Edições Anteriores | Sala de Imprensa | Versão em PDF | Portal Unicamp | Assine o JU | Edição 272 - de 25 a 31 de outubro de 2004
Leia nessa edição
Capa
Vlado e o fim da ditadura
Parto de cócoras
Prêmio Jovem Cientista
Ciência & Cotidiano
Comunicação para todos
Oswald de Andrade
Diário da Cátedra
Um arranhão de gato
Painel da semana
Teses da semana
Unicamp na mídia
Morte com naturalidade
Ciência + Paraolimpíadas
 

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Aumenta o número de adeptos de método alternativo
implantado há mais de 20 anos por professores da FCM

Parto de cócoras:
nasce a segunda geração



PAULO CÉSAR NASCIMENTO


Marina Teza Proni, com o filho Yan no colo, ao lado da mãe, Cecília: a história se repete (Fotos: Antoninho Perri)Yan Mello é um bebê sadio de 26 dias e, envolvido pelos braços da mãe, Marina Tereza Weishaupt Proni, 18 anos, dorme profunda e serenamente. Ele acaba de entrar para a história de uma experiência pioneira de parto alternativo desenvolvida há cerca de 20 anos no Centro de Atenção Integral à Saúde da Mulher (Caism) da Unicamp. O menino representa a segunda geração de crianças nascidas na unidade por meio do parto de cócoras, já que Marina também veio ao mundo desse modo depois que sua mãe e avó de Yan, Cecilia Tereza Weishaupt Proni, tornou-se uma das primeiras pacientes do serviço. O feito é comemorado pelo Grupo de Parto Alternativo (GPA) do Caism, sobretudo porque o método ganha cada vez mais adeptos entre casais que procuram dar à luz os filhos por meio de um parto não-convencional. Dez anos após sua criação o grupo atendia no máximo a oito casais. Hoje, cerca de trinta casais em média participam das atividades preparativas para o parto de cócoras.

30 casais em média integram o grupo

Adepta do naturalismo, Cecilia soube do trabalho do grupo quando fazia o mestrado em Física, na Unicamp. Formada em Engenharia Química pela Universidade, trabalhava em Lorena, na região do Vale do Paraíba (SP), e freqüentava os encontros preparativos nas vezes em que vinha para Campinas.

Sílvia Cordeiro, Cláudia Lucena e Franklin Braga: método mais fisiológico e confortável para mãe e bebê “Foi minha irmã quem me estimulou a fazer o parto natural após ter conhecido técnicas de parto na água no exterior. Ela me perguntou porque eu, sendo naturalista, não tentava algo semelhante no Brasil. A partir daí, passei a amadurecer a idéia”, conta Cecilia.

Os argumentos do GPA para a adoção do parto de cócoras como método mais fisiológico e confortável para mãe e bebê logo convenceram Cecília. Outro aspecto que a encantou foi a ênfase na participação do companheiro durante o trabalho de parto. Motivada e apoiada pelo marido, Marcelo, ela deu à luz não apenas Marina como também a segunda filha do casal, Mariana Tereza, três anos depois.

“Foram experiências maravilhosas”, avalia, tanto que incentivou a primeira filha a fazer o mesmo quando esta engravidou. “Propus que ela buscasse mais informações sobre o parto vertical para poder decidir melhor, mas desaconselhei a cesariana se não precisasse”, recorda-se Cecilia.

Marina procurou o GPA e, a partir das informações transmitidas em palestras e vídeos e do contato com outras grávidas do grupo, decidiu repetir o feito da mãe. Ela conta que não tinha mesmo intenção de recorrer ao parto cirúrgico e também considerava o parto natural horizontal desconfortável e muito desgastante para a gestante.

Amigos e familiares de Marina torceram o nariz para a decisão da jovem. Até o marido, Roberto, também estranhou e preferia que a esposa optasse pela cesariana.

“Mas as dúvidas e restrições que ele tinha se dissiparam nos encontros preparativos”, revela Marina, estudante de design.

Adeptos do Grupo de Parto Alternativo reunidos no Caism: modelo vem sendo adotado por outras maternidadesQuando Yan nasceu, após 41 semanas de gestação, Roberto estava ao lado da mulher na cadeira especialmente desenvolvida para a atividade, amparando-a e auxiliando no controle das contrações. Foi ele quem também cortou o cordão umbilical e ajudou a entregar o filho para a mãe.

Ainda é cedo para dizer se Mariana, 15 anos, pretende engravidar e se também optará pelo método. Porém, se depender da vontade e do estímulo da mãe e da irmã, a família continuará crescendo com a ajuda do parto de cócoras.

Com a força da gravidade

Os especialistas do GPA defendem que, agachada, a mulher garante uma força de puxo maior para a expulsão do feto. “A força da gravidade colabora demais, além do que a parturiente, em geral, conta com melhores condições perineais que no parto convencional”, destaca Franklin. Contudo, ele faz questão de observar que esses são argumentos do grupo, e que obrigatoriamente não precisam coincidir com a opinião do Departamento de Obstetrícia da FCM.

Controvérsias à parte, os responsáveis pelo programa sustentam que a posição de cócoras é mais fisiológica que as demais e traz crianças ao mundo com um estado de saúde melhor.

“O GPA tem evidências de que é uma posição que respeita a fisiologia do mecanismo do parto e permite à mulher ter um estímulo extra para a sua preparação. Os incômodos da posição de cócoras são eliminados com a utilização de uma cadeira especializada no momento do parto”, esclarece Franklin.

Desenvolvida na Unicamp, a cadeira tanto pode ser utilizada durante a realização de partos de cócoras como em outros tipos de partos. De fácil manutenção, é feita de material de fibra de vidro, o que permite lavagem após o parto. A sala onde ocorre o procedimento também foi projetada para o parto em posição vertical. Possui uma elevação de 50 cm onde está colocada a cadeira, permitindo que companheiro permaneça junto à gestante, auxiliando nos momentos em que ela adota a posição de cócoras. Na parte inferior fica a equipe médica.

Esses modelos de cadeira e sala de parto estão sendo adotados por outras maternidades no Estado de São Paulo, como também em outros estados e fora do País. Desde setembro, por exemplo, Hugo Sabatino encontra-se na Espanha, onde participa de um intercâmbio com duas universidades para apresentar a inovadora experiência brasileira do parto alternativo em hospital público.

Participação de companheiro é estimulada

O Grupo de Parto Alternativo (GPA) foi criado em 1981 por docentes do Departamento de Tocoginecologia e profissionais da área de saúde da Faculdade de Ciências Médicas (FCM) da Unicamp.

Coordenado pelo professor e obstetra José Hugo Sabatino, um dos precursores do parto de cócoras no Brasil, tem como colaboradores o anestesista Franklin Braga, a psicóloga Sílvia Cordeiro e a fisioterapeuta Cláudia Lucena, todos voluntários, a exemplo de outros profissionais da equipe multidisciplinar de atendimento formada ainda por médicos de outras especialidades, enfermeiros e nutricionistas.

“A principal característica do grupo é oferecer uma conduta diferente das tradicionalmente adotadas no atendimento à gestante, valorizando o aspecto humano, trabalhando não apenas com a mulher, mas estimulando a participação do companheiro em todas as fases da gestação, sem abandonar os conceitos teóricos e científicos característicos do atendimento em uma maternidade”, ressalta Franklin.

Segundo ele, todas as grávidas que fazem seu pré-natal no Caism têm a oportunidade de participar do GPA. A única exigência é não apresentar risco gestacional grave. A opção de ingressar no grupo é feita de maneira livre e espontânea pela gestante, e caso não se sinta segura o suficiente para o parto de cócoras, poderá optar por outro método mesmo após todos os preparativos realizados. E uma gestante que tenha todas as condições clínicas indicativas para o parto vertical poderá fazê-lo mesmo não tendo participado do grupo.

Homens grávidos – O GPA desenvolve atividades teóricas e práticas a partir do terceiro mês da gestação, no período noturno, para permitir a participação do companheiro, incluindo preparo físico da mulher e preparo psíquico do casal, palestras e visitas à maternidade do Caism, entre outras.

“As palestras são realizadas por profissionais que trabalham no Caism, o que contribui para aumentar o vínculo entre os casais e as pessoas que participarão do atendimento durante a internação e o parto. As visitas à maternidade ajudam a gestante a se familiarizar com o local onde será atendida”, explica Sílvia. “Essas ações diminuem o medo das gestantes do ambiente hospitalar, e, conseqüentemente, diminui o nível de tensão do casal”, complementa a psicóloga.

O grupo também enfatiza a participação do companheiro em todas as fases da preparação, para que ele deixe de ser um acompanhante passivo e atue de maneira eficaz durante o trabalho de parto, transmitindo segurança, carinho e apoio à gestante.

Em uma das atividades simula-se a gravidez dos homens. Com uma bexiga cheia de água presa à barriga, contendo um boneco e sustentada por uma bacia plástica, eles são convidados a executar diferentes movimentos (caminhar, sentar, deitar e se olhar no espelho) e podem vivenciar sensações e dificuldades de uma gestação de cinco meses.

Endorfinas – São ainda realizados exercícios físicos para desenvolver ou melhorar a musculatura perineal e grupos musculares que serão mais solicitados quando a mulher adotar a posição de cócoras no momento do parto e aumentar a produção de endorfinas (substâncias analgésicas produzidas pelo próprio organismo que se encontram aumentadas nas grávidas que realizam atividade física).

“O aumento das endorfinas permitirá que no momento do parto as contrações sejam melhor toleradas”, esclarece Franklin.

Embora o grupo realize 70% de partos normais, sem necessidade de drogas analgésicas ou anestésicas, Braga desenvolveu uma técnica que permite aplicar analgesia nas gestantes que não conseguem tolerar as contrações sem, contudo, comprometer a atividade motora das pernas para o parto de cócoras.

“Constatamos que cerca de 3% das gestantes desistiam do método por não suportar as dores das contrações. Isso era motivo de frustração para elas, mas com a técnica é possível manter a atividade, sem risco para a mãe e para a criança”, salienta o anestesista.

Além disso, observa ele, a sala de parto vertical está equipada com todos os recursos técnicos das outras salas de parto, o que permite modificar a rotina de atendimento, quando necessário.

Esse aspecto é valorizado por Cecilia, que destaca a importância de o parto alternativo ser executado dentro de um centro médico com a infraestrutura como a proporcionada pelo Caism. Mesmo que todos os procedimentos tenham sido tomados para o nascimento do bebê com o mínimo de interferência médica, há casos que possam requerer uma intervenção de urgência.

“A Marina teve uma hemorragia muito forte na passagem do bebê pelo canal vaginal e necessitou de atendimento médico após o parto. A complicação foi logo controlada e ela recuperou-se rapidamente”, lembra a mãe.


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