MANUEL ALVES FILHO
Uma técnica inovadora para o tratamento da síndrome da bexiga hiperativa, problema que atinge perto de 15% de homens e mulheres com idade acima de 50 anos, está sendo testada por equipe da disciplina de Urologia da Faculdade de Ciências Médicas (FCM) da Unicamp. O procedimento consiste no implante de eletrodo no corpo do paciente (terceira raiz sacra), cuja função é estimular eletricamente o nervo que controla a bexiga. O dispositivo está conectado a uma fonte de energia, semelhante a um marca-passo, que modula os impulsos e, conseqüentemente, o funcionamento adequado do órgão. De acordo com o urologista Carlos D’Ancona, a neuromodulação, como a tecnologia é conhecida, foi aplicada com sucesso em uma paciente de 47 anos. Outros dois pacientes estão sendo preparados para também utilizar o novo método.
Eletrodo é implantado no corpo do paciente
A síndrome da bexiga hiperativa é caracterizada pela urgência miccional, que pode ser entendida como a vontade súbita de urinar e difícil de postergar. A prevalência dessa disfunção entre a população é considerada alta. Dados da literatura indicam que cerca de 33 milhões de pessoas nos Estados Unidos e 22 milhões na Europa sofrem do problema. Conforme o urologista Carlos D’Ancona, a síndrome traz conseqüências negativas para a qualidade de vida dos pacientes, que tendem a se isolar socialmente. “Isso é compreensível, visto que algumas pessoas chegam a urinar até 20 vezes ao dia. Ou seja, elas não conseguem ir ao cinema e assistir a um filme com duas horas de duração sem deixar a sala de exibição para ir pelo menos duas vezes ao banheiro”, explica.
Os tratamentos convencionais incluem a administração de medicamentos, fisioterapia, injeção de toxina botulínica e, nos casos mais graves, cirurgia. Ocorre, porém, que esses procedimentos nem sempre são suficientes para corrigir o problema ou trazem conseqüências indesejáveis aos pacientes, inclusive do ponto de vista social. Metade das pessoas, calcula Carlos D’Ancona, abandona a terapia medicamentosa reclamando dos efeitos colaterais proporcionados pelos remédios, tais como boca seca, visão turva e constipação intestinal. “No caso da intervenção cirúrgica, que consiste na ampliação da bexiga por meio da reconstrução do órgão com alça intestinal, é preciso levar em conta não apenas o custo do procedimento, mas também o custo do afastamento do paciente das suas atividades cotidianas, inclusive as de ordem profissional”, destaca o urologista.
A alternativa a essas abordagens classificadas de “conservadoras”, defende o especialista da Unicamp, é a neuromodulação. O novo método, segundo Carlos D’Ancona, é menos invasivo que a cirurgia tradicional. O eletrodo é implantado no nervo sacral através da pele, com o auxílio de agulhas ou cânulas. O dispositivo está ligado a uma fonte que controla a intensidade e a freqüência dos impulsos elétricos. É por meio desses pequenos choques que o músculo da bexiga volta a se contrair de forma adequada, eliminando assim a urgência miccional. O urologista afirma que a bateria tem duração aproximada de dez anos. “A intensidade e a freqüência dos impulsos elétricos podem ser ajustadas no consultório médico, através de um programador de mão, que transmite as informações ao eletrodo via telemetria”, esclarece.
Segundo Carlos D’Ancona, pesquisas realizadas no exterior dão conta de que a neuromodulação tem alcançado um índice de sucesso em torno de 70% em relação aos pacientes que não responderam bem aos tratamentos convencionais. “Aqui na Unicamp, a tecnologia foi usada pela primeira vez, em maio último, em uma paciente de 47 anos. Até aqui, os resultados podem ser considerados excelentes. Em vez de urinar a cada hora, ela passou a urinar de três em três horas. Pelos seus relatos, essa mudança trouxe um ganho extraordinário para a sua vida social”, diz o professor da FCM.
Atualmente, prossegue o urologista, dois outros pacientes que apresentam síndrome da bexiga hiperativa estão sendo preparados para se submeterem à neuromodulação. Na opinião de Carlos D’Ancona, esse tratamento deve passar a ser empregado com mais freqüência futuramente, dado que tem se constituído como alternativa altamente eficaz aos métodos conservadores. O único inconveniente da nova tecnologia é o seu custo. Como o equipamento é importado, o preço da terapia gira em torno de R$ 60 mil. “Com o tempo, porém, a tendência é que esse custo caia e o tratamento passe a ser mais acessível aos pacientes”, prevê o professor da FCM.