Edições Anteriores | Sala de Imprensa | Versão em PDF | Portal Unicamp | Assine o JU | Edição 289 - 23 de maio a 5 de junho de 2005
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Geofísica computacional é ferramenta fundamental
na exploração e no monitoramento de reservas de petróleo

A matemática que
perscruta o inacessível

JEVERSON BARBIERI

O professor Martin Tygel, coordenador do LGC: "Existe um espaço muito grande para crescer" (Foto: Antoninho Perri)O aproveitamento e gerenciamento de recursos naturais têm provocado nos últimos anos uma crescente demanda pela produção de conhecimentos, pela realização de serviços e pela formação de profissionais. Atender adequadamente essas demandas significa estabelecer uma competência científico-tecnológica, de forma sustentável, nas várias áreas de conhecimento envolvidas, em particular a geologia, a geofísica e a matemática aplicada e computacional. O professor Martin Tygel, coordenador do Laboratório de Geofísica Computacional, (LGC), do Departamento de Matemática Aplicada da Unicamp, explica que o trabalho da geofísica consiste em realizar medições na superfície da terra ou no mar e, como resultado, produzir imagens e informações da subsuperfície com vistas a uma série de aplicações, utilizando recursos computacionais de alta tecnologia. Ele cita como exemplos a prospecção de petróleo, e os estudos ambientais, arqueológicos e da construção civil. Segundo Tygel, o procedimento comum de todas essas aplicações é enviar um tipo de onda, receber o sinal que é refletido e, então, processar os dados recebidos.

Parceria com ANP gera bons resultados

Desde 2001, o LGC atua nessa área realizando pesquisa e desenvolvimento em propagação de ondas, modelagem e processamento de dados geofísicos, entre outros. Um dos projetos realizados pelo LGC é a construção de imagens sísmicas em tempo e profundidade, utilizadas para exploração e monitoramento de reservatórios de petróleo e gás. Outro projeto destina-se à obtenção de imagens de atributos geo-eletromagnéticos de interesse em estudos ambientais, como presença de poluentes, localização de dutos e rejeitos industriais no subsolo.

Ilustração: DivulgaçãoParcerias - O LGC desenvolve atualmente um importante trabalho em parceria com a Agência Nacional do Petróleo (ANP), no qual é feito o reprocessamento de dados sísmicos antigos com métodos e tecnologia avançadas com vistas à exploração de petróleo. Tygel considera esse trabalho muito interessante, uma vez que muitos dados não podem ser adquiridos novamente, por exemplo, por motivos ambientais. Os dados originais são reprocessados utilizando resultados científicos e recursos computacionais atualizados, sendo possível recuperar muita informação. Além disso, o LGC desenvolve vários projetos para a Petrobrás, visando a melhor exploração e monitoramento de reservatórios de petróleo e gás.

A Unicamp, através do LGC, assinou recentemente um convênio com a empresa Brain Tecnologia, sediada em Belo Horizonte (MG), no valor de R$ 2 milhões. Além de interesses em prospecção sísmica de petróleo, a Brain tem forte atuação no setor de meio ambiente através de mapeamento adequado, por exemplo, na detecção de poluentes, delimitação de lençol freático, localização de dutos de petróleo, entre outros. Tygel explica que é um convênio no qual tanto o LGC quanto a Brain podem sugerir projetos de interesse comum. Outro convênio recente foi realizado com as empresas GPlus e AMD, no qual foi disponibilizado um “cluster” de 32 processadores para testes em software de processamento sísmico desenvolvidos no Laboratório.

O LGC desenvolve também vários projetos de pesquisa e desenvolvimento com a Petrobras, em particular na forma de teses de pós-graduação de seus profissionais na Unicamp. Finalmente, o LGC recebe também financiamento da Fapesp, em forma de projetos temáticos e de bolsas e do CNPq para o desenvolvimento de suas pesquisas. O aporte de recursos por parte da ANP e Fapesp foi essencial para a aquisição de equipamentos computacionais e instalação do Laboratório. O LGC é ainda um dos membros fundadores do Consórcio internacional Wave Inversion Technology (WIT), que congrega importantes empresas de petróleo mundiais para execução de pesquisa aplicada.

Recursos Humanos – O coordenador do LGC afirma que os bons empregos relacionados à alta tecnologia e serviços sofisticados estão sempre migrando para economias mais favoráveis. O campo do petróleo tem a possibilidade de trabalhar com tecnologia de ponta e atrair os bons empregos. “Recebo aqui no Laboratório, quase que diariamente, algum pedido de mão-de-obra qualificada que conheça esse tipo de tecnologia, para emprego certo. São poucas as pessoas qualificadas, existe um espaço muito grande para crescer”, revela. Vale salientar, no entanto, que se trata de uma área que requer bastante dedicação, o profissional precisa saber muito de matemática, informática e geologia.

Na visão de Tygel, a universidade poderia treinar mais pessoas. “Existe uma procura por treinamento, mas a demanda por profissionais é muito maior”. Tygel afirma também que é difícil diagnosticar porque a procura pelos candidatos não é tão grande como deveria ser. Ele considera que, especialmente para os jovens, o petróleo tem uma conotação muito negativa, como poluente e destruidor de meio-ambiente, porém essa é uma noção que não representa corretamente toda a realidade. “É claro que, como toda atividade de grandes proporções, a indústria de petróleo tem grande impacto no meio-ambiente. O petróleo, no entanto, é um dos recursos naturais mais nobres, tendo massiva utilização nas indústrias química, farmacêutica e têxtil, bem como na produção de insumos agrícolas. O petróleo é também fundamental na produção de inúmeros materiais sintéticos. Estas aplicações têm impacto muito mais relevante que sua mera utilização como combustível. Além disso, simplesmente não existe ainda substituto energético viável”, afirma.

Em uma análise bem objetiva da situação da pesquisa e inovação no País, Martin Tygel é de opinião, que nos últimos 30 anos, o Brasil mandou muita gente para fora, os pesquisadores realizaram seus doutorados e os cursos de pós-graduação foram bem consolidados. O grande motor era e é a publicação em revistas especializadas. Esperava-se, porém, que esta ação gerasse, por si só, o desenvolvimento, não só científico, mas também tecnológico, capaz de gerar riquezas materiais para a população. No entanto, como há poucas oportunidades no País para o desenvolvimento de produtos a partir dessas idéias, essas são patenteadas e utilizadas em outros países, os quais recebem os dividendos do trabalho.

Tygel enfatiza agora o que ele chama de trabalho pós-publicação, na inovação e no estabelecimento das tecnologias. Segundo ele, o país tem uma deficiência cultural histórica que é a de olhar as pessoas que fazem, que “põem a mão na massa”, de uma forma pejorativa, ao contrário do olhar lançado sobre as pessoas que produzem as idéias, os criadores intelectuais. De acordo com Tygel, no Brasil é mais fácil comprar um equipamento de US$ 1 milhão do que pagar um salário adequado para o técnico que fará a manutenção do equipamento. “Posso conseguir agora, com algum projeto de pesquisa, a aquisição de máquinas sofisticadíssimas. No entanto, a contratação de pessoal para operar e manter essas máquinas não se encaixa em nenhum tipo de apoio”, alerta. Tygel acha, no entanto, que a situação está se revertendo, embora não na velocidade que deveria. A Unicamp está investindo mais na inovação e isso significa realizar atividades que tenham, além de qualidade acadêmica, também conteúdo prático. Mas, na opinião do docente, ainda falta apoio para as pessoas qualificadas que não são pesquisadores.

Prevenção – Em contraponto com a realidade dos países industrializados, o Brasil utiliza muito pouco os benefícios que a tecnologia geofísica pode oferecer. Tygel explica que, em muitos países, serviços de mapeamentos e análises utilizando o processamento de dados geofísicos são de amplo emprego na sociedade. Dentre os exemplos estão aplicações em preservação de estradas. Segundo ele, através de medições realizadas com a circulação de veículos pesados na estrada é possível verificar possibilidades de ruptura devido ao estado do subsolo. “Um monitoramento correto pode significar uma economia substancial de divisas. Uma situação clássica que poderia ter sido evitada com monitoramento preventivo é a queda da ponte da BR-116”, alerta Tygel.

Futuro – O LGC é, segundo seu coordenador, auto-sustentado por seus projetos. Os recursos financeiros são provenientes, entre outras fontes, da Agência Nacional do Petróleo, Petrobras, Brain Tecnologia, GPlus e AMD, Fapesp, CNPq. Além disso, o LGC dispõe de sofisticados pacotes computacionais e aplicativos, disponibilizados a partir de acordos educacionais e de pesquisas com empresas.

O Laboratório está vinculado ao Centro de Estudos do Petróleo (Cepetro), considerado por Tygel um centro excelente, porque além de congregar todas as atividades do petróleo, realiza o gerenciamento financeiro dos projetos, aliviando os pesquisadores da pesada carga administrativa. O coordenador do LGC enxerga um futuro de trabalho muito promissor. “A atividade que realizamos é o processamento de dados geofísicos. O custo desse trabalho nos países desenvolvidos está se mostrando muito caro, havendo um deslocamento de serviços para países emergentes, por exemplo, China e Índia. Mesmo sendo os custos do Brasil maiores que nesses dois países, há competência aqui para receber esses serviços. Neste sentido, as atividades de laboratórios universitários, como o LGC, podem desempenhar um papel importante”, prevê Tygel.

A construção da nova sede do Cepetro ampliará a capacidade física do LGC, que ocupará um andar inteiro no novo prédio. Esse fato acena com um planejamento de uma grande expansão nas atividades. “Temos que colocar nossos estudantes para trabalhar em problemas reais. Isso não quer dizer que sou contra fazer pesquisa. O LGC apóia decisivamente o grupo de pesquisa em geofísica computacional do Departamento de Matemática Aplicada, participando ativamente dos trabalhos de pesquisa e publicações. Acho, porém, que ao lado do apoio já estabelecido à pesquisa, devemos nos preocupar mais com as aplicações. Além disso, trabalhar em problemas aplicados faz com que o aluno se habitue ao mercado de trabalho que irá encontrar. É um bom caminho para garantir que os nossos jovens tenham oportunidade”, finaliza Tygel.

Interpretação dos sinais permite a construção de imagens sísmicas em tempo e profundidade (Ilustração: Divulgação)

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