| Edições Anteriores | Sala de Imprensa | Versão em PDF | Enquete | Portal Unicamp | Assine o JU | Edição 213 - 19 a 25 de maio de 2003
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Complexo poderá ser implantado no
entorno da Universidade, abrigando empresas e centros de pesquisa

Parque tecnológico é o primeiro
projeto da Agência de Inovação da Unicamp


CLAYTON LEVY


A instalação de um novo parque tecnológico, que abrigará empresas e institutos de pesquisas voltados para inovação tecnológica, será o primeiro projeto a ser desenvolvido pela Agência de Inovação da Unicamp (Inovacamp). O anúncio foi feito pelo reitor Carlos Henrique de Brito Cruz, no último dia 15, durante o evento Campinas Inova, que reuniu cerca de 500 participantes no Centro de Convenções da universidade. O encontro, que debateu os caminhos para a inovação tecnológica no País, também marcou o lançamento oficial da agência, primeira do gênero no Brasil.

"Queremos incrementar a interação da universidade com a sociedade de forma organizada e estratégica", disse Brito Cruz ao definir a função da nova agência. Segundo ele, a Inovacamp será um setor onde empresas e órgãos públicos encontrarão apoio e informações para viabilizar sem embaraços seus projetos. "Com isso, também estaremos ampliando nossas atividades de ensino e pesquisa, porque professores, pesquisadores e estudantes estarão empenhados no desenvolvimento de projetos específicos", completa.

O primeiro projeto da Inovacamp, segundo Brito Cruz, consistirá em desenvolver um estudo de viabilidade econômica e plano de investimentos necessários para a instalação do novo parque tecnológico. Para isso, já conta com financiamento no valor de R$ 2,8 milhões. Os recursos virão do governo federal, através da Financiadora de Estudos e Projetos (R$ 1,3 milhâo); governo estadual (R$ 1,2 milhão); e administração municipal (R$ 300 mil). reitor. O prazo para conclusão do estudo é de dois anos.

O parque está previsto para ocupar uma área de sete milhões de metros quadrados no entorno da Unicamp e próximo de outros centros de pesquisa, como o Laboratório Nacional de Luz Sincrotron (LNLS); Centro de Pesquisa e Desenvolvimento (CPqD); e Núcleo de Bioinformática da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa). A região também já abriga diversas empresas de base tecnológica, entre elas a ABC Xtal, pioneira na produção de fibra ótica nacional, e a AsGa, maior fabricante de equipamentos para comunicações óticas do país. Para Brito Cruz, porém, esse é apenas o primeiro de uma série de estudos que a agência deverá desenvolver nas mais diversas áreas do conhecimento.

Um grupo de trabalho encarregado de planejar a agência, identificou várias áreas onde será possível estabelecer parcerias importantes. "A idéia é desenvolver programas para tratar estas atividades de maneira mais profissional", explica o reitor. O grupo é coordenado pelo professor do Instituto de Economia e secretário executivo do Ministério da Ciência e Tecnologia no governo FHC, Carlos Américo Pacheco. Além de desenvolver projetos voltados para a inovação tecnológica, a agência também realizará estudos voltados para parcerias no setor de políticas públicas.

Para realizar as parcerias, a agência adotará o conceito norte-americano de one stop shop, uma espécie de Poupatempo no campus, onde o interessado poderá encontrar todas as informações necessárias e agilizar os procedimentos num único local. "Ele não ficará circulando de um lugar para outro em busca de orientação", garante Brito Cruz. Segundo ele, a agência será capaz de montar a estratégia de cooperação num só lugar, mesmo que a parceria envolva outros órgãos da universidade. "A agência não terá papel centralizador, mas fará a ligação entre os setores envolvidos", explica.

Parcerias - Outro programa importante, segundo o reitor, é o de parcerias estratégicas. Nesse caso, o objetivo será intensificar a cooperação junto a empresas com as quais a universidade já se relaciona. Entre elas, a Petrobrás, Embraer, Itautec e a a TMS Sigma Farma. "Nós já fazemos isso, mas queremos atuar de maneira mais profissional", diz. "Para isso, estamos adotando algumas iniciativas, como a realização de workshops, seminários de um dia, nos quais reunimos pesquisadores das empresas e da Unicamp e eles identificam temas nos quais possam trabalhar conjuntamente".

A agência também terá um programa destacado na área de propriedade intelectual, setor em que a Unicamp tem sido muito bem sucedida. "Somos a universidade brasileira com maior número de patentes registradas", diz Brito Cruz. Segundo ele, além de ampliar a capacidade da instituição em registrar propriedade intelectual, a agência trabalhará para agilizar o licenciamento das patentes. "Sem isso, a patente é só um item de despesa e não de receita", destaca. Nessa mesma linha a unidade também desenvolverá ações para incrementar o programa de incubadora de empresas. Atualmente, oito empresas estão abrigadas na Incubadora da Unicamp (Incamp).

Em outra frente de atuação, a agência de inovação trabalhará para aumentar a capacidade da Unicamp em usar os fundos setoriais para financiamento de projetos de pesquisa. "A agência não buscará diretamente os recursos mas ajudará os interessados em consegui-los", explica Brito Cruz. O reitor lembra que há agências de fomento nas quais o pesquisador tem de buscar o dinheiro individualmente e outras onde a busca tem de ser feita pela instituição. "Vamos cooperar nas duas linhas, preparando os projetos que serão submetidos aos órgãos financiadores", explica.

Para Brito Cruz, a criação da agência coincide com um momento favorável à iniciativa. "A idéia sobre o valor da inovação tecnológica está se disseminando rapidamente na sociedade brasileira", diz ele. "Tanto no âmbito do poder público como no setor privado, observa-se um interesse crescente nesse tema e portanto naquilo que a agência poderá realizar", completa. Segundo ele, há iniciativas similares em universidades estrangeiras, mas no Brasil o projeto é inédito. Segundo o reitor, a agência poderá até gerar receita extra, mas o objetivo principal é aumentar e melhorar as atividades de avanço do conhecimento e de ensino. "Não se pode perder isso de vista", conclui.


O exemplo que vem de Toronto

Morando há vinte anos no exterior, onde concluiu os cursos de mestrado e doutorado na área de física, o brasileiro Fábio de Almeida ocupa atualmente o cargo de diretor da Fundação de Inovação Tecnológica da Universidade de Toronto, no Canadá. Misturando os sotaques mineiro (ele é natural de Belo Horizonte) e norte-americano, ele diz que nos últimos 20 anos está se consolidando nas universidades do mundo inteiro uma certa tendência em ampliar seu leque de atividades para o lado do empreendedorismo. Para ele, isso não quer dizer que a academia esteja abandonando sua principal função, aquela de formar cérebros e gerar conhecimento. Significa, apenas, que o mundo acadêmico está encontrando outras maneiras de contribuir com a sociedade. Em entrevista ao Jornal da Unicamp, Almeida, que participou do Campinas Inova 2003, detalhou a atuação da Agência de Inovação canadense.

JU - Quais as políticas básicas para o funcionamento da Fundação?
Almeida - A universidade tem um sistema misto. O inventor que atua na universidade pode pedir a propriedade intelectual de sua invenção mas tem de dar à universidade 25% dos lucros. Esse professor não é obrigado a comercializar seu produto através da fundação, mas como esta é a melhor opção, a maior parte das invenções acaba sendo encaminhada para nós.

JU - Como a fundação avalia os inventos desenvolvidos pelos pesquisadores?
Almeida - A avaliação inclui quatro aspectos principais. O primeiro é o aspecto pessoal. Uma das coisas mais importantes no processo de transferência de tecnologia é a química entre o professor-inventor e o proprietário da empresa que irá licenciar o produto. O segundo fator é o científico e tecnológico, ou seja, a invenção tem de funcionar. O terceiro fator está ligado ao marketing e o quarto à propriedade intelectual. Se o projeto é aprovado, é feito um contrato por dois anos e a fundação assume os custos do patenteamento e passa a trabalhar para o pesquisador numa estratégia para licenciar o produto ou abrir uma empresa que irá produzi-lo.

JU - Não há risco para o pesquisador?
Almeida - O pesquisador não tem risco algum. É uma parceria na qual a fundação assume todos os riscos. Se dentro de dois anos a fundação não conseguir promover essa tecnologia, o inventor tem o direito de receber de volta as patentes sem dever nada à fundação.

JU - Quando o empreendimento dá certo, como são divididos os lucros?
Almeida - Assim que a invenção foi avaliada e aceita ela se torna um projeto. Nesse momento, há um acordo negociado entre o inventor e a fundação. Se a idéia, por exemplo, é muito nova, a divisão dos lucros gira em torno de 50% para cada parte. Se a empresa que nasce de uma pesquisa atingir um certo nível no mercado, a fundação também tem direito de comprar ações da companhia a preços mais baixos, negociados de antemão. Esses contratos são muito bem feitos. Mas a fundação faz tudo, desde o registro das patentes até a interação com empresas potencialmente interessadas, plano de marketing, plano de negócios, sem nenhum custo para o inventor.

JU - Desde a sua última reestruturação, há quatro anos, quantos projetos já passaram pela fundação?
Almeida - Há quatro anos a média era de seis projetos por ano. Atualmente são 180 por ano. Nós temos de avaliar todos os aspectos e decidir como encaminhar cada caso.

JU - Desses 180 quantos se transformam realmente em novos negócios?
Almeida - Normalmente uma em cada quatro invenções não é aceita para ir adiante. Os demais seguem para as outras fases, mas não de maneira uniforme. Às vezes há dificuldades na parte de financiamento, outras vezes na área de marketing. Há algumas características que definem a forma de comercialização da invenção. Se, por exemplo, for uma invenção de plataforma, que pode sustentar várias outras tecnologias, então pode-se pensar em abrir uma companhia. Mas se o projeto é do tipo verticalizado, que não pode sustentar outras tecnologias, então o caminho mais indicado é o licenciamento. Atualmente, cerca de um em cada dez projetos tem potencial para gerar uma companhia nova.

JU - Como é a estrutura da fundação em termos técnicos?
Almeida - Nós temos assessorias jurídica, financeira e de contabilidade. Mas a parte que desenvolve os projetos é composta por acadêmicos e está dividida em três áreas. Uma área de ciências da vida; outra de engenharia e ciências físicas; e uma terceira área voltada para formação de tecnologia. Atualmente nossa estrutura está sobrecarregada porque tem havido um crescimento de 50% ao ano no volume de projetos novos.

JU - Em sua opinião, a iniciativa de criar uma agência de inovação ligada a uma universidade pública é um bom caminho para ajudar no processo de inovação tecnológica num país como o Brasil?
Almeida - De um modo geral, as universidades do mundo inteiro são conservadoras. A formação acadêmica consolidou essa tradição de formação científica. Existe uma certa tendência de se pensar que o conhecimento gerado na universidade é algo muito puro e que a sua aplicação tecnológica significaria uma espécie de mancha no contexto acadêmico. É indiscutível que a principal função da universidade é gerar conhecimento. Mas também é inegável que de uns tempos para cá está havendo uma certa tendência ao empreendedorismo, que deve ser compreendido como um retorno que a universidade dá à sociedade. Isso é feito através do próprio ensino, mas também pode ser feito através da ampliação do impacto que a produção científica pode provocar na sociedade.

JU - Estaria havendo uma mudança de paradigma?
Almeida - A universidade teve nos últimos tempos um raciocínio na base do "ou publica ou perece". Esta é uma mensagem negativa. Chamo a esta mensagem de dois "pês". Nós precisamos trocar esta mensagem pelo modelo dos três "pês", que são "patenteie, publique e prospere", nessa ordem. Trata-se de uma mensagem positiva. Queremos que o pesquisador, antes de publicar um trabalho, consulte a fundação para saber se o seu trabalho não poderia ter um impacto na sociedade muito maior do que a sua simples publicação. Normalmente, o cientista escreve em publicações científicas para outros cientistas. Mas quando se desenvolve um produto que pode melhorar a qualidade de vidas das pessoas, então o impacto é muito maior. (C.L.)

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