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Estudo derruba mitos sobre
esquizofrênicos criminosos

RAQUEL DO CARMO SANTOS

O psiquiatra Eduardo Henrique Teixeira: "A recomendação é que se tenha um olhar mais atento aos pacientes com comportamentos tranqüilos" (Foto: Antoninho Perri)Levantamento feito pelo psiquiatra forense Eduardo Henrique Teixeira, com pacientes da Casa de Custódia de Franco da Rocha, em São Paulo, mostrou que a maioria dos delirantes esquizofrênicos que cometeram atos criminosos violentos não apresentou quadro intenso de ansiedade, tristeza ou raiva, no período que antecedeu a ocorrência.

Comportamento não
oscilou antes das ocorrências

Teixeira constatou também que não houve registros de alterações significativas das atividades cotidianas – deixar de alimentar-se ou trabalhar, entre outras – desses pacientes em razão do transtorno psiquiátrico. Isto significa que, ao contrário do que se imagina, o comportamento emocional dos esquizofrênicos pode não oscilar quando esses praticam um crime violento.

Estes aspectos foram apontados em dissertação de mestrado apresentada por Teixeira na Faculdade de Ciências Médicas (FCM). Orientado pelo professor Paulo Dalgalarrondo, o trabalho envolveu a análise de prontuários e avaliação médica em 30 homens portadores de delírio que nunca praticaram crimes violentos e estavam internados no Hospital das Clínicas da Unicamp (HC) e no Hospital Psiquiátrico Américo Bairral, na cidade paulista de Itapira. Estes dados foram comparados às análises de outros 30 pacientes da Casa de Custódia de Franco da Rocha, todos julgados por crimes violentos, inclusive contra a família.

Teixeira, que é professor da PUC-Campinas, partiu da hipótese de que haveria alguns elementos intrínsecos do delírio que difeririam os esquizofrênicos praticantes de violação penal grave daqueles que nunca haviam transgredido a lei.

Segundo o psiquiatra, a idéia seria relacionar questões como antecedentes pessoais e uso de drogas e álcool para municiar de informações os profissionais da saúde na tentativa de se evitar tragédias com prejuízos sociais. “A experiência em perícia psiquiátrica me levou a investigar o mecanismo que está por trás das práticas criminosas, uma vez que os resultados poderiam auxiliar a decisão dos colegas na conduta médica”, explica.

Um exemplo citado pelo psiquiatra seria o procedimento médico mais viável diante da situação de inquietação e ansiedade do paciente. “Em geral, é mais provável que os pacientes mais agitados sejam levados à internação. Pelo estudo, no entanto, a recomendação é que se tenha um olhar mais atento aos pacientes com comportamentos tranqüilos”, esclarece.

Outra hipótese que não se confirmou no trabalho desenvolvido por Teixeira foi a relação dos atos criminosos com o uso de álcool e drogas. “Imaginava-se a associação do consumo desses produtos com a doença. Mas estes aspectos não tiveram destaque em nenhuma das avaliações realizadas”, analisa.

O psiquiatra enfatiza também que o estudo não trouxe revelações sobre violência entre os portadores do delírio, fato que já era conhecido da literatura. “Os esquizofrênicos não são mais violentos do que a população em geral. Eles não são perigosos. O risco de violência é resultado de um subgrupo específico, que foi objeto de estudo da pesquisa”, esclarece.

O delírio é caracterizado, principalmente, pela crença e práticas do indivíduo fora do contexto de sua realidade, mesmo contra argumentações fortes de pessoas próximas. Surtos persecutórios e paranóicos, por exemplo, são comuns – acreditar que os vizinhos estão o perseguindo ou os amigos estão planejando armadilhas.

Afora as diversas categorias do delírio, segundo Teixeira, algumas dimensões da doença merecem maior atenção por parte dos especialistas da área. O nível de convicção da doença por parte do indivíduo é uma dessas dimensões, ou seja, o quanto o paciente acredita na sua versão dos fatos. Este aspecto é validado a partir de análise clínica, baseada em escala de valores.

Um segundo item estudado seria o que se chama de atuação no delírio ou o quanto o indivíduo age em função dele, tal como, por exemplo, deixar de falar com alguém ou mesmo agredir terceiros. Duas dimensões tiveram alterações estatísticas significativas na pesquisa. Estão relacionadas ao afeto, sentimentos de ansiedade, raiva e outros e a inibição de ações em que a pessoa deixa de fazer as suas atividades habituais em função do delírio.

Durante quatro anos, a rotina do psiquiatra se baseou nas viagens ao município de Franco da Rocha. No local, Teixeira teve contato com histórias trágicas e pode analisar in loco prontuários médicos, além de efetuar avaliações. Constatou algumas limitações, entre as quais a falta de estrutura do local. “O acesso a documentos médicos e a informações foi uma das dificuldades da pesquisa”.

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