento contém não só o resultado da busca de anterioridade, mas também um relatório sobre a inventividade e apelo mercadológico da tecnologia”, conclui.

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