| Edições Anteriores | Sala de Imprensa | Versão em PDF | Portal Unicamp | Assine o JU | Edição 317 - 27 de março a 2 de abril de 2006
Leia nesta edição
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Indústria de carne
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Gripe aviária
Seqüencia da malária
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Mandarim 12 e 13
Petróleo da Bacia de Santos
Ginástica na Febem
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Maurício Knobel
Datação geológica
 

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À esquerda: O prédio onde hoje está a DGA: ocupado a toque de caixa. Abaixo, o laboratório de Bioquímica; À direita: O galpão nos tempos do núcleo pioneiro do Instituto de Biologia: muito calor e improvisação

Professores do grupo pioneiro contam que alunos tinham aulas em pé, sob temperatura de 65ºC

Biologia: do galpão à genômica

ÁLVARO KASSABProfessor Humberto Rangel: fazendo as banquetas dos alunos

Um galpão encravado no meio do canavial não foi apenas o primeiro prédio a ser erguido no campus da Unicamp em Barão Geraldo. O local, onde mais tarde funcionaria a Diretoria Geral de Administração (DGA), abrigou o núcleo pioneiro do Instituto de Biologia (IB), criado oficialmente em 1969. Hoje um centro de renome internacional, o Instituto de Biologia é responsável por pesquisas de ponta nos campos da genômica, da bioinformática, da biodiversidade e da proteômica, entre outros exemplos.

História do IB não pode ser dissociada da
figura de Zeferino Vaz

A história do IB não pode ser dissociada da figura do professor Zeferino Vaz, fundador e primeiro reitor da Unicamp. Parasitologista de formação, Zeferino enxergava no Instituto de Biologia a possibilidade de concretizar o seu velho sonho de dirigir uma universidade orgânica, cuja concepção priorizava a interdisciplinaridade e a investigação científica.

Docentes dos primórdios do Instituto corroboram a tese. O professor Humberto Rangel, remanescente do grupo de pioneiros, era um dos egressos da Faculdade de Ciências Médicas, chegou em 1967 para dar aulas na Faculdade de Ciências Médicas, depois de uma passagem de dois anos pelo Instituto Pasteur, na França. A convite de Zeferino Vaz, Rangel passou a chefiar o Departamento de Microbiologia e Imunologia.

  A cadeira dada por Zeferino Vaz ao professor Luiz Augusto Magalhães: apoio à pesquisa (Fotos: Acervo Histórico do Arquivo Central (Siarq))Improvisação – Na verdade, todos os oito departamentos que formariam em 1969 o núcleo inicial do Instituto de Biologia pertenciam à FCM. (Mais tarde, em 1971, seria aprovada proposta de nova departamentalização feita pelo professor Friedrich Gustav Brieger, presidente da Comissão de Ensino. Os departamentos passaram a ser três, Biologia Geral, Zoologia e Botânica, subdivididos por setores). Desalojados da Maternidade de Campinas, onde a faculdade funcionava provisoriamente, os docentes ocuparam a toque de caixa o antigo prédio da DGA. Sob a direção do professor Walter August Hadler, primeiro professor contratado da FCM e chefe do Departamento de Histologia e Embriologia, os pesquisadores recorriam à improvisação para dar aulas.

Rangel, ainda hoje na ativa, não fugia à regra. Seu testemunho é revelador de um tempo em que a entrega de docentes, alunos e funcionários era fundamental para manter as coisas em funcionamento. O docente, com a ajuda de dois marceneiros, fez as banquetas individuais dos alunos e a bancada – uma tábua com quatro pernas – para o laboratório. Antes disso, os alunos assistiam às aulas em pé, em salas-laboratórios cujo tamanho não ultrapassava 20 metros quadrados. A primeira aula com cadeiras havia sido ministrada por Rangel num restaurante que funcionava em uma área contígua ao prédio.

No seu laboratório, a temperatura chegava a 65 graus centígrados em conseqüência da chama do bico de Bunsen e da telha de amianto que cobria o galpão. Num primeiro momento, os estudos estavam direcionados para a imunoquímica, reações cruzadas, determinantes antigênicas etc. Depois, ajustando as pesquisas às necessidades mais prementes do país, a doença de Chagas passou a ser o foco.

Cérebros – A situação começaria a mudar em 1971. Telhas de alumínio substituíram as de amianto. Rangel receberia uma escrivaninha e os primeiros equipamentos para pesquisa, entre os quais coletores de frações e espectrofotômetros, obtidos por ele junto à Fapesp. Zeferino havia lhe pedido duas coisas: que formasse pesquisadores e que conseguisse o material necessário para o desenvolvimento da pesquisa.

O fundador da Unicamp sabia que, recrutando docentes de renome, o resto viria naturalmente. Zeferino não escondia isso de ninguém. Rangel viu o primeiro reitor da Unicamp repetir com freqüência uma frase quando indagado sobre o que era necessário para se conceber uma boa universidade: “São cinco coisas – cérebro, cérebro, cérebro, cérebro e cérebro...”.

E foi justamente para formar cérebros que Rangel sentiu a necessidade de criar um de pós-graduação. Em 1971, depois de idas e vindas nos corredores da burocracia, o curso de pós-graduação em Imunologia seria reconhecido pelo Conselho Federal de Educação. A Unicamp ingressava então numa área na qual passaria a ser sinônimo de excelência – não por acaso é conhecida hoje como “Escola das escolas”.

Coube ao Instituto de Biologia inaugurar essa era. Atualmente, a pós-graduação do IB cobre praticamente todas as grandes vertentes das Ciências Biológicas. Seis programas rendem pesquisas que estão na vanguarda da área no país: Biologia Celular e Estrutural; Biologia Funcional e Molecular; Biologia Vegetal; Ecologia; Genética e Biologia Molecular; e Parasitologia. Atualmente, 691 alunos estão matriculados na pós-graduação do IB, sendo 280 no mestrado e 691 no doutorado. Ao longo da história do Instituto, chega a 2.461 o número de trabalhos apresentados e defendidos – 1.459 dissertações e 902 teses.

A cadeira – O professor emérito Luiz Augusto Magalhães, outro pioneiro, vê no sucesso do IB o dedo de Zeferino Vaz, que tinha aversão a cátedras e pregava abertamente a criação de departamentos e de institutos. Nomeado em dezembro de 1965 para a cadeira de Parasitologia da Faculdade de Ciências Médicas, Magalhães estava para assumir um ano antes um cargo na Universidade Nacional de Brasília, quando uma crise institucional resultou na demissão de quase todo o corpo docente da UNB. O convite para Magalhães transferir-se para Campinas foi feito pelo próprio Zeferino, que queria fazer da Unicamp o que não havia conseguido levar adiante como reitor da UNB.

Um episódio revela o quanto aquele “homem de baixa estatura, nariz adunco, presença marcante e experiência comprovada”, conforme documento escrito pelo próprio Magalhães, estava empenhado em concretizar seu projeto. Ao entrar pela primeira vez na sala do Departamento de Parasitologia, o docente constatou que havia apenas uma única cadeira no local. Sem ter a quem recorrer, Magalhães decidiu expor a situação a Zeferino. Para sua surpresa, o reitor cedeu ao professor a sua própria poltrona. A cadeira está até hoje na sala de Magalhães.

Nos meses seguintes, Zeferino providenciaria a compra de dezenas de lupas e microscópios, além de contratar funcionários e docentes para pôr em andamento as pesquisas do departamento. Magalhães seria, pouco menos de um ano depois de assumir o cargo, o autor da primeira tese defendida na Unicamp.

Uma das maiores autoridades em esquistossomose do país, Magalhães, hoje aposentado mas atuando como professor voluntário, vivenciou de perto todas as mudanças pelas quais passou o Instituto de Biologia, inclusive as primeiras aulas na unidade, ministradas no atual prédio da DGA. Muitas vezes, em dias de chuva, o docente era obrigado a dar carona, com a sua perua Veraneio, às pessoas que ficavam no meio do caminho no único acesso possível ao campus em formação – a atual avenida Ralph Tórtima, antiga avenida 1. Os ônibus atolavam e eram rebocados por tratores. Na primeira semana de aula, os banheiros não estavam em funcionamento e a rede de abastecimento de água ainda não havia sido totalmente instalada.

Todos sabiam que a precariedade era transitória. A palavra luxo, entretanto, não constava no vocabulário de Zeferino. Mesmo quando o Instituto de Biologia passou a funcionar em 1974 nas atuais instalações, no primeiro prédio de uma unidade erguido no campus, a funcionalidade jamais deu lugar à ostentação. Essas convicções foram sendo formadas ao longo da trajetória do fundador da Unicamp.

Máximas – Duas frases, ambas pinçadas por Magalhães, retratam fielmente a personalidade de Zeferino e o que ele pensava acerca do papel da Universidade. A primeira teria sido de autoria do fisiologista argentino Bernardo Houssay, prêmio Nobel de Medicina, que depois de visitar as dependências da USP na companhia de Zeferino, ignorou a diplomacia para vaticinar sem rodeios: “A gaiola é de ouro, porém o pássaro não canta”. A segunda é do próprio fundador da Unicamp, mas pode ser lida como uma extensão da anterior: “Os prédios da Universidade devem ser como monastérios, sólidos e austeros, porém habitados por competentes profissionais”.

O sucesso do Instituto de Biologia dá contornos premonitórios à fala de Zeferino. A unidade abriga hoje 11 departamentos: Anatomia; Biologia Celular; Bioquímica; Botânica; Fisiologia e Biofísica; Fisiologia Vegetal; Genética e Evolução; Histologia e Embriologia; Microbiologia e Imunologia; Parasitologia; e Zoologia. Sua graduação conta com 513 alunos, sendo 264 no Bacharelado e outros 271 na Licenciatura. A partir de 2004, o IB passou a compartilhar a coordenação do curso de Farmácia, juntamente com a Faculdade de Ciências Médicas (FCM), o Instituto de Química (IQ), e o Centro Pluridisciplinar de Pesquisas Químicas, Biológicas e Agrícolas (CPQBA).

Quatro órgãos complementares integram o conjunto do Instituto. São eles: o Herbário; o Museu de História Natural; a Biblioteca do IB, cujo acervo é o maior da Unicamp entre as bibliotecas setoriais; e o Laboratório de Microscopia Eletrônica.

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