Lá, numa área de aproximadamente 3 mil quilômetros quadrados, estão espalhados 1,6 mil tanques detectores de superfície (1.430 em operação) e 24 telescópios. Toda essa parafernália, somada a sofisticados equipamentos de comunicação e de informática, permitiu à equipe de pesquisadores identificar os raios cósmicos, bem como analisar e interpretar os dados relativos à sua composição e comportamento.
Isso só foi possível, afirma Escobar, porque os cientistas partem de uma técnica híbrida de observação. O procedimento é mais ou menos assim: com o auxílio dos tanques detectores, que estão cheios de água com altíssimo grau de pureza, esses caçadores de enigma “capturam” as partículas que chegam à superfície terrestre. Ao entrarem em contato com o líquido, elas produzem uma radiação azulada, que é registrada por fotossensores.
Paralelamente, os telescópios também registram a radiação e a intensidade da chuva de partículas. Aqui, vale uma explicação. Os raios cósmicos são prótons e núcleos atômicos que viajam através do universo a uma velocidade próxima à da luz. Quando essas partículas se chocam com a atmosfera superior da Terra, forma-se uma cascata de partículas secundárias, fenômeno denominado “chuveiro atmosférico”.
Essa chuva pode se espalhar por até 40 quilômetros quadrados na superfície do planeta. Uma vez registrado o fenômeno, as informações geradas tanto pelos tanques quanto pelos telescópios são imediatamente cruzadas, o que gera uma massa de dados extremamente rica. A partir daí, tem início o trabalho de análise e interpretação das informações por parte da equipe de pesquisadores.
De acordo com Escobar, além do sítio argentino, o Observatório Pierre Auger de Raios Cósmicos, uma iniciativa do físico norte-americano James Cronin, ganhador do Prêmio Nobel de Física de 1980, também deverá contar com outro laboratório a céu aberto no hemisfério Norte, mais especificamente no Estado do Colorado, nos Estados Unidos.
Os entendimentos para a execução do empreendimento ainda estão no começo, mas os resultados das pesquisas desenvolvidas no Auger Sul devem facilitar as conversações com as agências de fomento dos países interessados no projeto. O professor da Unicamp explica que o Auger Norte permitirá cobrir outra parte do céu, complementando dessa forma o trabalho executado na Argentina. Nos EUA, o sítio deverá ser bem maior, da ordem de 10 mil quilômetros quadrados. “Esperamos levantar os recursos necessários à implantação do projeto e desejamos que o Brasil possa fazer parte do novo empreendimento”, diz.
No Auger Sul, conforme o professor da Unicamp, a presença brasileira foi muito importante. O país investiu aproximadamente US$ 3,5 milhões no projeto, que consumiu ao todo US$ 54 milhões. O restante foi dividido entre as outras 16 nações integrantes do consórcio. As agências de fomento brasileiras que participaram da empreitada foram a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) e Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), as duas últimas vinculadas ao Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT). “Além disso, nós também tivemos uma participação destacada da indústria brasileira na implantação do observatório. Alguns dispositivos e equipamentos, como os tanques detectores e as lentes utilizadas nos telescópios, foram produzidas por empresas nacionais”, destaca Escobar.
Segundo ele, o Auger Sul deverá passar por melhorias nos próximos meses. Para complementar as observações, serão instalados mais três telescópios, iniciativa que não estava prevista no projeto original. “Esses equipamentos nos permitirão fazer observações na faixa dos 30 aos 60 graus. Os atuais operam na faixa do zero aos 30 graus”, explica.
O físico destaca que o consórcio internacional admite novos integrantes a qualquer tempo. Entretanto, os calouros devem se comprometer a fazer investimentos no projeto, principalmente no empreendimento a ser instalado nos EUA. “Recentemente, nós admitimos Portugal e Holanda. Outros países já demonstram interesse em também integrar o consórcio. A Coréia, por exemplo, iniciou conversações nesse sentido”.
Homenagem O Observatório Pierre Auger de Raios Cósmicos recebeu esse nome em homenagem ao físico francês Pierre Victor Auger (1899-1993), que atuou, entre outras instituições, na Sorbonne. Em 1938, ele registrou pela primeira vez a chamada “chuva de partículas”. Para isso, o cientista se valeu de dois detectores de radiação ionizante separados espacialmente. Auger conseguiu comprovar que os detectores assinalavam a passagem de alto fluxo de partículas cósmicas ao mesmo tempo. Tal descoberta permitiu a construção de detectores no solo, espécies de avôs dos instalados no sítio de Mendoza, eliminando dessa forma a limitação de detecção em pequenas áreas dentro de balões ou no topo de edifícios.
Instituições participantes do Observatório Pierre Auger
Argentina
Centro Atómico Bariloche (CNEA); Instituto Balseiro (CNEA & UNCuyo); CONICET
Instituto de Astronomía y Física del Espacio (CONICET)
Laboratorio Tandar (CNEA); CONICET; Univ. Tec. Nac. (Reg. Buenos Aires)
Pierre Auger Southern Observatory
Universidad Nacional de la Plata; IFLP/CONICET; Univ. Nac. de Buenos Aires
Universidad Tecnológica Nacional - Regionales Mendoza y San Rafael
Austrália
University of Adelaide
Bolívia
Universidad Catolica de Bolivia
Universidad Mayor de San Andrés
Brasil
Centro Brasileiro de Pesquisas Fisicas (CBPF)
Pontifícia Universidade Católica (PUC-Rio)
Universidade de São Paulo (USP)
Universidade Estadual de Campinas (Unicamp)
Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS)
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (UESB)
Universidade Federal da Bahia
Universidade Federal do ABC (UFABC)
Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ)
Universidade Federal Fluminense (UFF)
República Checa
Charles University Prague, Institute of Particle and Nuclear Physics
Institute of Physics (FZU) of the Academy of Sciences of the Czech Republic
França
Institut de Physique Nucléaire, Orsay (IPNO)
Laboratoire AstroParticule et Cosmologie Université Paris VII
Laboratoire de l’Accélérateur Linéaire (LAL), Orsay
Laboratoire de Physique Nucléaire et de Hautes Energies (LPNHE), Université Paris 6
Laboratoire de Physique Subatomique et de Cosmologie (LPSC) - Grenoble
Alemanha
Bergische Universität Wuppertal
Forschungszentrum Karlsruhe - Institut für Kernphysik
Forschungszentrum Karlsruhe - Institut für Prozessdatenverarbeitung und Elektronik
Max-Planck-Institut für Radioastronomie and Universität Bonn
Rheinisch-Westfälische Technische Hochschule (RWTH) Aachen
Universität Karlsruhe (TH) - Institut für Experimentelle Kernphysik (IEKP)
Universität Siegen
Itália
Dipartimento di Fisica dell’Università and INFN, L’Aquila
Dipartimento di Fisica dell’Università and Sezione INFN, Milano
Dipartimento di Fisica dell’Università di Napoli “Federico II” and Sezione INFN, Napoli
Dipartimento di Fisica dell’Università di Roma “Tor Vergata” and Sezione INFN Roma II
Dipartimento di Fisica e Astronomia dell’Università di Catania & Sezione INFN, Catania
Dipartimento di Fisica Sperimentale dell’Università and Sezione INFN, Torino
Dipartimento di Fisica, Università del Salento and Sezione INFN
Istituto di Fisica dello Spazio Interplanetario (INAF), Dipartimento di Fisica Generale dell’Università and Sezione INFN, Torino
Laboratori Nazionali del Gran Sasso, INFN
Osservatorio Astrofisico di Arcetri
México
Benemérita Universidad Autónoma de Puebla (BUAP)
Centro de Investigación y de Estudios Avanzados del IPN (CINVESTAV)
Universidad Michoacana de San Nicolás de Hidalgo
Universidad Nacional Autónoma de México
Holanda
Institute for Mathematics, Astrophysics and Particle Physics (IMAPP), Radboud Universiteit
Kernfysisch Versneller Instituut (KVI), Rijksuniversiteit Groningen
Nationaal Instituut voor Kernfysica en Hoge Energie Fysica (Nikhef)
Stichting Astronomisch Onderzoek in Nederland (ASTRON), Dwingeloo
Polônia
Henryk Niewodniczanski Institute of Nuclear Physics, Polish Academy of Sciences
University of Aódz
Portugal
Laboratory of Instrumentation and Experimental Particle Physics (LIP)
Slovênia
University of Nova Gorica
Spain
Instituto de Física Corpuscular, CSIC-Universitat de València
Universidad Complutense de Madrid
Universidad de Alcalá de Henares
Universidad de Santiago de Compostela
University of Granada
Reino Unido
Oxford University
University of Leeds, School of Physics & Astronomy
Estados Unidos
Argonne National Laboratory
Case Western Reserve University
Colorado School of Mines
Colorado State University, Fort Collins
Colorado State University, Pueblo
Columbia University
Fermi National Accelerator Laboratory
Louisiana State University
Michigan Technological University
New York University
Northeastern University
Ohio State University
Pennsylvania State University
Southern University
University of California, Los Angeles
University of Chicago
University of Colorado
University of Hawaii
University of Minnesota
University of Nebraska
University of New Mexico
University of Utah
University of Wisconsin-Madison
University of Wisconsin-Milwaukee
Vietnã
Institute of Nuclear Science and Technology of Hanoi (INST)
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