Projeto de ginástica leva
boas sensações à Febem
RAQUEL DO CARMO SANTOS
Há três anos, o educador físico Henrique Sanioto lançou o desafio para as autoridades na Febem de Araraquara: iniciar um projeto de ginástica geral para os internos. Foi durante a inauguração da instituição, quando Sanioto levou um grupo de crianças da cidade de Matão para uma apresentação. A sua ousadia transformou-se em um projeto modelo que trouxe ótimos resultados para a qualidade da Febem. “O programa começou timidamente. No início, havia muitos preconceitos. Percebia que existia um sentimento de medo ou desconfiança”, lembra Sanioto. Hoje o trabalho cresceu e nas aulas semanais o educador conta com quase a totalidade de participação dos internos, além de já ter perto de 15 coreografias de variados estilos prontas e ensaiadas.
Os resultados da iniciativa foram tão positivos que o grupo consegue autorização judicial para fazer apresentações fora da instituição. Recentemente, os internos participaram da programação da 19º Bienal Internacional do Livro, no Anhembi, em São Paulo. “A auto-estima dos adolescentes cresceu e, mais do que o prazer de vê-los envolvidos com o projeto, foi constatar a melhora no comportamento. Houve uma quebra de paradigmas que se sobressaiu com a educação”, argumenta Henrique Sanioto. O programa também rendeu a dissertação de mestrado Contribuindo para a formação humana dos adolescentes da Febem por meio da ginástica geral, orientada pelo professor Jorge Sergio Perez Gallardo e apresentada na Faculdade de Educação Física (FEF) da Unicamp.
Por meio da ginástica geral envolvendo esportes, teatro, música e dança o educador físico buscou uma alternativa aos programas tradicionais de intervenção da Febem. “Esses programas se caracterizam por impor formas de conduta socialmente aceitas, com métodos restritivos e punitivos”, afirma. A proposta foi de trabalhar os valores humanos de convivência social, tendo como elemento mediador a cultura corporal dos internos. “A esperança é que a vivência transcenda as atividades realizadas, consolidando um alicerce social para a vida futura dos adolescentes”, acrescenta.
Os principais trabalhos realizados pelos internos foram O Maravilhoso Mundo do Circo, Olimpíadas da Cultura e Brasil meu Brasil Brasileiro. Em 2003, no início do projeto, as apresentações ocorriam apenas para os familiares nos períodos de visitas. Com o tempo, o grupo ganhou notoriedade e a confiança da Justiça, o que permitiu pequenas excursões para a mostra do trabalho. “Foi um sonho realizado, pois eu sabia que a partir das apresentações públicas o grupo ganharia força”, lembra. Foi justamente o que ocorreu. Circulando livremente sem as algemas, os adolescentes não causaram nenhum tipo de incidente nas várias saídas.
Em seu quarto ano de funcionamento, o projeto se consolidou como uma prática possível para esse tipo de instituição. Por isso, Henrique Sanioto espera escrever um livro sobre a experiência de trabalhar com os internos. Ao final da aula ou da apresentação, ele colhia as impressões dos alunos por escrito. “Os depoimentos são muito emocionantes. Para eles, tudo constitui um mundo novo de sensações”. Um dos casos marcantes foi a da mãe que ao ver o filho se apresentar, chorou copiosamente. O filho percebeu que era um choro diferente, e ouviu da mãe que antes ela chorava de tristeza por sua trajetória na marginalidade, mas que agora chorava de alegria ao vê-lo se apresentar.