| Edições Anteriores | Sala de Imprensa | Versão em PDF | Portal Unicamp | Assine o JU | Edição 380 - 12 a 25 de novembro de 2007
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Pesquisa detalha a composição de sete variedades
obtidas por meio de melhoramento genético

Tese atesta riqueza nutricional
do feijão consumido no Brasil

CARMO GALLO NETTO

Variedades de feijão expostas em mercado na região central de Campinas: novos cultivares têm alto valor nutritivo  (Foto: Antoninho Perri)Há algumas décadas era comum, principalmente nas regiões de forte imigração européia, considerar comida de “brasileiro pobre” ou de parcos recursos a dieta constituída essencialmente de feijão e arroz. Em um Brasil que chegara tardiamente à industrialização, a marmita, símbolo do operariado de uma época, mostrava um cardápio quase invariável e considerado “sem sustância”, como se dizia: feijão, arroz e ovo frito.

País é o segundo produtor mundial

Com o desenvolvimento das ciências e a proliferação das pesquisas, a dobradinha feijão-arroz consolidou-se como de grande valor nutricional. Com o intuito de oferecer cada vez mais alimentos de qualidade, a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) vem desenvolvendo novos cultivares de feijões com alto valor nutritivo.

É o que comprovam e reafirmam as pesquisas realizadas pela professora Norka Beatriz Barrueto Gonzalez, do Curso de Nutrição do Instituto de Biociências da Unesp de Botucatu. A pesquisadora acaba de concluir estudos de doutorado, orientados pelo professor Jaime Amaya-Farfán, no Departamento de Planejamento Alimentar e Nutrição da Faculdade de Engenharia de Alimentos (FEA) da Unicamp, que apontam a riqueza nutricional das variedades de feijão mais consumidas no país.

O objetivo da pesquisa foi contribuir com dados sobre a composição nutricional das sete variedades de feijões mais consumidas pelo brasileiro, obtidas por melhoramento genético, e estudar principalmente a biodisponibilidade de cálcio, magnésio, cobre e zinco nas sementes cozidas, minerais essenciais à saúde. Entende-se por biodisponibilidade o balanço das quantidades desses minerais presentes na leguminosa e efetivamente retidos pelo organismo.

Norka Beatriz procurou o Centro de Pesquisa Arroz-Feijão da Embrapa, em Goiás, e solicitou amostras dos cultivares das variedades mais consumidas no Brasil e por isso submetidos continuamente a melhoramentos genéticos, para atender os padrões agronômicos e culinários do mercado interno. Recebeu sete variedades – jalo precoce (jalo), radiante (rajado), vereda (rosinha), pérola (carioca), timbó (roxinho), valente (preto) e ouro branco (branco). Ela constatou que as informações encontradas na literatura sobre as características nutricionais destes novos cultivares são incompletas tanto em termos de conteúdo de nutrientes como de seus valores biológicos.

A constatação a levou a determinar inicialmente a composição nutricional dessas variedades como forma de resgatar as qualidades alimentares dessas leguminosas, tradicionalmente presentes na dieta dos brasileiros.

A pesquisadora diz que, embora o principal enfoque dos pesquisadores destas leguminosas esteja voltado principalmente para o aprimoramento das características tecnológicas que envolvem a produção dos grãos, existe atualmente preocupação com a qualidade nutricional, sensorial e com a redução de compostos antinutricionais destas sementes. “Sabe-se que o valor nutritivo do alimento é determinado também pela presença ou ausência de fatores promotores ou inibidores da absorção de nutrientes”.

O Brasil planta 2,5 milhões de toneladas de feijão/ano, sendo o segundo maior produtor mundial, atrás apenas da Índia, o que evidencia a importância dessa leguminosa na dieta brasileira. O produto constitui, segundo Norka Beatriz, depois da carne, a maior fonte de proteínas e calorias.

A pesquisadora enfatiza, ainda, que o resgate do valor nutritivo do feijão adquire particular importância diante da constatação de que as mudanças que vêm ocorrendo nos hábitos alimentares do brasileiro têm levado ao aumento das taxas de colesterol, do peso, dos casos de hipertensão e do diabetes.

O professor Jaime Amaya-Farfán, orientador da pesquisa: aspectos sensoriais são essenciais  (Foto: Neldo Cantanti)Biodisponibilidade de minerais é quantificada nas investigações

A primeira etapa do estudo concentrou-se na análise da composição centesimal das sete variedades de feijão comum, que revelou altos teores de proteínas, carboidratos e minerais (cálcio, magnésio, cobre, zinco e ferro), importantes do ponto de vista nutricional. Além disso, foi caracterizado o perfil de aminoácidos e, ainda, o valor energético destas sementes, essencial na composição de uma dieta.

Esta fase revelou que as variedades carioca, preto, branco e rosa são as mais nutritivas porque apresentam um perfil mais completo quanto ao teor de proteínas e de sais minerais, superando em 25% o teor protéico e de 300% o teor de cálcio de feijões similares referendados nas tabelas de composição dos alimentos.

Como esperado, afirma Norka Beatriz, todas as leguminosas apresentam deficiência de um ou mais aminoácidos, componentes essenciais das proteínas. Entretanto, afirma, a deficiência pode ser superada com a inclusão na dieta de cereais – arroz, milho ou macarrão – o que leva a um balanço adequado de proteína. Essa combinação evita prejuízos alimentares e não exige o consumo constante de carnes.

A segunda etapa do trabalho ateve-se ao seu objetivo principal: o estudo da biodisponibilidade de cálcio, magnésio, cobre e zinco, ou seja, de quanto o organismo efetivamente absorve da quantidade disponível desses minerais presentes nas variedades carioca, branco e preto, que se revelaram as mais nutritivas principalmente quanto aos teores de cálcio. Nesta fase verificou-se, ainda, como se dá a interferência dos fitatos, reconhecidos quelantes de minerais e agentes anti-nutricionais, em relação à absorção dos metais pelo organismo.

Para efeito comparativo, o estudo foi feito também com uma variedade comum de soja, porque na literatura existem indícios de que o consumo de soja e seus derivados contribuem para a retenção de cálcio nos ossos em populações que não consomem leite, caso das orientais, o que se reflete na diminuição dos casos de osteoporose, mesmo com a presença de fitatos nesses produtos.

Nesta fase foram utilizados grupos de ratos Wistars recém-desmamados que receberam dietas contendo exclusivamente os três feijões selecionados, cozidos e liofilizados, além de soja, na forma torrada. O quinto grupo, de controle, recebeu dieta balanceada.

Os resultados experimentais levaram a pesquisadora a concluir que os minerais presentes nos feijões e na soja são absorvidos pelo organismo, principalmente cálcio e magnésio e, em menor quantidade, cobre e zinco. Ela considera a constatação muito importante porque, no Brasil, a dieta é em geral pobre em cálcio: “O feijão pode compensar essa perda e evitar que a deficiência de cálcio na estrutura óssea leve ao uma osteoporose precoce”, afirma.

Norka Beatriz diz ainda que os feijões constituem uma boa fonte de proteínas, têm perfil aminocídico adequado para uma leguminosa, que sabidamente apresenta deficiência em certos aminoácidos essenciais. A pesquisadora entende que as conclusões podem auxiliar a decisão do agricultor em associar características agronômicas favoráveis como alta produtividade, resistência a pragas, uso de adubos e fertilizantes, com características sensoriais como paladar, tempo de cozimento, produção de caldo e com composição nutricional adequada. “É uma forma em que ganhariam todos”.

O professor Jaime Amaya-Farfán diz que a escolha do consumidor se dá com base em fatores objetivos, como preço, paladar e praticidade, que qualquer dona de casa conhece muito bem. Neste particular, o docente considera essenciais os aspectos sensoriais. Aliando tais objetivos, pode-se contar hoje com feijões mais saborosos e nutritivos.

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