Nas plantas, a busca
por novos antibióticos
Pesquisadores do CPQBA estudam propriedades
de espécies medicinais e aromáticas
com base no uso popular
MANUEL
ALVES FILHO
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As pesquisadoras Marta Cristina Teixeira Duarte
(à esquerda) e Glyn Maria Figueira: selecionando
compostos |
Estudo conduzido por especialistas
do Centro Pluridisciplinar de Pesquisas Químicas,
Biológicas e Agrícolas (CPQBA) da Unicamp
está investigando as propriedades antimicrobianas
de extratos e óleos essenciais extraídos
de plantas medicinais e aromáticas. O objetivo
da pesquisa, orientada a partir do uso popular dessas
espécies, é identificar o princípio
ativo das substâncias, para o desenvolvimento
de novos antibióticos. Estes seriam utilizados
como alternativa no combate a microrganismos que causam
prejuízos à saúde humana e que
se mostram resistentes aos medicamentos presentes
no mercado. A expectativa dos pesquisadores é
que o trabalho esteja encerrado dentro de um ano.
As propriedades antimicrobianas
de substâncias extraídas de plantas têm
sido reconhecidas empiricamente ao longo de séculos,
e vêm sendo comprovadas pela ciência recentemente.
De acordo com pesquisas realizadas em vários
países, entre eles o Brasil, detentor de uma
das maiores biodiversidades do mundo, extratos e óleos
essenciais de algumas espécies mostraram-se
eficientes no controle do crescimento de microrganismos.
A investigação que está sendo
realizada pela equipe do CPQBA percorre o mesmo caminho,
mas pretende ir um pouco além. Mais do que
comprovar a atividade antimicrobiana e identificar
o princípio ativo dessas substâncias,
os pesquisadores querem selecionar compostos que possam
atuar em alvos diferentes daqueles atacados pelos
antibióticos convencionais.
A proposta, embora envolva processos
complexos, é relativamente simples. A equipe
do CPQBA quer chegar a substâncias capazes de
atingir os pontos fracos de bactérias e fungos
patogênicos, que não são afetados
pelos antibióticos presentes no mercado. Para
isso, os cientistas partiram da análise de
50 espécies que fazem parte da coleção
de plantas da própria unidade de pesquisa.
Estas foram avaliadas segundo a concentração
mínima inibitória contra dez bactérias
e mais a levedura Candida albicans. Destas, sete apresentaram
bons resultados e passaram a ser estudadas também
sob o ponto de vista da sazonalidade (veja quadro).
Queremos saber qual a melhor época do
ano para coletar essas plantas, tendo em vista o rendimento
e possíveis ganhos para o seu princípio
ativo, explica a bióloga Marta Cristina
Teixeira Duarte, coordenadora do projeto, que conta
com financiamento da Fundação de Amparo
à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp).
De acordo com ela, o trabalho, que
tem um forte caráter interdisciplinar, está
no estágio intermediário. Enquanto a
engenheira agrônoma Glyn Maria Figueira estuda
a questão da sazonalidade, o químico
Adilson Sartoratto promove a análise química
dos compostos extraídos das plantas, para verificar
quais deles são majoritários. Esta atividade
conta, ainda, com a colaboração da também
química Vera Lucia Garcia Rehder. A etapa seguinte
envolverá o fracionamento dos extratos e óleos
essenciais. O objetivo é identificar que fração
é responsável pela ação
antimicrobiana. Para testar esta atividade, os especialistas
inoculam o microrganismo num meio de cultura, que
é colocado sobre uma placa de cromatografia
em camada delgada, onde foram aplicados os compostos
extraídos das plantas (método de bioautografia).
Em seguida, é promovida uma
série de análises para medir a concentração
mínima inibitória das substâncias
naturais que se mostraram ativas. O resultado é
comparado com o obtido para um antibiótico
padrão. Assim, temos um parâmetro
de quanto um e outro é capaz de inibir o crescimento
dos microrganismos, esclarece Marta. De acordo
com ela, os microrganismos tomados para estudo pela
equipe do CPQBA são responsáveis por
vários problemas de saúde, como diarréia
e enfermidades cutâneas, para ficar apenas em
dois exemplos. Nossa expectativa é chegar
a uma ou mais substâncias que apresentem efeitos
tão bons contra essas doenças quanto
os antibióticos comerciais, diz Glyn.
Ela acrescenta, ainda, que as pesquisas
em torno das propriedades antimicrobianas das plantas
medicinais e aromáticas não deverão
parar por aí. Conforme a engenheira agrônoma,
existem espécies que compõem a coleção
do próprio CPQBA que ainda não foram
estudas sob essa perspectiva. Além disso, como
já foi dito, o Brasil tem uma biodiversidade
riquíssima. Nesse campo da ciência,
nós ainda temos muito mais perguntas do que
respostas, destaca. A investigação
conduzida pela equipe de especialistas da Unicamp
se reveste de grande importância, em vários
aspectos.
Primeiro, porque busca uma alternativa,
que pode se mostrar mais barata, de combate a microrganismos
patogênicos resistentes aos medicamentos convencionais.
Segundo, porque coloca o Brasil entre os países
que procuram desenvolver novas tecnologias na área
de fármacos, setor que movimenta bilhões
de dólares anualmente. Se o país não
se mantiver nesse grupo, ficará eternamente
dependente. Terceiro, e não menos importante,
porque forma pessoal altamente qualificado. O estudo
do CPQBA, por exemplo, já gerou outros trabalhos
paralelos, cujos responsáveis são estudantes
de graduação e pós-graduação.