Deficientes que não
entregam os pontos
Departamento da FEF desenvolve metodologia
pioneira na área
de atividades físicas adaptadas
ANTONIO
ROBERTO FAVA
Escalar
montanhas, descer cachoeiras, praticar mergulho e
ciclismo são algumas das atividades, além
do judô e do atletismo, que já se tornaram
rotina na vida de um grupo de alunos da Faculdade
de Educação Física (FEF) da Unicamp.
Até aí nada de mais, se eles não
fossem portadores de deficiências física
ou visual. E não é só: os alunos
ainda acrescentam em seus currículos a participação
em campeonatos internacionais como Pan-Americano,
realizado há dois anos na Carolina do Sul,
quando o Brasil acabou ficando em primeiro lugar no
geral, ganhando de países como o Canadá,
Estados Unidos e México. Este ano, o atleta
Aurélio Guedes dos Santos, deficiente visual
de 34 anos, classificou-se em 2º lugar na Maratona
de Tóquio, no Japão.
Atualmente, a FEF tem o Departamento
de Estudos e Atividades Físicas Adaptadas,
chefiado pelo professor Edison Duarte, cujo principal
objetivo é estudar, sob o ponto de vista acadêmico,
a atividade física da pessoa portadora de deficiência.
E os resultados, até o momento, têm sido
os melhores possíveis. A FEF trabalha hoje
apenas com deficientes de duas categorias: visuais,
com 20 alunos, entre 13 e 56 anos, e físicos,
com 18 adultos. Para o segundo semestre do próximo
ano deverão ser incluídas novas categorias,
como deficiência mental e auditiva.
A participação da
Faculdade em competições e eventos esportivos
tem sido bastante intensa, revelando nomes de atletas
como Fabiana Harumi Sugimori, 21 anos, com deficiência
visual, que se sagrou campeã paraolímpica
de natação, em Sidney, há dois
anos. Ou de Benedito Franco Leal Filho, o Neno, que
revelou extraordinário talento para liderar
e organizar competições. Neno foi fundador
da primeira Associação de Desportos
para Cegos, da região de Campinas.
Com essa iniciativa, o Neno
foi o grande responsável pela inclusão
de atletas cegos em competições internacionais,
entre elas a de Barcelona, Atlanta e Sidney,
diz o professor José Júlio Gavião
de Almeida, diretor-associado da FEF. Há a
ainda o Wellington Rodrigues, que participou da paraolimpíada
de Barcelona, sagrando-se campeão nos 100 e
200 metros. Junto de Wellington está Aurélio
Guedes, que participou da paraolimpíada de
Atlanta, de Sidney, em 2002, e do Japão, realizada
há seis meses, hoje considerado o melhor do
mundo na sua modalidade, segundo o professor Gavião.
Processo sistemático
De acordo com o professor Gavião, o esporte
manifesta-se de diferentes formas: o conhecido como
de alto rendimento, aquele em que o atleta treina
intensamente para as competições, e
a prática esportiva como processo de aprendizagem,
tal como a educação física escolar.
As pessoas com as quais a FEF trabalha, tanto
as deficientes físicas quanto as visuais, podem
utilizar-se do esporte como forma de aprendizagem,
de desenvolvimento, e não de treinamento exclusivo,
visualizando a performance de alto rendimento,
explica Gavião. No entanto, ressalta que há
atletas que praticam atividades de alto rendimento,
com o propósito de participar de campeonatos
estaduais e até mesmo internacionais, que compreendem
a maioria das modalidades esportivas.
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Os professores Edison Duarte (à esquerda)
e José Júlio Gavião de Almeida:
revelando campeões |
Segundo o professor Edison Duarte,
a FEF vem desenvolvendo uma série de trabalhos
bastante significativos. Os mais expressivos referem-se
aos destinados à formação de
recursos humanos na área de educação
física pesquisadores da área,
professores universitários, técnicos
e coordenadores esportivos em modalidades de âmbito
nacional, além de docentes atuando em associações
e instituições para portadores de deficiência.
A Unicamp é a Universidade
que mais tem formado mestres e doutores na área
de atividade física adaptada, diz Duarte.
Essa formação se desenvolve em várias
frentes. Quer dizer, tanto no que diz respeito às
pessoas que trabalham com pesquisa nas universidades
brasileiras, como as que atuam em associações
e federações esportivas, ocupando as
mais variadas funções, preparando seus
atletas para competições em campeonatos
internacionais e paraolimpíadas.
Intercâmbio O modelo de trabalho
com deficientes físicos e visuais, adotado
pela Unicamp, encontra similares desenvolvidos por
grupos de outras instituições de ensino
e pesquisa brasileiras. Temos observado que
a Universidade de Uberlândia é a que
mais se aproxima da Unicamp, diz Duarte. No
entanto, a instituição mineira, embora
dotada de indiscutíveis atributos, não
possui o mesmo nível de formação
que a Unicamp.
Dificilmente uma outra universidade
brasileira tem um trabalho sistemático como
o da Unicamp. Fora do Brasil, pelo menos na América
Latina, não há um trabalho com um programa
didático (ensino e pesquisa) inteiramente voltado
para o deficiente físico, visual, auditivo
ou mental, conclui o professor.
O que não acontece em alguns
países da Europa, principalmente a Bélgica,
na Universidade Católica de Leuven, considerada
o principal centro formador de recursos humanos para
todas as áreas da atividade física adaptada.
Vale ressaltar que o programa da Universidade de Leuven
engloba 25 outras universidades espalhadas pelo mundo.
Inclusive a Unicamp, com a qual mantém convênio
que prevê o intercâmbio de professores
entre os dois países. Por outro lado, já
se tornou rotina alunos de pós-graduação
e de doutorado da Unicamp freqüentarem os laboratórios
da Universidade de Leuven. O professor Duarte foi
um dos que ficaram na Bélgica durante um período
de quatro meses.
É preciso que se diga que
em termos de atividades esportivas, o grande parceiro
da Unicamp, quando se trata da inclusão de
deficientes visuais, é hoje a Sociedade Brasileira
de Desportos para Cegos. Paralelamente, há
ainda a participação do Comitê
Paraolímpico Brasileiro, que atua com todas
as deficiências físicas, auditivas,
visuais e mentais.
Por iniciativa de um grupo de professores
da própria Unidade, mais especificamente do
professor Paulo Ferreira de Araújo, a FEF criou,
em 1997, a Federação Paulista de Basquete
sobre Rodas, cujo principal propósito é
proporcionar a inserção de pessoas com
deficiência física em competições
estaduais, nacionais e até mesmo internacionais.
De modo geral, os nossos grandes parceiros são
as associações nacionais, como a IBSA
(Federação Internacional de Desportos
para Cegos) e o próprio Comitê Paraolímpico
Internacional, instituição que administra
o esporte de alto rendimento em nível nacional,
praticado por atletas portadores de todas as deficiências.
Modalidades para os deficientes visuais
A Faculdade de Educação
Física (FEF) da Unicamp tem um bem-estruturado
programa de atividades esportivas que se destina
aos alunos portadores de deficiência
visual.
Golball Jogo
praticado por atletas cegos ou com baixa visão,
cujo objetivo é arremessar a bola sonora
com as mãos no gol do adversário.
Cada time joga com três jogadores, e todos
os atletas usam vendas nos olhos.
Judô É
praticado por deficientes visuais de ambos os
sexos. A principal adaptação feita
para essa modalidade é que os atletas
iniciam o combate já com a pegada
no companheiro.
Atletismo Os
deficientes visuais realizam a maioria das provas,
com exceção das que contêm
barreira. As provas de 100 são corridas
individualmente. Nas corridas, os atletas cegos
ou com pequeno resíduo visual correm
acompanhados de um guia que, nas competições
internacionais, são atletas convencionais,
também de alto nível, para que
possam acompanhar os deficientes visuais.
Futebol de salão
As equipes de atletas são divididas
em cegos totais apenas o goleiro enxerga
perfeitamente e aqueles que possuem pouca
visão. Na categoria de cegos, todos os
atletas deverão estar vendados. As regras
são basicamente as mesmas do esporte
praticado pelo não-deficiente.
Natação
Participam todas as categorias. A principal
adaptação para essa modalidade
é feita na virada, quando
o técnico poderá avisar sobre
a proximidade da piscina, por meio de um toque
com um cabo de madeira ou outro material com
ponta de espuma. Os nadadores deficientes deverão
nadar com óculos tipo blackout.
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