A região de Estiva Gerbi, conforme Christiane, está entre as que apresentam maior produtividade no Estado de São Paulo no que se refere à tomaticultura. Na área da Bacia o fruto é produzido em aproximadamente 600 hectares, algo como 6% da área total destinada à atividade agrícola. A propriedade escolhida para o estudo, explica a pesquisadora, tinha características extremamente favoráveis à pesquisa. Primeiro, por estar localizada num ponto estratégico da Bacia, que os técnicos denominam de divisor de água, e em uma Bacia de primeira ordem. Depois, por apresentar dimensão, declividade e tipo de solo semelhantes ao da maioria dos sítios produtores de tomate. Para completar, obviamente, o proprietário era usuário do sistema de irrigação por sulcos.
Para entender melhor, esse método de irrigação funciona da seguinte forma. A água é captada de um curso natural e bombeada através de um duto até o canal principal, localizado acima dos talhões de cultivo. Em seguida, a água é derivada por gravidade para um segundo canal (secundário), responsável pela distribuição para os sulcos propriamente ditos. Para analisar o desempenho desse sistema, Christiane montou uma espécie de laboratório a céu aberto na propriedade. Durante dois anos, ela mediu o volume de água bombeado para a irrigação, o armazenamento de água no solo, as perdas de água por percolação profunda, as perdas de água por escoamento superficial no canal secundário e monitorou os dados climáticos regionais, entre outros parâmetros necessários para a avaliação do sistema de irrigação. Sua conclusão foi de que a irrigação por sulcos da maneira como é realizada é ineficiente. A eficácia do sistema foi calculada em aproximadamente 26%, quando deveria ser algo em torno de 70%, para ser considerada boa.
Ademais, prossegue a engenheira agrícola, as perdas totais de água alcançaram o elevado índice de 74%. Em outras palavras, de cada dez litros de água captados do rio, menos de três eram efetivamente aproveitados para o cultivo do tomate. “Esse problema é muito sério, pois aquela região já convive com situações em que existe o conflito pelo uso da água. Se o desperdício continuar, a tendência é que o cenário se agrave nos próximos anos”, adverte a especialista. De acordo com ela, o problema poderia ser minimizado com a adoção de um método relativamente simples. No lugar do canal secundário, que nada mais é do que uma vala estreita aberta no próprio solo, os tomaticultores poderiam colocar mangueiras convencionais para o transporte da água.
A medida, afirma Christiane, ajudaria a combater o desperdício, bem como reduziria outros problemas acarretados por ele, como a erosão. “Sem falar que, aproveitando a água de uma maneira mais eficiente, os agricultores gastariam menos energia elétrica, pois não precisariam bombear um volume tão grande a partir do rio ou córrego”, ensina. Conforme a engenheira agrícola, tal atitude não requer grandes investimentos nem tampouco uma mudança drástica de tecnologia. “É só uma adaptação do sistema atual. Essa iniciativa traria vantagens tanto para o produtor quanto para o meio ambiente”. A pesquisadora afirma que os tomaticultores têm conhecimento dessa opção, mas não demonstram interesse na sua adoção.
Isso ocorre, diz, porque a produtividade na região é muito boa e também porque os tomaticultores repassam todos os custos da produção para o consumidor, sem preocupação. “Penso que essa postura só mudará quanto eles forem atingidos no bolso ou houver falta d’água para a irrigação. Com o advento da cobrança pelo uso da água, os agricultores possivelmente terão que rever seus métodos de produção”, antevê. Christiane reafirma que, embora os produtores agrícolas não se dêem conta, já existe o conflito pelo uso da água na Bacia do Rio das Pedras. O córrego Itaqui, por exemplo, está sob intervenção do Departamento de Águas e Energia Elétrica (DAEE), órgão gestor dos recursos hídricos do Estado de São Paulo.
Paralelamente à investigação sobre o desperdício, Christiane também analisou a qualidade da água da Bacia do Rio das Pedras, a partir da hipótese de que a tomaticultura poderia estar contribuindo para a poluição dos mananciais. Assim, a pesquisadora coletou amostras de água em seis pontos diferentes da Bacia. Ao analisar essas amostras em laboratório, ela constatou a contaminação por dois tipos de substâncias presentes em adubos empregados no cultivo do tomate: amônia livre e fósforo. “Como só trabalhei com nutrientes, não posso dizer se o nível de contaminação é ainda maior, em razão da possível presença de substâncias que compõem os defensivos agrícolas. Mas posso dizer que, levando em conta apenas os parâmetros estudados por mim, a situação gera preocupação”, afirma.
De acordo com os dados apurados na pesquisa, os níveis de amônia livre nas águas da Bacia chegaram a 0,5 parte por milhão (ppm), quando o aceitável pela resolução do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), organismo vinculado ao Ministério do Meio Ambiente, é de somente 0,02 ppm, para águas das classes 1 e 2 destinadas ao abastecimento doméstico e irrigação de hortaliças e plantas frutíferas. Já em relação ao fósforo, os valores encontrados ficaram entre 0,1 e 0,9 ppm - o Conama admite apenas 0,025 ppm. “Nós também fizemos, em um ponto próximo à sessão de controle da Bacia, um cálculo sobre a presença de sais totais dissolvidos nas águas. Nossa estimativa é de que a Bacia do Rio das Pedras contribui com cerca de 300 toneladas dessas substâncias por ano para o Rio Oriçanga, que é o afluente do Rio das Pedras. Vale frisar que essa contribuição não advém apenas da agricultura, mas também das atividades urbanas”, afirma a engenheira agrícola.
Ao longo da pesquisa, Christiane promoveu, ainda, o cálculo do Índice de Qualidade da Água (IQA), que apontou que a agricultura da região contribui para a contaminação dos rios e córregos da Bacia, sendo que os principais contaminantes são o nitrogênio-amoniacal e a amônia livre. “Esse dado demonstra que é essencial a melhoria no manejo da irrigação e dos insumos utilizados na agricultura da região. Vale lembrar que os tratamentos convencionais de água não extraem todos os componentes químicos, o que pode trazer sérios prejuízos à população, sujeita a ser afetada tanto pela falta d’água como pela contaminação agrícola”, adverte a engenheira agrícola, que foi orientada pelo professor Roberto Testezlaf e contou com apoio da Fapesp.