CLAYTON LEVY
Depois de passar cinco dias nos National Institutes of Health (NIH), em Washington, a diretora de Propriedade Intelectual e Desenvolvimento de Parcerias da Agência de Inovação da Unicamp (Inova), Rosana Ceron Di Giorgio, voltou com uma certeza na bagagem: o trabalho desenvolvido pela Inova representa um importante passo em direção a uma nova mentalidade nacional no que diz respeito à propriedade intelectual e transferência de tecnologia.
Fundado em 1887 como um laboratório, os NIH são hoje um dos centros mais avançados de pesquisa médica do mundo. Trata-se de uma das agências do Departamento de Saúde e Serviços Humanos do governo dos EUA, compreendendo 27 institutos e centros. O objetivo dos NIH em suas pesquisas é buscar novos conhecimentos para ajudar a prevenir, detectar, diagnosticar e tratar doenças, desde o mais raro problema genético até a gripe comum, em âmbito mundial.
Todo o trabalho relacionado à propriedade e comercialização do NIH está concentrado em seu escritório de transferência de tecnologia. Em vinte anos de atividade, o núcleo já captou cerca de US$ 8 bilhões em royalties. Na última década, a média tem girado em torno de US$ 40 milhões por ano. Com 26 mil patentes ativas, o centro fecha cerca de 200 contratos de licenciamento por mês. Embora os números revelem um enorme contraste com os padrões brasileiros, Rosana diz que a viagem foi extremamente proveitosa. “Estamos no caminho certo”, acredita a diretora da Inova, que visitou o NIH de 30 de abril e 4 de maio.
Somente nos últimos três anos a Inova firmou mais de 250 contratos de serviços e de repasse tecnológico com o meio empresarial. Em relação à propriedade intelectual, a Unicamp é a universidade brasileira que detém o maior número de patentes, com 475 pedidos depositados até maio de 2007, além de 66 marcas e 71 softwares. Desde que começou a funcionar, esse núcleo de inovação já proporcionou a assinatura de 24 contratos de licenciamento de 43 diferentes patentes.
O escritório de transferência de tecnologia, que desempenha no NIH o mesmo papel que a Inova realiza na Unicamp, centraliza todas as atividades de patenteamento e transferência. “Dessa forma, todo em qualquer acordo onde seja vislumbrada a possibilidade de surgir patente ou licenciamento é conduzido pelo escritório”, diz Rosana. “Já há uma cultura disseminada e todos os pesquisadores respeitam a posição do núcleo encarregado dos temas relacionados à propriedade intelectual”.
Segundo Rosana, alguns aspectos chamaram mais atenção no NIH. Um deles, é o acompanhamento do caminho percorrido pela tecnologia após o seu licenciamento. Um grupo de funcionários monitora tudo o que a indústria está fazendo. Cada um deles acompanha em média 200 contratos. Além das obrigações contratuais, o NIH verifica se o produto gerado pela tecnologia está realmente chegando ao público em condições adequadas. “Essa preocupação não é infundada, já que muitas vezes o autor da tecnologia não tem garantias sobre a qualidade do produto final”.
O trabalho de monitoramento também visa assegurar que todos os usuários da tecnologia estejam devidamente licenciados. “Se, por acaso, alguma empresa infringe uma patente, eles interferem imediatamente”, explica Rosana. Também há um acompanhamento rigoroso sobre os termos da licença, a fim de verificar se o que a empresa está reportando reflete o que foi planejado.
Outro aspecto que chamou a atenção, segundo Rosana, é o fato de o escritório de transferência de tecnologia ser financiado pelas unidades de pesquisa que compõem o Centro. “A consciência sobre a importância desse trabalho é tão grande que cada unidade tem um setor específico para interagir com o escritório”, conta. “Os pesquisadores sabem que sem esse trabalho a tecnologia desenvolvida dificilmente chega ao mercado”, completa.
Apesar dos contrastes com a realidade brasileira, Rosana considera que o trabalho desenvolvido pela Inova tem tudo para motivar uma mudança de mentalidade em relação à propriedade intelectual e transferência de tecnologia no país. “Por ser uma agência recente, a Inova ainda não pode pretender os mesmos resultados do NIH, mas indiscutivelmente há muitos aspectos em comum no que diz respeito à filosofia de trabalho”, pondera. O ideal, em sua opinião, seria disseminar o modelo da Inova em outros centros de pesquisa e universidades. “Com isso, todos sairiam ganhando”.