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1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 As entrelinhas dos anúncios veiculados no mundial de futebol traziam preconceitos, superficialidade e alienação às pencas. Confira um trabalho que analisou muitos deles e verificou que, para as empresas e agências de publicidade, o estereótipo e o dinheiro vêm antes do amor pelo esporte Ao mesmo tempo em que os olhares dos torcedores brasileiros estavam fixos na tela da televisão, dois anos atrás, para assistir aos jogos da Seleção Brasileira na Copa da França, o antropólogo Édison L. Gastaldo fazia uma leitura diferenciada do evento que se transforma em unanimidade nacional. Controle remoto nas mãos, três vídeos ligados, pilhas e pilhas de jornais e revistas, Gastaldo queria sentir a Copa pelo vértice dos anúncios publicitários. "Eu li a publicidade da Copa com olhar antropológico", afirma, ao constatar que nesse processo pôde perceber a discriminação do negro e da mulher, a magia como instrumento de conquistas e o rebaixamento constante dos adversários do Brasil. Seu trabalho, "A nação e o anúncio a representação do brasileiro na publicidade da Copa do Mundo", apresentado em fevereiro, foi a primeira tese de doutorado em Multimeios do Instituto de Artes (IA) da Unicamp. Por quatro meses, 14 de março a 20 de julho de 98, antes e após a Copa vencida pela França que aconteceu de 10 de junho a 12 de julho , Édison Gastaldo catalogou 415 anúncios. Para cada peça organizou um fichário com descrição e palavras-chaves, passando num segundo momento a cruzar temas comuns. Com isso pôde construir pranchas com temas semelhantes. Paralelo a isso, percebeu ainda a predominância da temática da Copa no noticiário jornalístico em relação aos anúncios. Édison pensava antes de seu levantamento que a saturação dos veículos de mídia com a Copa se daria pela publicidade. Mas constatou que "nos principais telejornais a porcentagem de tempo dedicada à Copa é incomparavelmente maior que o tempo similar nos anúncios publicitários". Basta ver que, no dia do jogo do Brasil com a Holanda, dos 41 minutos do Jornal Nacional, da TV Globo, 39 falavam da vitória do Brasil e os demais informavam a previsão do tempo. De 9 minutos publicitários, três eram referentes à Copa. "Neste dia não aconteceu mais nada no Brasil, pelo menos segundo o Jornal Nacional", diz Gastaldo. Professor da Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos), com graduação em publicidade e mestrado em antropologia, ambos na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Édison destaca o papel da publicidade como construtora e veiculadora de representações sociais. A figura do menino pobre, negro e bom de bola é clássica e uma constante nos anúncios daquele período. Contrastando a isso, a torcida, vista pela publicidade, compunha-se em sua maioria de brancos. Quando mostrado, o negro estava em segundo plano, desfocado, semelhante ao que se via na figura da mulher, também rebaixada pela publicidade. "Sorte que no Brasil não existe controle de natalidade de craques", dizia um rodapé de jornal, veiculado pela Unimed. Já quando a publicidade mostrava a família como foco de algum anúncio, também o negro estava fora. A predominância era de brancos. Do mesmo modo, a mulher ficava num segundo plano ou compondo o cenário com alguma ação de serviço. "Só espero que a mamãe não traga o jantar agora", mostrava um anúncio da Nintendo em que apareciam pai e filho à frente da televisão. Ainda nesta questão de gênero, a mulher ficava quase fora de cena numa propaganda que ressaltava o fato de que "o Brasil torce na frente de uma Philips". No centro estavam quatro homens de braços erguidos e a mulher como figurante ao lado deles. "Religião, magia e orixás estavam a serviço da vitória na Copa", afirma o antropólogo gaúcho, que foi orientado em seu doutorado pelo professor Etienne Samain, do IA. A representação disso era clara: "Dê sorte para sua seleção. Borracha isola", apregoavam as sandálias havaianas, entre outros indicativos como usar arruda na orelha ou bater na madeira. Rebaixar o adversário, de forma pejorativa, foi outro recurso bastante usado nos comerciais da França. "Pela primeira vez os vikings vão pipocar", brincou a pipoca Yoki. "Venha ver a laranja sendo espremida" era uma provocação aos holandeses, assim como se saborearam as empanadas chilenas, o bacalhau da Noruega ou outros produtos. "Consumiu-se muita laranja antes do jogo da Holanda", relembra Gastaldo. Dentro do espírito da publicidade da Copa, Édison Gastaldo viajou em março para a Inglaterra, onde faz o pós-doutorado na Universidade de Manchester. Seu pano-de-fundo continua sendo a publicidade, mas agora vai trocar o futebol pela Olimpíada da Austrália. |
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