Edições Anteriores | Sala de Imprensa | Versão em PDF | Portal Unicamp | Assine o JU | Edição 231 - 29 de setembro a 5 de outubro de 2003
Leia nessa edição
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Artigo - O triunfo da pós
Desafio: informação nutricional
Agricultura familiar
Software: textos em braile
Pequenos movimentos
Linha Branca: setor em alta
Pós além dos 20 mil
`Banco de gelo´: economia
O prêmio de um romance
O Vôo de Dário Thober
Unicamp na Imprensa
Painel da Semana
Teses da Semana
Identidade magnética
A hora de cada um
 

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Informação nutricional e mercado: um desafio para o governo e a universidade

ELISABETE SALAY

“Não contém colesterol”;

“enriquecido com ferro”;

“contém glúten”;

“bebida de baixa caloria”.


Estes são alguns exemplos das diversas informações disponíveis no dia-a-dia ao consumidor e que, mesmo que não preponderantemente, podem influir na tomada de decisão dos indivíduos sobre sua alimentação. Se estas alegações são adequadas ou suficientes ou estão em excesso são questões que se pode responder partindo-se da abstração de mercado onde forças de demanda e oferta interagem, fornecendo um certo nível de informação nutricional sobre o produto.

Por várias razões, no entanto, esse mercado, operando por suas próprias forças, não supre necessariamente um volume e adequação de informação nutricional necessários à orientação do consumidor. Primeiramente, porque o consumidor nem sempre estará preocupado com a alimentação e nutrição, demandando fracamente este atributo. Com pouca demanda, então, nem sempre as empresas terão incentivos para inovar e oferecer informações nutricionais.

Uma outra razão é que o fornecedor teria um custo muito alto se disponibilizasse voluntariamente dados nutricionais pouco atrativos de seu produto, como o alto teor de sódio ou o baixo teor de vitaminas. A tendência é enfatizar as propriedades positivas dos alimentos oferecidos, como, por exemplo, o alto teor de fibras ou de minerais.

Grande parte, todavia, das informações científicas nutricionais têm o caráter público, isto é, quando disponíveis no mercado podem produzir benefícios para toda a sociedade. Neste sentido elas devem ser geradas e atualizadas freqüentemente, e estarem disponíveis aos cidadãos.

A contradição exposta gera duas implicações importantes para o governo e universidades. A primeira é que o governo precisa controlar o tipo e quantidade de informação disponível no mercado. Exemplos deste tipo de intervenção pública são as regulamentações de rótulos e propagandas. E, no Brasil, pode se relatar a Resolução nº 19 de 1999 sobre o registro de alimentos com alegação de propriedades funcionais e a Resolução nº 40 de 2001 sobre a rotulagem nutricional obrigatória de alimentos e bebidas embalados, ambas do Ministério da Saúde.

A segunda implicação é que o mercado por si só, não gerando informações nutricionais suficientes para a promoção da saúde pública, passa para o governo a responsabilidade de planejar e também financiar pesquisas nesta área. E, neste caso, as universidades que desenvolvem estudos de excelência científica têm papel fundamental, como no caso do Brasil. As recomendações nutricionais e a composição dos alimentos ilustram perfeitamente este argumento.

O processo de elaboração de padrões de recomendação de ingestão diária de nutrientes e energia é extremamente dependente de pesquisa básica e deve ser desenvolvido sistematicamente. Quando foram sugeridas as primeiras recomendações de consumo diário de energia e proteínas, ainda nem se tinha identificado os aminoácidos essenciais e seu papel no organismo. Desde 1940, o Food and Nutrition Board foi estabelecido nos Estados Unidos para propor padrões de ingestão de nutrientes. Ao invés de um indicador, isto é, Recommended Dietary Allowances (RDAs), conforme orientação de 1989, o Food and Nutrition Board recentemente propôs a aplicação de quatro indicadores, para o planejamento e análise da alimentação da população, incluindo limites máximos de consumo de certos elementos que são as Dietary Reference Intakes (DRIs). Estes novos indicadores mudarão a concepção e planejamento, desde programas governamentais até cardápios em estabelecimentos comercias, com impactos evidentes na saúde publica. O Brasil tem direcionado esforços para adaptações das recomendações desenvolvidas por organismos internacionais à população brasileira, como, por exemplo, os trabalhos meritórios elaborados pela Universidade de São Paulo e pela Sociedade Brasileira de Alimentação e Nutrição. Todavia, ainda não se alocou a devida prioridade política para o desenvolvimento de pesquisa científica nesta área.

Visando promover o debate, o Núcleo de Estudos Pesquisas em Alimentação (Nepa) da Unicamp está organizando um seminário para discussão e divulgação das DRIs em conjunto com a Universidade de São Paulo, incluindo a Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz”, e a Universidade Metodista de São Paulo. Este evento conta com a promoção do V Simpósio Latino-Americano de Ciência dos Alimentos e ocorrerá em 02 de novembro de 2003 (http:www.unicamp.br/nepa ou http://www.slaca.com.br).

A composição dos alimentos é outro tipo de informação de caráter público incompletamente gerada pelo mercado. Sabe-se que a composição dos alimentos pode variar de acordo com fatores diversos, tais como o clima, o processamento, a variedade, etc. Essas variações podem ser de expressiva magnitude e, o uso, portanto, de tabelas de outros países pode induzir graves erros na compreensão do valor nutricional da alimentação e dos rótulos alimentares, nas prescrições de dietas, e até na identificação de impactos ambientais. Deste modo, cada país deve constituir, com metodologia científica adequada, sua tabela de composição de alimentos. O projeto TACO (Tabela Brasileira de Composição de Alimentos) que vem sendo coordenado pelo Nepa desde 1996, veio de encontro a esta necessidade. Com pioneirismo na América Latina e envolvendo dezenas de laboratórios de todo o Brasil, já se analisou a composição de 198 alimentos graças ao suporte financeiro do Ministério da Saúde (MS). Mais recentemente, o projeto encontrou o apoio também do Ministério Extraordinário da Segurança Alimentar (Mesa) que em conjunto com o MS e, provavelmente parceiros do setor privado, possibilitarão a continuidade e consolidação da Tabela Brasileira de Composição de Alimentos.
Mercado, informação nutricional, governo e universidade, formam, portanto, um arranjo adequado para a promoção da nutrição e da saúde pública.

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Elisabete Salay é coordenadora do Núcleo de Estudos e Pesquisas em Alimentação (Nepa) e professora da Faculdade de Engenharia de Alimentos (FEA) da Unicamp

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