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Artigo: O amigo Debrun
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Centro de Campinas:
   transformações
São Paulo: 1918
 

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Na última entrevista,
Debrun disseca a globalização


Michel Debrun pertenceu à linhagem de intelectuais franceses que, como Lévi-Strauss, Roger Bastide e Blaise Cendrars, dedicaram parte considerável de sua vida ao esforço de tentar compreender e explicar o Brasil. Essa busca, no caso de Debrun, começou em 1957, quando ele aportou no Rio de Janeiro para incorporar-se ao grupo de ideólogos do antigo Iseb (Instituto Superior de Estudos Brasileiros), e prosseguiu até sua morte quarenta anos depois. Desde aquela época ele veio se dedicando à questão da identidade nacional e, na década de 90, ao estudo do processo de globalização das economias e à conseqüente inserção do país na corrente dessas transformações. Concedida a Eustáquio Gomes e publicada originalmente no Correio Popular de Campinas, em 11 de janeiro de 1997 – menos de três meses antes do acidente vascular cerebral que o levaria em 9 de março do mesmo ano - esta foi a última entrevista concedida por Debrun. Nela, ele expressa a crença de que o Brasil, na linha "antropofágica" que sempre o caracterizou, seria capaz de assimilar as transformações em curso e "emergir" nas primeiras décadas do século 21.

EUSTÁQUIO GOMES


Muitos observadores viram na reunião da Organização Mundial do Comércio (OMC), realizada há um mês em Cingapura [em dezembro de 1996], um significado especial para o balizamento das relações internacionais. O senhor partilha dessa opinião?
Michel Debrun - Sem dúvida. O que se celebrou em Cingapura foi a globalização crescente do comércio exterior. Ou seja, não apenas o comércio exterior em si, o qual, por envolver uma pluralidade de nações, tem por definição uma característica globalizante. Mas sobretudo o fato de que o comércio exterior ocupa um lugar cada vez maior nas atividades econômicas e no Produto Interno Bruto de um número crescente de nações. Isto é bem evidente no caso dos Estados Unidos, que até há bem pouco tempo estavam basicamente voltados para si mesmos, sua parte das transações internacionais sendo proporcionalmente reduzida. De modo geral, era o caso das grandes nações, com exceção do Japão – desde os anos 60 essencialmente voltado para fora – e em grau menor da Alemanha. Só nações mirins do tipo Cingapura faziam do desenvolvimento do comércio exterior sua razão de ser. Agora trata-se de estender ao resto do mundo a primazia desse tipo de comércio, com a idéia (da qual compartilho) de que isto deverá proporcionar um rápido aumento da riqueza mundial e a esperança (desta vez especificamente neoliberal, e da qual não compartilho) de que a médio prazo deverá também acarretar uma melhor distribuição da renda.

Michel Debrun em 1991 Há quem ache que neoliberalismo, globalização, capitalismo avançado e imperialismo são termos equivalentes ou, para usar uma expressão popular, farinha do mesmo saco. O senhor concorda?
De fato muita gente pensa assim, particularmente uma certa esquerda ainda presa a velhos chavões. Não se dão ao trabalho de analisar, de esmiuçar as noções. Se o fizessem veriam que globalização, neoliberalismo etc correspondem a fenômenos factuais ou ideológicos muito reais, mas que não mantêm entre si, necessariamente, relações orgânicas no seio de uma totalidade de pensamento, como teria dito Althusser. Pode ser que, em vez disso, tais fatos e ideologias se encontrem ou se desencontrem em determinado momento e lugar. Ou seja, juntam-se e colaboram entre si conforme o caso, conjugando seus efeitos, positivos ou deletérios. Ou então se disjuntam, e aqui podem surgir coisas curiosas para quem está acostumado a realizar um amálgama confuso (embora de forte impacto emocional) entre noções conceitualmente diferentes. Voltando à conferência de Cingapura, vou dar um exemplo. Não é curioso que a delegação norte-americana não tenha exigido uma condenação formal da superexploração do trabalho humano (o infantil em particular) em certos países, especialmente os tigres asiáticos? Tal condenação, acompanhada de sugestões de sanções, teria ido diretamente ao encontro dos princípios neoliberais formulados por instituições como o FMI e o Bird. Afinal essas instituições pregam a livre concorrência dos capitais, das mercadorias e dos homens, desde que essa liberdade “total” não seja selvagem nem anti-ética. Fatores como a exploração do trabalho em condições subumanas, a livre aplicação, a lavagem internacional e a transferência de um país para outro do dinheiro oriundo do tráfico de drogas ficam fora das regras do jogo. Como se sabe, o FMI tem propalado sua preocupação crescente com este último aspecto da questão. Ora, os americanos (tão neoliberais e ao mesmo tempo éticos em relação ao resto da pauta da conferência) não deram aparentemente muita atenção a essa espécie de contradição. Possivelmente porque a delegação americana tinha, em outros assuntos, algum interesse em contemplar os tigres asiáticos e, ao mesmo tempo, negar apoio às delegações européias, em particular a seus sindicalistas obcecados com os baixos preços das mercadorias asiáticas. Assim o neoliberalismo saiu vencido num ponto específico mas importante num encontro em grande parte consagrado a fazer aumentar a penetração e a aceitação de seus princípios, bem como a fazer dele próprio, neoliberalismo, uma manifestação palatável da globalização.

Michel Debrun em janeiro de 1997, três meses antes de sua morte Nesse caso, não havendo esse entrosamento orgânico entre globalização e neoliberalismo, o bicho-papão pode não ser tão feio quanto parece. Logo o futuro, visto por muitos como catastrófico, pode ser que se apresente em cores mais amenas?
Não se trata absolutamente de negar eventuais perigos trazidos por esses diversos fenômenos, ou por associações entre eles, mas de identificá-los e de qualificar o peso de cada um. É possível, inclusive, que a curto e a médio prazo o conjunto das desvantagens trazidas pelo conjunto desses fenômenos ou pela globalização tomada isoladamente seja maior do que a soma das vantagens. O que eu recuso, apenas, são certas afirmações “globalizantes” sobre a globalização e quejandos. Do seguinte tipo: globalização mais neoliberalismo mais imperialismo formam um bloco e esse bloco é responsável por todos os males do mundo atual, desde o agravamento do fosso entre ricos e pobres (inclusive nos Estados Unidos) até o desmantelamento do estado de bem-estar social, o Welfare State que se tinha espraiado no mundo desenvolvido a partir da Segunda Guerra Mundial. Outra afirmação “globalizante”, desta vez do lado da extrema-direita francesa, é a seguinte: globalização mais esquerdismo mais invasão da França pelos imigrantes árabes foram um bloco e esse bloco é responsável por todos os males da França, desde o crescimento do desemprego até a decadência do estado nacional. São amálgamas desse gênero, concretizados na imagem do bicho-papão, que devemos procurar superar.

Colocada em termos distintos do neoliberalismo e do antigo imperialismo, como o senhor definiria, a rigor, a globalização?
Eu diria que a palavra globalização é hoje utilizada em três sentidos diferentes, cada sentido correspondendo a uma categoria de fenômenos reais. Mas no discurso corrente, oral ou escrito, nenhum desses sentidos é explicitado. É só olhando para o contexto que chegamos a reconstituir o sentido ou os sentidos que alguém dá à palavra, que sem dúvida é um dos vocábulos mais grafados e pronunciados do momento.

Não seria este o seu momento de fama antes de envelhecer e passar para o museu léxico?
Pode ser, mas presentemente ela é mais que uma palavra e corresponde a uma realidade bem palpável. Num primeiro sentido a globalização é o que dissemos aqui a respeito da extensão do comércio internacional. Ou seja, há globalização quando um fenômeno (econômico, social, cultural etc) é reproduzido num número crescente de exemplares no mundo inteiro. Vamos pensar, por exemplo, na disseminação do uso do computador. Cada vez mais, um número crescente de pessoas, empresas e instituições já não pode dispensar os serviços informatizados, a tal ponto que, muitas vezes, esse uso se torna um fim em si mesmo. Direi, então, que esse fenômeno de natureza tecno-social é uma manifestação da globalização por homogeneização. Ou, se você preferir, que ele resulta numa homogeneização crescente entre os homens; ou, ainda, que estamos diante de um programa de produção que se aproxima da “clonagem” generalizada.

"Estamos diante de um programa de produção
que se aproxima da “clonagem” generalizada"

Muitos creditam o fenômeno da mundialização ao desenvolvimento vertiginoso dos processos de comunicação e informação. O que há de verdade nisso?
Este é o segundo sentido que freqüentemente se atribui ao termo globalização. Na verdade, ela tem a ver mais propriamente com a transmissão da informação que, emitida de uma fonte A, tem um efeito direto sobre um receptor B. Não se trata, aqui, da simples reprodução ou do uso da informação que se dá numa infinidade de exemplos diários, mas da própria informação enquanto manifestação de uma globalização específica. A informação é intrinsecamente globalizante no sentido de que, independentemente da freqüência de seu uso, ela conecta por definição todos os pontos do mundo – potencial ou efetivamente. E o faz instantaneamente. É essa globalização comunicacional que, sendo o suporte por excelência da globalização financeira, permitiu que ocorresse a catástrofe mexicana de fins de 1994. Algumas informações concernentes a certos aspectos, reais ou supostamente negativos, da situação econômico-financeira desse país foram retransmitidas num primeiro instante a todas as praças financeiras do mundo. E, num segundo instante, havendo livre circulação de capitais flutuantes no mundo inteiro, urdiu-se a retirada maciça desses capitais, forçando a degringolada do peso mexicano. Punia-se assim um país que até aquele momento era visto como o aluno modelar do FMI e de Washington. Digamos, então, que a globalização financeira é um derivado, uma conseqüência da globalização da informação ou da comunicação.

O senhor falou num terceiro sentido do termo globalização...
Num terceiro sentido temos o que eu chamaria de globalização por diferenciação no seio de um todo já mais ou menos homogêneo ou unificado. Essa unificação prévia pode resultar do trabalho de uma ou de outra das duas primeiras globalizações. Mas pode também consistir num equilíbrio que se estabeleceu com o tempo entre pólos (econômicos, políticos, culturais, militares etc) que eram inicialmente indiferentes entre si ou mesmo inimigos. Tal seria, por exemplo, o equilíbrio quase institucional alcançado nos tempos da guerra fria entre Estados Unidos e União Soviética. Então a idéia é a seguinte: reduzindo os pólos a dois, para simplificar, eu diria que qualquer novidade ou diferença importante que surja no pólo A cria imediatamente uma nova situação favorável ou desfavorável ao pólo B – mesmo que não haja pressão de A sobre B ou qualquer outra forma de interação. E isso pode ser visto como uma forma de globalização, já que os dois pólos vão ficar agora soldados um ao outro, embora à distância (já que no primeiro momento não interagem), pelos próprios problemas e situações que um traz para o outro. Naturalmente, quanto maior for a distância entre eles em termos de espaço físico, econômico, político, cultural etc, tanto maior será a globalização. E ainda: quanto maior a situação de dependência ou de inferioridade que pode vitimar um dos pólos, tanto maior será o grau de globalização.

Poderia exemplificar?
Sim. O afundamento da URSS no final dos anos 80 trouxe, como se sabe, uma imediata superioridade dos Estados Unidos e a possibilidade de expansão de sua hegemonia sobre o resto do mundo. Observe que os Estados Unidos não precisaram agir militarmente para isso, apenas forçaram a URSS a uma corrida armamentista que ela não podia sustentar. Outro exemplo é a queda do muro de Berlim e a unificação inesperada das duas Alemanhas. Esses fatos desequilibraram a união da Europa Ocidental e levaram a França a adotar políticas cautelares contra uma possível reativação do expansionismo alemão. Quanto à dissimetria que se cria (e se cria sem parar, devido à rapidez do progresso tecnológico), ela constitui o exemplo predileto dos críticos da globalização. Não apenas como fonte principal da onda de desemprego que varre a maioria dos países, mas também como uma ameaça permanente sobre qualquer tipo de emprego e ainda por exigir uma capacidade de reciclagem constante. Tudo isto, por definição, é incompatível com a cultura do emprego garantido (que reinava no leste europeu) ou quase garantido, que prevalecia no oeste, particularmente na Alemanha.

O senhor distinguiu três formas de globalização. Elas caminham autonomamente ou há pontes entre elas?
É evidente que a primeira, a globalização uniformizante, e a segunda, a globalização comunicacional, têm uma tendência natural a crescer juntas e a se reforçar mutuamente. Quanto à terceira, a globalização por diferenciação, sugeri que ela pressupõe uma homogeneização ou unificação prévia, que ela destrói. É fácil entender isso voltando aos pólos A e B: se os dois não pertencessem, antes de qualquer cotejo, a um mesmo espaço econômico, social, cultural etc, não haveria como dizer que uma relação assimétrica se criou entre eles. Ficariam apenas distantes e indiferentes. Por exemplo, antes da exploração (no duplo sentido) do Extremo Oriente pelos ocidentais e do conhecimento que chineses e europeus adquiriram uns dos outros, não fazia sentido afirmar que os progressos tecnológicos dos europeus implicaram automaticamente um rebaixamento político, econômico ou mesmo tecnológico dos chineses.

Voltando ao neoliberalismo. Em que ponto ele engrena, se é que engrena, na temática da globalização?
Boa parte das análises neoliberais se dedica à globalização do comércio exterior, visto como motor principal do desenvolvimento das economias modernas, de acordo com a fórmula “as importações de hoje fazem as exportações de amanhã”. A teoria neoliberal procura mostrar que, uma vez impulsionado e generalizado o comércio exterior por decisões governamentais ou intergovernamentais, sua globalização crescente tende a se processar por automovimento, uma tendência endógena que dispensa, ou mesmo repele, a intervenção de fatores externos como a dos estados nacionais. As condições do automovimento seriam, em particular, a liberdade total das decisões econômicas dos participantes (refiro-me a instituições e empresas, não a países) e uma transparência do processo para esses participantes, o que seria assegurado por uma intensificação dos fluxos informacionais. Em síntese: uma globalização do tipo homogeneizante ou unificador, segundo a minha nomenclatura, seria propulsada por uma globalização do tipo comunicacional. Além disso o processo, precisamente por ser “auto” e não comandado de cima para baixo, comportaria possibilidades de autocorreção, garantindo, a médio prazo, o pleno emprego (ou quase) dos fatores econômicos envolvidos. Pode ser que seja assim em vários casos e, para esses casos, o neoliberalismo pode ser considerado como a teoria verdadeira da globalização. O que ele não vê, porém, é que ao lado dessa globalização “suave” existe e se espraia uma globalização “selvagem”, enquadrada no terceiro tipo da nomenclatura que mencionei.

É possível fazer frente a essa face selvagem da globalização sem entrar em conflito direto com as forças que hoje determinam as relações internacionais?
Vou dar dois exemplos de natureza oposta. Nos Países Baixos o primeiro ministro Wim Kok, antigo líder sindicalista social-democrata, adotou o lema “jobs, jobs, jobs”. Isto queria dizer prioridade absoluta para o emprego, para a multiplicação dos empregos, cada indivíduo adquirindo, senão a garantia vitalícia desse emprego, pelo menos a quase garantia de um emprego. Tratava-se de neutralizar, de antemão, o impacto trabalhista da globalização tecnológica, seja qual for sua evolução. Para tanto se inventou uma parafernália, aliás bem-sucedida, que inclui desde macetes neoliberais como a redução ou a eliminação das taxas sobre empresas ou a diminuição consensual de certos salários, passando pela adoção da semana de 36 horas em vários ramos e pela destinação dos ganhos de produtividade das empresas à formação polivalente de jovens trabalhadores ou à reciclagem dos mais velhos. Trata-se, para além do estado de bem-estar perdido, de instaurar algo mais enxuto, uma economia social de mercado. A melhoria da produtividade faz o restante, isto é, permite enfrentar vitoriosamente a concorrência internacional. Em síntese, o caso holandês representa um caso de resistência suave, mas intransigente, às condições dos novos tempos. Bem diferente do voluntarismo tenso do governo francês – este é exemplo oposto – que, face à resistência do conjunto da população a qualquer mudança substancial do estado de bem-estar, tenta desesperadamente manter as coisas como estão, disposto até a lançar mão de uma eventual desvalorização do franco frente ao dólar e ao marco.

"Não acredito que as nações, pelo menos as macro
ou supra-nações, tendam a desaparecer"

Nesse contexto, como fica o Brasil?
O Brasil é um terceiro caso, intermediário entre a França e os Países Baixos. Aparentemente mais perto destes, já que procura, como eles, meios de absorver ou contornar suavemente os fluxos neoliberais. Mas com maior vontade de auto-afirmação nacional do que os Países Baixos, que admitem sem maiores restrições sua integração na Comunidade Européia e são defensores incondicionais da moeda única. Estão também prontos para uma eventual ordem internacional sem fronteiras. Nesse ponto, o Brasil me parece mais próximo da posição francesa, como ficou claro em Cingapura, onde as posições da delegação brasileira nem sempre coincidiram com as exigências neoliberais e com as posições norte-americanas.

Mas o impacto dessas transformações pode ser maior do que qualquer capacidade de resistência que o Brasil possa vir a demonstrar. Não lhe parece?
Para contextualizar o Brasil e tomar seu pulso nesse processo, talvez fosse bom recordar à linha “antropofágica” que, partindo de Oswald de Andrade, passa por Gilberto Freyre e chega a Darcy Ribeiro. O que essa linha diz, sob uma linguagem por vezes irônica, por vezes ufanista, é o seguinte: o Brasil tem uma capacidade fantástica de deglutir, rearranjar ou mesmo neutralizar tudo o que vem de fora, mesmo que de início possa parecer um recipiente passivo, como no caso das tábuas da lei do FMI. Na verdade o Brasil faz como fazia o general Kutusov, que em 1812 permitiu que Napoleão avançasse pelas estepes russas para em seguida apanhá-lo na armadilha do inverno e da fome. Vejo o Brasil como um dos três países-continentes que provavelmente vão emergir nas primeiras décadas do próximo século [século XXI]. É o caso da China e talvez da Rússia, se esta for capaz de escapar ao caos econômico, social, político, militar e ético em que se acha mergulhada. Se levarmos em conta a existência dos Estados Unidos, do Japão (ou da esfera asiática) e da Comunidade Européia, parece-me que a dinâmica mundial não vai se dar no sentido projetado ou mesmo anunciado como certo pelo neoliberalismo. Não acredito que as nações, pelo menos as macro ou supra-nações, tendam a desaparecer, mesmo que homogeneizações setoriais possam se multiplicar.

Em sua opinião, o governo brasileiro [de Fernando Henrique Cardoso] está reagindo adequadamente a esse processo?
Apesar de me considerar um nacionalista brasileiro, permaneço cidadão francês e como tal não me sinto no direito de opinar sobre a conjuntura política brasileira. Direi apenas que o Real, sejam quais forem os prós e contras que se possam alinhavar para avaliar sua performance, está se constituindo, enquanto mito coletivo, num formidável filme inaugural da nacionalidade. Mais exatamente da nação sócio-política, já que, a meu ver, a nacionalidade sócio-cultural (o futebol, o carnaval, a música popular e sobremaneira essa agregação diária em torno da novela) existe já faz tempo. Contanto que o Real perdure e seu mito seja alicerçado, o Brasil me parece capaz de enfrentar os perigos da globalização e até aproveitar suas eventuais benesses através de políticas que não sejam, em parte ou na totalidade, forçosamente neoliberais.

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