Edições Anteriores | Sala de Imprensa | Versão em PDF | Portal Unicamp | Assine o JU |Edição 274 - de 24 de novembro a 5 de dezembro de 2004
Leia nessa edição
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Diário da Cátedra
Brito na Fapesp
Luz no risco de novo apagão
Pancada na classe média
Democracia brasileira
Prêmio: cooperação científica
Formatura: 7 espetáculos
Produção de insulina
Painel da semana
Teses da semana
Unicamp na mídia
Contaminação da água
Pecados da carne
 

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Pesquisa otimiza extração da pré-insulina
a partir do endosperma de milho geneticamente modificado

Técnica pode reduzir
custos de produção da insulina



MANUEL ALVES FILHO


O professor Everson Alves Miranda e a engenheira química Cristiane Sanchez Farinas: (Fotos: Antoninho Perri)Pesquisa conduzida por cientistas do Departamento de Processos Biotecnológicos (DPB) da Faculdade de Engenharia Química (FEQ) em colaboração com o Centro de Biologia Molecular e Engenharia Genética (CBMEG), ambos da Unicamp, proporcionou a otimização do processo de extração da pró-insulina humana recombinante produzida no endosperma do milho transgênico. A investigação, que deu seqüência aos estudos iniciados pelo professor Adilson Leite, morto em fevereiro de 2003, obteve resultados que corroboram a viabilidade econômica do uso de plantas como biorreatores. De acordo com Everson Alves Miranda, docente da FEQ e coordenador do trabalho, a Agência de Inovação da Unicamp (Inova) já está estudando o registro da patente do processo.

Ao aprimorar o modelo de recuperação da pró-insulina humana recombinante no milho transgênico, os pesquisadores da Unicamp têm como meta a redução dos custos de produção da insulina. A pró-insulina, lembra o professor Everson, é a precursora da insulina, indispensável no tratamento de alguns tipos de diabetes. A doença é muito prevalente entre a população. Entretanto, o preço do hormônio no mercado é alto. Um quilo do produto está cotado em cerca de US$ 100 mil. Conforme a engenheira química Cristiane Sanchez Farinas, que participou da pesquisa e desenvolveu sua tese de doutoramento em torno dela, o mercado mundial da substância foi da ordem de US$ 4,5 bilhões em 2002.

Cristiane e Everson explicam que os processos de extração e purificação da pró-insulina recombinante obedecem a cerca de 27 passos. A pesquisa em questão concentrou-se basicamente na primeira etapa, ou seja, na recuperação do bioproduto a partir do endosperma do milho geneticamente modificado. Tratou-se, portanto, de um trabalho de engenharia, dado que a parte de biologia molecular ficou a cargo dos especialistas do CBMEG, que forneceram a farinha do grão transgênico para a pesquisa. Ao otimizar a extração da pró-insulina, afirmam os cientistas, a tendência é que as fases subseqüentes, até a obtenção dos cristais de insulina, que servirão de insumo para as indústrias farmacêuticas, sejam facilitadas.

Cristiane destaca que existe um grande número de estudos envolvendo o uso de plantas como biorreatores. Atualmente, existem perto de 100 proteínas que são expressas em variadas espécies vegetais. Três delas já são vendidas no mercado norte-americano. No entanto, ainda há poucas pesquisas acerca da recuperação e purificação dos bioprodutos. “Nossa preocupação foi justamente trazer contribuições para essa área. Procuramos desenvolver um processo que fosse ao mesmo tempo seguro, eficiente e de baixo custo. Felizmente, obtivemos um resultado bastante positivo”, diz o professor Everson.

Para alcançar o objetivo traçado, os pesquisadores primeiro fizeram uma rigorosa seleção dos solventes. Depois, eles se valeram de um planejamento fatorial capaz de avaliar a influência da temperatura, da razão volume-massa, do tempo e da velocidade de rotação do impelidor (que promove a agitação da suspensão farinha-solvente) na eficiência da extração. Além disso, analisaram o conteúdo de impurezas no extrato, como carboidratos, compostos fenólicos e proteínas, objetivando a minimização de tais interferentes no trabalho de purificação.

Os valores máximos de concentração do bioproduto, de acordo com o professor Miranda, foram de 20 microgramas por mililitro ou 0,45% da proteína total solúvel. Embora possam parecer inexpressivos aos olhos dos leigos, esse nível de extração está dentro da faixa tida como “suficientemente competitiva para viabilizar economicamente o uso de plantas como biorreatores”, conforme o docente da FEQ. O cientista esclarece que o resultado revela o esforço realizado pela equipe ao longo do estudo. No início dos ensaios, segundo ele, os valores recuperados foram aproximadamente mil vezes menores.

Otimizado o processo de extração, a próxima etapa, como já mencionado, será a purificação da pró-insulina, até a sua conversão e obtenção dos cristais de insulina, que devem ter um grau de pureza da ordem de 99%. Eles servem de insumo para as indústrias farmacêuticas produzirem as formulações utilizadas pelos diabéticos. Para o professor Miranda, o avanço resultante da pesquisa coordenada por ele é muito gratificante, pois ajuda a promover a integração entre áreas distintas do conhecimento. “A engenharia química, no caso, criou um elo com a biologia molecular”, afirma. A pesquisa contou com financiamento da Fapesp e bolsa de estudo concedida pelo CNPq.

Plantas como ‘biofábricas’

Pesquisas dão seqüência ao trabalho do armacêutico e bioquímico Adilson Leite, falecido em janeiro de 2003 (Fotos: Antoninho Perri)Os estudos que culminaram com o aprimoramento do processo de extração da pró-insulina humana recombinante do milho transgênico dão prosseguimento às pesquisas do professor Adilson Leite, falecido em fevereiro de 2003. Um dos mais reconhecidos especialistas brasileiros na área de biologia molecular, ele dedicou parte da sua vida à transformação de plantas em “biofábricas” de interesse farmacêutico. Um dos projetos de maior repercussão de Adilson Leite, que ainda está tendo seqüência no CBMEG, é a obtenção do hormônio do crescimento (hGH), proteína utilizada no tratamento de crianças acometidas de nanismo, também a partir do milho geneticamente modificado.

Em entrevista concedida em julho de 2002 ao Jornal da Unicamp, o professor Adilson Leite explicou como o cereal pode ser utilizado para esse fim. De acordo com ele, todas as células de um determinado organismo contêm os mesmos genes. Graças aos chamados “promotores”, regiões que determinam em que momento, quantidade e local as substâncias serão produzidas, não ocorre confusão entre as funções que cada uma desempenha. Sabendo disso, o pesquisador e sua equipe tomaram a parte do gene humano que codifica o hormônio do crescimento e a introduziram na região que regula a produção de proteína do milho, chamada de endosperma, cuja função é fornecer nutrientes para o embrião durante a germinação.

Ou seja, os pesquisadores prepararam esse tecido especializado do cereal para produzir o hGH, como se fosse uma proteína a ser armazenada nas sementes, conforme as ordens transmitidas pelo seu trecho regulador. As vantagens de se obter bioprodutos a partir de plantas, explicou à época Adilson Leite, são inúmeras. Duas delas: primeiro, é muito mais barato desenvolver uma planta do que um animal transgênico; segundo, as proteínas originárias das plantas são muito mais seguras do que as de uma bactéria, visto que não há indicação de que causem alguma doença ao homem.

Adilson Leite nasceu em Ponta Grossa (PR). Graduou-se em 1978 em Farmácia e Bioquímica pela Universidade Estadual de Ponta Grossa e doutorou-se em Ciências pelo Instituto de Química da Universidade de São Paulo (USP), em 1984. Ingressou na Unicamp em 1988 para trabalhar como técnico especializado no Laboratório de Biologia Molecular de Plantas do CBMEG. Neste laboratório, juntamente com o professor Paulo Arruda, iniciou seu trabalho de caracterização de proteínas de reserva de sementes de cereais, incluindo estudos da regulação da expressão gênica em sementes.

A experiência acumulada com os estudos do fator de transcrição Opaco-2 o habilitou a coordenar em 1999 um projeto de “Data mining” de fatores de transcrição no Banco de Dados do Sucest. Além disso, desenvolveu um sistema que permite a expressão de grandes quantidades de proteínas heterólogas de interesse comercial em sementes de cereais, o que lhe rendeu um pedido de patente no ano 2000. Também recebeu o prêmio de mérito científico e tecnológico do Governo do Estado de São Paulo pela contribuição ao projeto de seqüenciamento genético da Xyllela fastidiosa, em fevereiro de 2000.

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