Tese registra as transformações do centro de Campinas
ANTONIO ROBERTO FAVA
Durante três anos, a publicitária e fotógrafa Patrícia Rodolpho, munida de uma Nikon FM 10, percorreu algumas das principais ruas do centro nervoso de Campinas, entre as quais a 13 de Maio, Ferreira Penteado, Costa Aguiar, Conceição e César Bierrembach. Produziu cerca de 700 fotos de prédios antigos em ruínas, paredes e muros pichados, a circulação efervescente de pessoas e transportadores de mercadorias naquela região da cidade.
Patrícia se propôs a registrar, por meio da imagem fotográfica, as transformações urbanas e os conseqüentes efeitos visíveis da passagem do tempo, a partir do século 19 até a década de 70. Transformações que derivam do próprio crescimento da cidade e que incluem as sucessivas construções e demolições de prédios, modificando de modo considerável a estética da área central da cidade, principalmente a Rua 13 de Maio.
Sua pesquisa deu origem à dissertação de mestrado A Rua em imagens: as transformações urbanas na fotografia - um estudo de caso sobre a Rua 13 de Maio em Campinas/SP, apresentada recentemente no Departamento de Multimeios do Instituto de Artes (IA), sob a orientação do professor Fernando de Tacca.
Patrícia investigou, de forma sistemática e profícua, as transformações urbanas e suas conseqüências, de modo a ser tornarem visíveis e compreensíveis. Sobretudo por meio da pesquisa teórica entrelaçada à prática fotográfica, a pesquisadora elaborou uma conceituação para as antigas edificações que resistem à passagem do tempo, permitindo a pontuação temporal, que marcam a diferença entre o "velho" e o "novo" de um determinado espaço: as "âncoras temporais", que designam os prédios, e construções que resistem à passagem do tempo, se não fisicamente, pelo menos na memória coletiva da cidade.
Patrícia explica que essas "âncoras temporais" e as funções que as caracterizaram ao longo do tempo, possibilitaram a compreensão do processo de rupturas, que consistem na mudança de contexto cotidiano do centro e continuidades na dinâmica cotidiana da Rua 13 de Maio. Por exemplo, a Igreja Matriz Nossa Senhora da Conceição, que começou a ser construída em 1807 e inaugurada 70 anos mais tarde, continua com sua função religiosa e que agrega a comunidade/população no centro da cidade.
A estação da Companhia Paulista, "criada para escoar a produção cafeeira em 1868, e que se caracterizou como um entroncamento ferroviário, está hoje em um momento de transição, cujo prédio, tombado, está sendo paulatinamente transformado em um centro cultural". Há ainda a Casa de Câmbio Roque de Marco, que, como a maioria das construções burguesas do século 19, sediava as atividades comerciais no andar térreo. E no andar superior abrigavam as famílias. Hoje, o térreo do casarão Roque de Marco está subdivido em algumas lojas, "cujos pontos comerciais de tempos em tempos são repassados a outros comerciantes. O andar superior está em condições precárias. Há vários anos não é habitado", observa a pesquisadora.
Viagem pelo tempo - O teatro, por sua vez, guarda, através da memória coletiva, uma história singular: segundo a pesquisadora, construído em meados do século 19 pela emergente burguesia de Campinas, a primeira casa de espetáculos, o Teatro São Carlos, foi demolida em 1922 para ceder lugar a um outro teatro maior e mais suntuoso, o Teatro Municipal, inaugurado em 1930.
"Esse mesmo teatro foi demolido em 1965, e no espaço que abrigou as duas casas de espetáculo foi construída uma grande loja de departamentos", conta Patrícia. Além das fotografias que produziu, a pesquisadora trabalhou também com aproximadamente 80 imagens geradas no início do século. "Procurei, digamos, empreender uma ‘viagem’ pelo tempo por meio de fotos. Me propus a mostrar como antes era a Rua 13 de Maio, com relação à sua parte edificada, assim como com referência à intensidade da circulação de pessoas e veículos no espaço, que aumentou significativamente ao longo do século. Um aumento evidentemente provocado pelo próprio crescimento da cidade e pela característica eminentemente comercial de uma das mais conhecidas ruas de Campinas", diz a pesquisadora.