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CADERNO TEMÁTICO
Suplemento do Jornal da Unicamp 159

Número de brasileiros no ensino superior desaponta

Em 1999, o sistema incorporou 750 mil universitários
frente a uma demanda de 3,3 milhões de candidatos

Um aspecto evidente nos dados da Tabela 1 (veja nesta página) é o baixo número de matrículas no ensino superior no Brasil, fato que causa desapontamento para a mais forte economia da América Latina, com um PIB comparável ou superior ao de muitos países europeus. O pequeno número de matrículas não é necessariamente uma conseqüência de uma pequena demanda. Em 1999, o sistema incorporava 750.000 estudantes dentre uma demanda de 3.354.790 candidatos. Deve ser enfatizado que, considerando-se a população na faixa etária dos 18 aos 24 anos, há diferentes proporções de matrículas em diferentes regiões do Brasil; a mais alta proporção, próxima de 16%, corresponde ao Estado de São Paulo.

A Tabela 2 compara a população, o PIB anual/capita e a matrícula em educação superior pública e privada no Brasil, de modo geral, nas regiões Nordeste e Sudeste, e no Estado de São Paulo, o mais rico da Federação. A primeira coluna mostra a população (1996) e o PIB anual/capita (1998), para pessoas vivendo em diferentes locais. É visível que a renda e a matrícula no ensino superior estão distribuídos de forma desigual. A quantidade de matrículas segue estritamente a riqueza da região ou do estado.

Na mesma Tabela 2, as segunda e terceira colunas discriminam a contribuição de instituições públicas e privadas no ensino superior. Pode ser visto que: a) A contribuição de instituições privadas é dominante no Brasil; e b) A contribuição relativa de instituições privadas em estudos superiores é diretamente proporcional à riqueza da região. Em São Paulo, as instituições privadas respondem por 84% das matrículas, fato que constitui uma fonte de preocupação para nossas universidades públicas.

A primeira questão que vem à mente é: por que? São Paulo possui todas as condições para desenvolver um sólido sistema de educação pública. Por que isso não ocorreu? A preocupação cresce quando consideramos o número de matrículas nas três universidades paulistas, que incorporam 18.000 novos estudantes a cada ano, para uma demanda que ultrapassa 200.000 pessoas.

Investimentos

Pode ser argumentado que a fragilidade da educação no Brasil decorre de um financiamento deficiente. Os dados da Tabela 3, porém, indicam que nosso investimento em educação pública não é inferior a de outros países (a média mundial é de 4,9%). Pelo contrário, com exceção do Canadá, o Brasil é o que concede maior apoio à educação, em termos de porcentagem do PIB, entre as nações incluídas na comparação. Neste caso, e considerando os desempenhos educacionais relativos dos países selecionados, seguem duas questões:

1) É verdade que o Brasil gasta mais de 5% de seu PIB em educação? Há um debate sobre o tema, com argumentos sugerindo que os fundos efetivamente gastos na área são inferiores àqueles apresentados na Tabela 3. De qualquer forma, é evidente que investimos uma quantia pelo menos comparável às dos outros países da região.

2) A segunda consideração refere-se à eficiência do sistema educacional. Pelas Tabelas 1 e 3, pode ser argumentado que o Chile, por exemplo, possui um sistema eficiente porque, entre nações em desenvolvimento, apresenta um bom desempenho educacional global, confirmado também por sua posição relativamente boa no IDH (veja Tabela 1). É claro que não devemos embarcar nesta discussão de forma tão superficial: estamos certos que outros aspectos básicos devem ser considerados. No entanto, a análise do desempenho educacional de outros países é obrigatória para o Brasil.

Discussão

Não devemos mais adiar uma discussão profunda e abrangente sobre nossas práticas educacionais. Com honestidade e coragem, temos que admitir nossos erros passados e planejar formas de corrigi-los. A ineficiência está bastante relacionada com o desempenho sofrível do sistema educacional brasileiro.

Em outras palavras, a questão que permanece e constitui um dos importantes desafios para o século 21 é: como melhorar o uso dos fundos públicos alocados à educação? É certamente uma questão complexa, envolvendo aspectos da estrutura cultural, social e econômica do país. Mas ousamos apontar algumas medidas que podem contribuir para aperfeiçoar o desempenho global da educação terciária do Brasil nas próximas décadas.

Tabela 1 - Dados Educacionais do Brasil e alguns outros países selecionados

País

População

(x 106 ) Ä

Ensino Médio

(1995) #

Ensino Superior

(1995) ##

Posição no IDH

(2000) *

Brasil

165.85

45

11.3

79

Argentina

36.12

77

36.2

39

Chile

14.82

69

28.2

34

México

95.83

58

14.3

50

Índia

982.22

49

6.4

132

Coréia do Sul

46.11

101

52

30

Canadá

30.56

106

102.9

1

Ä Fonte: Nações Unidas, Revisão das Estimativas da População Mundial, 1998.

#, ## Proporções gerais de matrícula: nº total de matrícula no ensino médio (#) e superior (##) independente de idade, expresso como uma porcentagem da população nos grupos de idade de estudos secundários e terciários, respectivamente. Fonte: Relatório de Educação Mundial 1998, Unesco.

* Fonte: Indicadores de Desenvolvimento Humano, UNDP, N.Y., 2000.

 

Tabela 2 - Estrutura do ensino superior (graduação no Brasil)

 

População*

Inst. Pública#

Inst. Privada#

Total de Terciários#

BRASIL

157.070.163

(R$ 5.648/cap.)

832.022

(35%)

1.537.923

(65%)

2.369.945

Região Nordeste

44.766.851

(R$ 2.603/cap.)

243.062

(68%)

114.773

(32%)

357.835

Região Sudeste

67.000.738

(R$ 7.706/cap.)

293.431

(23,4%)

964.131

(76,6%)

1.257.562

Estado de São Paulo

34.119.110

(R$ 9.183/cap.)

121.415

(16,4%)

618.698

(83,6%)

740.113

* Fonte: IBGE, Brasil, 1996.

# Fonte: Censo de 1999, Inep-MEC, Brasíilia 2000, Brasil.

 

Tabela 3 - Despesas públicas com educação com uma fração do PIB (veja tabela 1)

Brasil

Argentina

Chile

México

Índia

Coréia do Sul

Canadá

5,2%

(1995)

3,5%

(1996)

3,1%

(1996)

4,9%

(1995)

3,4%

(1995)

3,7%

(1995)

7,0%

(1994)

Fonte: Anuário Estatístico, Unesco (1998)

 

Tabela 4 - Oportunidades para o ensino superior no Brasil e no Estado de São Paulo

 

Ensino médio concluído (1998)

Vagas em 1999 (públicas & privadas)

Candidatos (1999)

Candidatos/vagas

BRASIL

1.719.023

894.390

3.344.273

3,74

Região Nordeste

336.078

116.598

615.712

5,28

Região Sudeste

902.231

516.486

1.689.318

3,72

Estado de São Paulo (todas as instituições)

553.039

316.010

901.117

2,85

Estado de São Paulo: Univ. Púb. Estadual

---

17.538 vagas

241.101

13,75

Fonte: Censo sobre o ensino superior, Inep-MEC, Brasília, Brasil 1999.

 

Tabela 5 - Despesa pública por estudante de educação terciária como uma porcentagem do PIB/capita de diferentes regiões do mundo e da Unicamp

Total no mundo (113 países)

EUA

& Canadá

Europa Ocidental (16 países)

América Latina (18 países)

Unicamp

58,2%

23,9%

32,9%

27,2%

80%

Fonte: Relatório Educacional Mundial, Unesco (1998), Tabela 13, p.111, e Unicamp.

Ensino privado é negócio

Algumas avaliações sobre os dados da educação terciária no Estado de São Paulo aplicam-se a todo o país e comprovam que a grande maioria dos estudantes potenciais não encontra oportunidades educacionais. A Tabela 4 traz os dados de 1998/1999 referentes a:

1) pessoas que completaram o ensino médio em 1998;

2) o número de vagas oferecidas pelas instituições públicas e privadas no ano 1999, e pelas três universidades públicas estaduais do Estado de São Paulo (USP, Unesp e Unicamp);

3) o número de candidatos para estas vagas;

4) a proporção de candidatos/vagas em cada caso. A tabela indica que há uma enorme demanda para o ensino superior no Brasil, ainda que seja reduzida a fração de brasileiros que completam o ensino secundário a cada ano.

O grande número de candidatos, muito maior que o de estudantes concluindo o ensino médio, deve-se a duas razões: a) a maioria deles inscreve-se em mais de uma instituição; e b) aqueles que foram mal-sucedidos no vestibular continuam concorrendo por, pelo menos, mais um ou dois anos.

Outro aspecto é que a relação candidatos/vagas é inversamente proporcional à riqueza da região. Isto é conseqüência da oferta muito maior de vagas do ensino privado em regiões ricas, cujas instituições são bem mais favorecidas que as de regiões pobres (veja Tabela 2). Em outras palavras, no Brasil, assim como em muitos países do mundo, o ensino privado é um bom negócio.

Um terceiro ponto a destacar é que a relação candidatos/vagas altera-se bruscamente quando se considera as três universidades públicas estaduais do Estado de São Paulo, aumentando para quase 14. As razões são bem conhecidas; essas instituições oferecem as melhores oportunidades educacionais em graduação e pós-graduação, assim como em pesquisa acadêmica. As três respondem por quase 50% de todos os títulos de doutorado brasileiros concedidos em 1999.

Com base nos dados acima, conclui-se que a USP, a Unesp e a Unicamp, financiadas pelo governo paulista, são universidades altamente bem-sucedidas. Os recursos (um percentual do ICMS) destinados às instituições chegam a quase US$ 1,2 bilhão (ano de 2000), uma cifra expressiva em termos de financiamento universitário nos países em desenvolvimento. Este financiamento torna-se ainda maior se somados os fundos adicionais – equivalendo a aproximadamente 30% a 40% do orçamento – provenientes de agências de fomento estaduais e federais, de indústrias e da verba do sistema público de saúde.

Resumindo, as três universidades públicas paulistas são bem estruturadas e possuem ótimos padrões educacionais e de pesquisa, comprovados pelas freqüentes avaliações realizadas pelo Ministério da Educação.


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