Edições Anteriores | Sala de Imprensa | Versão em PDF | Portal Unicamp | Assine o JU | Edição 238 - de 17 a 30 de novembro de 2003
Leia nessa edição
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Diário de Lisboa
Radiografia: C&T no Brasil
Água: fungos e bactérias
Estudo: efeitos contra gota
Mais velho e mais urbano
Demógrafos: o fio da navalha
Capacitação de professores
Comunicações opticas
Brasil: capitalismo tardio
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Vaca mecânica: 2° geração
Genômica: mapeando células
 

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Livro radiografa C&T no Brasil
Publicação reúne artigos de 23 autores e vai ser lançada
dia 17 em seminário na Unicamp

CLAYTON LEVY

Erney Camargo, presidente do CNPq, vai apresentar os programas do órgão durante o seminário

Quanto governo e iniciativa privada investem em ciência e tecnologia no Brasil? Quantos profissionais trabalham atualmente em pesquisa e desenvolvimento? Qual a evolução da produção científica brasileira nos últimos anos? Quais as áreas que mais avançam? Em que medida esta evolução tem resultado efetivamente em desenvolvimento tecnológico? Qual o ritmo da inovação tecnológica nas empresas?

As respostas para estas e outras perguntas estão reunidas no livro Indicadores de Ciência, Tecnologia e Inovação no Brasil, que a editora da Unicamp lança no dia 17 de novembro, no auditório da Biblioteca Central do campus. Apresentando dados inéditos, a obra faz uma radiografia do sistema de C&T no país, confirmando um cenário que expressa profundas distorções. Embora a participação do Brasil na produção científica mundial tenha aumentado de modo significativo nos últimos 20 anos, o país ainda não conseguiu transformar o conhecimento acumulado em tecnologia capaz de gerar riqueza e desenvolvimento.

Com cerca de 600 páginas, recheadas de gráficos e tabelas, a publicação reúne artigos de 23 autores. Entre eles, cinco são da Unicamp: o reitor Carlos Henrique de Brito Cruz e os professores Eliane Franco, Fernando Sarti, Rodrigo Sabbatini e Ruy Quadros. A organização ficou por conta do economista Eduardo Baumgratz Viotti, professor da Universidade Federal de Brasília (UnB) e consultor legislativo do Senado Federal para as áreas de políticas de Ciência, Tecnologia e Meio Ambiente (leia entrevista nesta página). O economista, professor da Unicamp e secretário executivo do ministério da Ciência e Tecnologia no governo FHC, Carlos Américo Pacheco, assina a apresentação da obra. A iniciativa partiu do MCT, com apoio da Confederação Nacional da Indústria (CNI) e Instituto Brasileiro de Qualidade e Produtividade (IBQP).

Para marcar o lançamento do livro, a Pró-Reitoria de Pesquisa da Unicamp organizou o seminário “Indicadores de Ciência, Tecnologia e Inovação no Brasil”. O evento terá a participação do presidente do Conselho Nacional de Pesquisa e Desenvolvimento (CNPq), Erney Camargo, que apresentará os programas do órgão e responderá a perguntas da platéia.

Também participarão seis dos 23 autores que assinam os trabalhos publicados. São eles: o reitor da Unicamp, o organizador da obra, e os professores Jacqueline Leta e Sandoval Carneiro Júnior, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), que falarão sobre produção científica e pós-graduação, e os professores Eduardo da Mota e Albuquerque, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Ruy Quadros e Rodrigo Sabbatini (Unicamp), que enfocarão a questão de patentes, inovação e conteúdo tecnológico das exportações e importações.

“Nosso crescimento tem fôlego curto”

Favorecer a criação de uma cultura em indicadores de ciência e tecnologia (C&T) e pesquisa e desenvolvimento (P&D) no Brasil. Com esse objetivo, os economistas Eduardo Baumgratz Viotti (UnB) e Mariano de Matos Macedo (UFPR) passaram os últimos dois anos organizando artigos e dados levantados por alguns dos maiores especialistas brasileiros em produção científica e desenvolvimento tecnológico. O resultado, reunido no livro Indicadores de Ciência, Tecnologia e Inovação no Brasil, agrega dados que podem auxiliar na definição de políticas para C&T e P&D no país. Em entrevista ao Jornal da Unicamp, Viotti falou sobre o trabalho e das expectativas para o setor.

JU—Qual o objetivo desse trabalho?
Viotti –Com esse trabalho, pretendemos fazer um balanço sobre o esforço para a constituição de um sistema de indicadores sobre C&T e P&D no Brasil. Além de sistematizar as informações disponíveis, apresentamos propostas para aperfeiçoar esse sistema.

JU—Os trabalhos são inéditos?
Viotti – Esse trabalho traz informações inéditas, mas esse ineditismo varia em função dos capítulos. Alguns deles tratam de indicadores já conhecidos, como por exemplo os números sobre investimentos em C&T. Mas há capítulos que tratam de indicadores novos, como o referente a recursos humanos na área de C&T e P&D.

JU – O senhor acredita que esse tipo de publicação pode funcionar como uma ferramenta para nortear a definição de políticas para C&T?
Viotti – Entendo que sim. Uma das preocupações que tivemos desde o início foi tentar tornar um pouco mais sólidas as bases empíricas do debate sobre C&T no Brasil.

JU – O trabalho revela que houve crescimento na produção científica nacional, principalmente através de artigos publicados, mas esse aumento não se transformou em desenvolvimento tecnológico, já que o número de patentes brasileiras ainda é baixo. Como enfrentar essa situação?
Viotti –Diria que reverter essa situação constitui o grande desafio de nossa política científica e tecnológica para os próximos anos. Temos de descobrir como mobilizar a capacidade das empresas brasileiras para gerar desenvolvimento tecnológico.

JU – O desafio de transformar conhecimento em tecnologia?
Viotti –Isso mesmo. Há um descasamento entre essas duas coisas. A esperança é que o crescimento dessa produção científica, que está associado ao aumento na formação de doutores nas últimas duas décadas, possa resultar de alguma forma num maior desenvolvimento tecnológico da indústria brasileira e na geração de patentes. Mas no meu entendimento, isso não acontecerá de forma natural.

JU –Dependerá do que para acontecer?
Viotti – De políticas para o setor. É necessário que o país tenha uma política ativa de ciência, tecnologia e inovação, capaz de fazer essa capacidade crescente frutificar em termos de desenvolvimento tecnológico.

JU – O livro, aliás, também aborda indicadores sobre o conteúdo tecnológico da pauta de exportações brasileiras.
Viotti –O estudo mostra em diversos aspectos que, com exceção da Embraer, o crescimento nas exportações brasileiras se deu principalmente em produtos de baixo conteúdo tecnológico e baixo valor agregado, como carnes, açúcar e óleo de soja. Isso é bom, mas por outro é problemático porque são produtos que crescem no mercado internacional a uma taxa muito pequena. Na última década, a taxa de crescimento desses produtos no mercado internacional foi de apenas 0,5% ao ano. Isso significa que o nosso crescimento nessas áreas tem fôlego curto, enquanto produtos de maior complexidade tecnológica crescem a taxas que chegam a 20% ao ano. Precisamos desenvolver um esforço, e esse é um esforço da empresa brasileira e do governo, para aumentar o conteúdo tecnológico dos produtos da nossa pauta de exportações.

JU – Mas isso depende da conjuntura econômica.
Viotti – Claro. Não é algo simples de se fazer. No passado, havia a esperança de que a simples liberalização do comércio traria resultados significativos. E, hoje, uma das grandes preocupações dos analistas decorre do fato de que o resultado não foi o esperado. Para que o país continue aumentar as exportações temos de aumentar o valor agregado de nossos produtos, participar de mercados para produtos de maior conteúdo tecnológico, que crescem a taxas maiores. Isso tem de resultar de um esforço articulado entre o governo e o setor empresarial.

 

Os números de um desafio

Os números revelados pelo livro também impõem um desafio para o Brasil: estabelecer políticas adequadas para que a crescente produção científica resulte em desenvolvimento tecnológico. De 1981 a 2000, o número de artigos científicos publicados por autores nacionais subiu 400%, passando de 1.889 para 9.511. Com isso, em apenas 20 anos, a participação do Brasil na produção científica mundial passou de 0,44% para 1,44%.

Apesar da evolução numérica da produção científica nacional, em 2000 foram registradas apenas 98 patentes brasileiras nos Estados Unidos, enquanto a Coréia do Sul, que tem uma produção científica equivalente à brasileira, registrou 3,3 mil no mesmo ano. Ou seja, o Brasil já sabe fazer ciência, mas ainda não aprendeu a transformá-la em crescimento econômico.

O livro também apresenta o resultado de um cuidadoso esforço de revisão das séries históricas referentes aos investimentos públicos em P&D, além do primeiro levantamento sobre dispêndios da iniciativa privada no setor. Os números mostram que os recursos destinados pelo governo federal caíram de R$ 2,49 bilhões em 1996 para R$ 2,36 bilhões em 2001, o que equivale a uma taxa média de variação negativa de 1,04% ao ano.

De acordo com o levantamento, tal decréscimo ocorreu basicamente entre 1996 e 2000, já que em 2001 ocorreu uma forte recuperação (+ 8,69%), em razão da entrada em operação dos Fundos Setoriais do MCT. Já os dispêndios com pós-graduação foram estimados em R$ 1,74 bilhão em 1999 e R$ 1,87 bilhão para o ano 2000. No campo da iniciativa privada, levantamento inédito feito pela Pesquisa Industrial de Inovação Tecnológica (Pintec) revelou que o valor dos dispêndios do setor em P&D no ano 2000 foi da ordem de R$ 4,5 bilhões.

Embora os investimentos em P&D ainda estejam muito longe do ideal, o livro revela alguns indicadores animadores. Um deles é a publicação, pela primeira vez no país, de uma estimativa sobre recursos humanos em C&T, realizada de acordo com o Manual de Camberra, que é a metodologia internacionalmente utilizada para este tipo de levantamento.

Esse número foi estimado em 12,5 milhões de pessoas em 1999, o que, segundo o estudo, é um montante expressivo. “É, por exemplo, superior ao dos 15 países da União Européia, tomados individualmente, com exceção da Alemanha, que possuía 18 milhões até aquele ano”, diz o livro.

Em termos relativos, porém, os recursos humanos brasileiros representavam em 1999 apenas 15,7% do total da população economicamente ativa, o que representa uma proporção inferior a todos os países da União Européia.

 

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