| |
3
Parlamentares acreditam que projeto deve ser votado
ainda este ano; próxima etapa será de debates e análises
Lei de Inovação
volta à pauta na Câmara
CLAYTON LEVY
Apesar da sucessão de medidas provisórias que estão trancando a pauta da Câmara dos Deputados, parlamentares ligados à Comissão de Ciência e Tecnologia acreditam que a Lei de Inovação poderá ser votada ainda este ano. Até quinta-feira passada, porém, o projeto assinado no dia 28 de abril pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ainda não havia chegado à Mesa da Câmara. O texto é um dos pilares da Política Industrial, Tecnológica e de Comércio Exterior anunciada pelo atual governo, que incluiu ainda a criação do Conselho Nacional de Desenvolvimento Industrial (CNDI) e da Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial, anunciadas juntamente com a Lei de Inovação.
Debates erão feitos em audiências públicas
Após ser recebido pela Mesa da Câmara, o projeto deverá ser enviado à Comissão de Ciência e Tecnologia, que iniciará a etapa de análises e debates visando definir a formatação final do texto antes de remetê-lo à votação. "Se o Executivo fizer a recomendação de urgência, acredito na possibilidade de votá-lo ainda este ano", disse ao Jornal da Unicamp o presidente da Comissão de Ciência e Tecnologia na Câmara, deputado Gilberto Kassab (PFL-SP). Segundo o deputado federal Jamil Murad (PC do B-SP), que também integra a Comissão, o debate será feito com a comunidade científica através de audiências públicas.
"Se houver necessidade, faremos mudanças", disse Murad. O parlamentar, que vem se destacando como um dos principais articuladores para a aprovação da Lei de Inovação, adiantou que alguns aspectos do texto precisam ser aprimorados, mas não quis revelar detalhes. "Seguramente teremos de debater com a comunidade científica para aproximar o máximo possível dos anseios da sociedade", afirmou. Segundo Murad, as audiências públicas serão feitas em Brasília e nos estados. "Precisamos votar o texto ainda esse ano", destacou.
Para o reitor da Unicamp, Carlos Henrique de Brito Cruz, a Lei é uma boa iniciativa para estimular a inovação no Brasil. Segundo ele, a iniciativa cria facilidades para o licenciamento de propriedade intelectual por organizações públicas e estimula o estado brasileiro a apoiar atividades de pesquisa e desenvolvimento (P&D) em empresas. Para Brito Cruz, a Lei ajuda, e as iniciativas inscritas no âmbito da Política Industrial recentemente anunciada também são importantes contribuições.
"A Lei e a Política Industrial reconhecem, corretamente, que o lugar da inovação tecnológica é a empresa e que é a empresa o dínamo da inovação", diz o reitor. "Politicamente talvez o mais relevante seja o fato de termos os ministérios da Ciência e Tecnologia, do Desenvolvimento Industrial e Comércio Exterior e o da Fazenda associados na empreitada", destaca. Em sua opinião, serão necessárias várias iniciativas deste calibre para que as empresas possam realmente inovar tecnologicamente. "Por exemplo, já é mais do que hora de o Brasil tratar do uso do poder de compra do estado como instrumento para viabilizar desenvolvimento tecnológico e competitividade."
A primeira versão da Lei de Inovação foi apresenta há dois anos pelo governo do presidente Fernando Henrique Cardoso. Um de seus principais objetivos era corrigir o equívoco cultural que atribui às universidades toda a responsabilidade pela inovação, enquanto as empresas se limitam a incorporar (quando incorporam), em suas linhas de produção, o resultado, já pronto, do trabalho desenvolvido por cientistas. Essa primeira versão chegou a ser enviada ao Congresso Nacional, mas foi retirada da pauta pelo governo Lula, que decidiu rever o texto e apresentar uma nova versão.
O novo texto traz pelo menos duas novidades importantes. Em seu penúltimo artigo (26), determina que o Poder Executivo encaminhará ao Congresso Nacional, no prazo de 90 dias contados da publicação Lei, projeto de lei que estabeleça um novo regime fiscal para incentivar as empresas a investirem em P&D. Outra modificação que representa um avanço diz respeito à dispensa de licitação para o licenciamento de patentes e transferência de tecnologias desenvolvidas pelos institutos públicos de pesquisa. No novo projeto de lei, não há mais necessidade de seguir a Lei de Licitação (8.666) para a transferência de inovação ao setor privado.
No capítulo 2, que trata do estímulo à construção de ambientes especializados e cooperativos de inovação, a Lei também facilita o trabalho das empresas ao permitir a utilização, para fins de pesquisa, de laboratórios, equipamentos, instrumentos, materiais e demais instalações das instituições científicas. Essa utilização, segundo o texto, ocorrerá por prazo determinado, mediante remuneração adequada, contrapartida ou participação nos resultados, desde que tal permissão não interfira diretamente na atividade-fim das instituições científicas.
O projeto também faculta às instituições científicas celebrar contratos de transferência de tecnologia e de licenciamento para outorga de direito de uso ou de exploração de criação protegida. Segundo o texto, os contratos sem exclusividade (feito para várias empresas), poderão ser firmados diretamente entre o instituto de pesquisa e as empresas. Já os contratos de exclusividade deverão ser precedidos de chamada pública.
A Lei autoriza também a concessão de recursos diretos para a empresa, seja sob a forma de subvenção econômica, financiamento ou participação societária, desde que os projetos visem a inovação. A empresa é obrigada a dar uma contrapartida, no caso de subvenção. Atualmente, o dinheiro para P&D que pode ser aplicado em projetos de empresa vem dos fundos setoriais, que teoricamente obriga a ter sempre a participação de uma empresa. Na prática, porém, a verba é destinada ao pesquisador.
Para os pesquisadores envolvidos em pesquisa colaborativa é assegurada participação nos ganhos econômicos da instituição científica e tecnológica resultantes de contratos de transferência de tecnologia ou exploração de criação protegida da qual tenham sido inventor. O valor é limitado a um terço do total dos ganhos. Está previsto ainda que possam receber um adicional diretamente da instituição, não tendo mais que passar, por exemplo, pelas fundações. Além disso, a Lei estabelece a criação de uma bolsa de estímulo à inovação, uma forma encontrada pelo governo de estimular os pesquisadores a trabalharem em parceria com empresas. A bolsa seria financiada pela instituição de apoio ou agência de fomento. O pesquisador poderá também obter licença para se tornar empreendedor.
Prós e contras
|
Carlos Américo Pacheco, secretário executivo do MCT durante o governo FHC e professor do Instituto de Economia da Unicamp. |
Roberto Lotufo, diretor de parcerias e projetos colaborativos da Agência de Inovação da Unicamp. |
Sandra Brisolla, professora do Departamento de Política Científica e Tecnológica do Instituto de Geociências da Unicamp. |
Renato Dagnino, professor do Departamento de Política Científica e Tecnológica do Instituto de Geociências da Unicamp. |
O texto é importante, mas demorou a sair. Em determinados aspectos apresenta alguns avanços em relação à versão anterior e, em outros, o primeiro texto é melhor. O importante agora é que seja votado rapidamente pelo Congresso. Um dos principais avanços dessa nova versão é a dispensa de licitação na comercialização da propriedade intelectual e, no caso das instituições federais, autorização para que pesquisadores possam receber remuneração pecuniária por prestação de serviço. Infelizmente foram tirados da lei alguns mecanismos de incentivo à mobilidade, de flexibilização da gestão das instituições federais. Além disso, na redação da lei, em alguns artigos, falta um detalhamento que constava no texto anterior, que explicava melhor a razão da lei. Mas acredito que o próprio relator, durante o trâmite no Congresso, poderá fazer algumas alterações para facilitar o entendimento da lei. O fundamental é não perder mais tempo e votar.
|
A Lei de Inovação está sendo esperada há mais de um ano e acredito que ela vai ajudar muito no relacionamento universidade-empresa. É sabido que boa parte da tecnologia brasileira é desenvolvida nas universidades e centros de pesquisa, e é importante que este pólo seja deslocado de modo que a tecnologia seja desenvolvida primordialmente nas empresas. A lei vai neste sentido.O Capítulo III da lei vem também esclarecer vários aspectos do estímulo da universidade no processo de inovação que necessariamente envolve as empresas. A lei discute gestão da propriedade intelectual, contratos de transferência de tecnologia e licenciamentos, direitos dos pesquisadores, entre outros. A própria Agência de Inovação é tratada pela lei como órgão responsável pela gestão da propriedade intelectual da universidade. A Agência de Inovação está bastante alinhada com o espírito da lei. Para que uma lei deste teor tenha sucesso é necessário que ela seja praticada e acredito que a Unicamp tem todas as condições de incentivar a inovação no Brasil.
|
Ao estabelecer, no artigo 15, que o afastamento com vencimentos e demais vantagens da função deverá observar "a conveniência da ICT de origem" não fica suficientemente claro como essa conveniência será preservada ou avaliada. Essa faculdade de afastamento do docente pode afetar as atividades da ICT e, não sendo assegurada a reposição do pesquisador pelo tempo de seu afastamento o que exigiria recursos extras, uma vez que o afastamento é com vencimentos e demais vantagens, não vejo como resolver essa questão, a menos que se parta do princípio de que sobram pesquisadores nessas ICT, o que não é verdade. Se de início o número de pesquisadores afastados pode ser pequeno, o que a Lei quer provocar é um aumento importante da dedicação desse pessoal a atividades de inovação, o que é desejável, mas deve ser feito com o cuidado para não prejudicar o excelente trabalho de pesquisa e docência do setor público de pesquisa no país.
|
Se fosse apenas um "pesquisador público", como me classifica a Lei, agradeceria aos que, apoiando-se no senso comum ainda dominante na sociedade brasileira, me concederam os privilégios corporativos que faculta.Como sou nacionalista, estranharia que apesar de conceituar uma dezena de termos que refere não se dê ao trabalho de explicar o que entende por "empresa nacional", uma vez que desde 1995 a lei não distingue entre empresas brasileiras e estrangeiras. Como, por profissão, analiso Política de C&T, registraria que ela confere ao País um status inovador ímpar: é o único que irá conceder recursos públicos a fundo perdido para que empresas multinacionais realizem P&D. Como comparo trajetórias da C&T periférica e desenvolvida, diria que ela é inócua: ajustes institucionais como os propostos não induzem mudanças de comportamento na dimensão dos objetivos que pretende alcançar.Como me considero um professor de esquerda, lamento que recursos públicos sejam empregados pelo atual governo para materializar a proposta do anterior, como se C&T não fossem assuntos políticos, e para fomentar "empresas de base tecnológica" de "pesquisadores públicos", cuja vocação é produzir insumos para multinacionais.
|
|
|
|