Aids 20 anos depois
Unicamp desempenha papel fundamental no combate à doença
ISABEL GARDENAL
Vinte anos depois de descoberta, a Aids supera no Brasil a fase mais crítica e, aos poucos, começa a ser controlada. O quadro trágico da doença, contudo, incentivou a ciência para uma grande evolução não só no diagnóstico, mas também na incorporação de métodos em biologia molecular e de investigação genética. Nesse contexto, a Unicamp desempenhou, e desempenha, um papel pioneiro e fundamental nesta luta. Segundo o infectologista Rogério de Jesus Pedro, responsável pela Unidade de Pesquisas Clínicas, o primeiro caso brasileiro foi descoberto pela Disciplina de Doenças Transmissíveis da Universidade, em 1982, quando a Aids significava somente uma curiosidade médica.
No mundo, a primeira descrição foi a da morte de um homem com pneumonia, em 1981. A autópsia confirmou infecção por citomegalovírus. Seu agente etiológico não era ainda conhecido, apenas a síndrome.
A autoria do primeiro editorial acerca do assunto no País é da Disciplina de Moléstias Infecciosas (MI), chamando a atenção para um problema médico que já desafiava a ciência. Os esforços se concentravam em prestar atendimento aos casos novos, apresentar casuísticas e relatar as infecções oportunistas.
A superposição das endemias brasileiras com a infecção pelo HIV era um enigma que a Unicamp ajudou a desvendar, com a elucidação dos casos de Chagas, tripanossoma cruzi, hepatites. "Entendemos que não se tratava de uma doença de passagem e que precisávamos organizar serviços para que a Aids não progredisse. Foram então criados modelos de assistência, um laboratório de Aids no HC, uma área de internação hospitalar para esses casos na enfermaria de MI e um serviço de leito-dia", explica Rogério.
Panorama atual - A Aids ainda cresce no Brasil e a previsão até o fim do ano é de 600 mil ocorrências. Mas estavam superestimadas as previsões da Organização Mundial da Saúde de que em 2000 seriam mais de 2 milhões de pessoas infectadas pelo vírus da Aids. "Isso não ocorreu até o momento, sinal de que o Programa Nacional de DST/AIDS está sendo eficiente", observa Rogério. A Aids exigiu muito dinheiro, pesquisas e planos estratégicos. "Os países que não fizerem este investimento serão dizimados. Afinal, a doença acomete adultos em fase produtiva, trazendo impactos à economia e à expectativa de vida. O governo não tiver este entendimento, poderá pagar um tributo maior do que o mundo já paga", acrescenta.
Para o infectologista Francisco Aoki, chefe da disciplina de MI da Faculdade de Medicina, além do grau de organização, foram criadas redes nacionais para o diagnóstico de Aids e de genotipagem no País, trazendo tratamento de forma universal e o desenvolvimento de genéricos e de antiretrovirais. Com essa nova atitude, ano a ano se renova um consenso do Ministério da Saúde que garante o aumento do arsenal de medicamentos com financiamento do SUS, até mesmo para clínicas privadas.
Neste ponto, Rogério acredita que, embora os medicamentos controlem a patologia com eficácia, é uma área a ser mais explorada. Dos 16 medicamentos disponíveis no mundo, 15 são fornecidos no Brasil. O T-20, o penúltimo lançado, teve a participação da Unicamp na sua elaboração. No próximo ano, o T-20 e o tenofovir, que foi liberado pela Food and Drug Administration (FDA) para uso em Aids, serão comercializados.
Pacientes terão leito-dia
Até o final do ano será inaugurado na Unicamp o Hospital-Dia - um modelo de assistência moderna extra-hospitalar, financiado pelo Governo Federal. Nele serão tratados doentes em fases mais avançadas que necessitam de atendimento especializado, mas que não ficam internados, voltando para suas casas.
O novo hospital a integrar o complexo da Área de Saúde ficará instalado próximo ao Pronto-Socorro do HC e deverá atender a toda a demanda da Universidade. "Pretendemos ter aqui o melhor serviço para pacientes HIV positivo", planeja o infectologista Rogério de Jesus Pedro.
Origem do HIV
A infecção pelo HIV começou a ser observada na metade do século 20. Os relatos iniciais contam que a doença surgiu na África Central e, provavelmente, pela mutação dos vírus do macaco. Algumas experiências comprovam que o elo perdido na passagem dos primatas para o homem parece estar relacionado à questão da manipulação de carnes de chimpanzés infectados na África. A doença, então levada para pequenas comunidades da região central, se disseminou pelo mundo todo com a globalização.
Testes de Aids realizados por mês no HC
Testes Elisa - 1.200 |
CD4 - 500 |
Western blot - 55 |
Carga viral - 600 |
Teste Elisa - pesquisa anticorpos, sendo realizado por dois métodos diferentes
Western blot - teste para confirmação de anticorpos
CD4 - quantificação de linfócitos-T
Carga viral - quantificação dos vírus no paciente
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CRONOLOGIA
1981
- A alta taxa de incidência do sarcoma de Kaposi leva os EUA a reconhecerem a nova doença que ataca homossexuais, imigrantes haitianos e viciados em drogas injetáveis
1982
- O termo Aids é usado pela primeira vez em artigo científico
1983
- O cientista francês Luc Montagnier, do Instituto Pasteur, isola o vírus da Aids
1984
- O cientista alemão Reinhard Kurth conclui que a Aids surgiu na África
1985
- Franceses anunciam a estrutura completa do vírus
- O uso de preservativos é sugerido como forma de proteção
1986
- Surge o primeiro medicamento contra a Aids, o AZT
1988
- Morre Henfil, cartunista que se tornou símbolo da luta contra a Aids no Brasil
1994
- Segundo a OMS, 15 milhões estão infectados no mundo dez milhões só na África.
- Um novo grupo de drogas passou a ser estudado, os inibidores de protease, que revelaram potente efeito antiviral in vitro. Seu uso in vivo, isolado ou em associação com o grupo AZT, passou a designar a mistura chamada de "coquetel".
1996
- O Governo Federal distribui para a rede pública de saúde as sete drogas do coquetel
1998
- É relatado o caso mais antigo de HIV: um africano que morreu em 1959
1999
- No Brasil, o ministro da Saúde ameaça quebrar patentes de medicamentos caros.
2002
- Unicamp participa de estudo multicêntrico do T-20, medicamento que impede o vírus do HIV de entrar nas células do organismo.
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